Foto: Marcos Corrêa/PR| Foto: PR

Nesta quinta-feira (5) o presidente Jair Bolsonaro decidiu indicar o subprocurador Augusto Aras como procurador-geral da República. E eis que se deu a grita. O anúncio não causou espécie pelo fato de ser a primeira vez nos últimos 16 anos que o chefe do Executivo escolhe alguém fora da lista tríplice para a PGR. O motivo para o choque de boa parte da população foi outro: Aras seria o que os fãs do mito costumam chamar de “esquerdopata”. Alguém com longo histórico de comentários simpáticos a figuras ligadas à esquerda, de Guevara a Rousseff.

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Como se isso não fosse suficiente — e do ponto de vista dos fundamentalistas ultrapassa todos os limites —, Aras se mostrou pouco simpático à Lava Jato e ao instituto da delação premiada.

Caberia analisar todas essas ressalvas, não fosse, no fundo, inteiramente outro o motivo para a histeria generalizada na claque responsável por sustentar o presidente desde a eleição: Bolsonaro revelou sua natureza pragmática, atrelada ao establishment, e a pouca importância que dá para o combate à corrupção.

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Não que esta tenha sido a primeira vez. Não que em algum momento ele tenha deixado de ser o deputado federal com décadas de politicagem nas costas, responsável por enfiar toda a família na política e a sempre encontrar um jeito de favorecer os seus.

Sequer é preciso voltar tanto assim no tempo: há menos de dois meses, quando argumentava a indicação do Eduardo para assumir a embaixada em Washington, o mandatário não titubeou ao declarar: “pretendo beneficiar filho meu, sim”.

Sabe-se lá que palavra motivou o "clique", a frustração de boa parte dos seguidores do presidente. Talvez não tenha sido uma palavra e, sim, uma frase, proferida hoje mesmo pelo próprio Bolsonaro: “devo lealdade ao povo, mas não é essa lealdade cega”. Afinal, foi por meio de um discurso messiânico para populista nenhum botar defeito, em que cobrava e incentivava a lealdade cega, que alcançou sua vitória eleitoral mais importante.

Seja qual for a razão, inclusive a suspeita cada vez mais robusta apontando para um acordo capaz de aliviar a barra para Flávio, seu filho senador, é importante dizer com todas as letras: Jair Bolsonaro não traiu ninguém. Para que isso fosse verdade, ele precisaria ter mudado. E isso nunca aconteceu.

De todo modo, fica claro que a recíproca também é verdadeira. Desde a reabertura democrática, quando apostou em um caçador de marajás, a sociedade brasileira nutre um fetiche incontornável pelo autoengano. E quanto mais escancarada for a arapuca, melhor.

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Pois cá estamos.