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Debate bizarro: quem é o mais autoritário?

Foto: divulgação Pixabay (Foto: )

O fio que conduz o cenário destas eleições, assim como das últimas, não é difícil de ser seguido. Começa pela nossa incapacidade de desenvolver um sentimento maduro em relação à própria cidadania. Das guimbas que granulam nossas calçadas à obrigatoriedade de votar em alguém — ou então, dizem, não vale reclamar depois — é um pulo. A partir daí, essa sensação de não pertencimento impõe uma lógica perversa: se somos instados a votar, como crianças levando colheradas de xarope amargo goela abaixo, que seja no menos pior. Que seja útil.

Como carioca, sei bem do que estou falando. Levei décadas até decidir me abster de uma ciranda contrária aos meus interesses como cidadão. E mesmo assim foi preciso encarar um embate entre Crivella e Freixo, há pouco mais de dois anos, para perceber o que hoje entendo como óbvio.

Entretanto, uma nesga do debate acerca da disputa que polariza essa eleição presidencial avança com folga sobre o prejuízo oferecido pelo voto útil. E deixa ainda mais evidente o estado de aparvalhamento generalizado que tomou de assalto as reservas de bom senso que ainda tínhamos. Falo aqui, é claro, sobre as réplicas e tréplicas de quem representa uma maior ameaça à democracia:  Jair Bolsonaro ou Fernando Haddad.

Em outras palavras, trata-se de normalizar a escolha por um governo autoritário. Melhor dizendo, a falta de uma.

Existem aqueles que juram enxergar uma incapacidade por parte do Partido dos Trabalhadores em ofender a democracia. Argumentam esses que, enquanto esteve no poder, o PT jamais demonstrou impulsos autoritários. E que, portanto, isso basta para eximir o partido de tal suspeita. De fato, bastaria, se fosse verdade.

Mesmo enquanto ainda almejava dar as cartas, a legenda comandada por Lula jamais tergiversou na hora de cortar caminhos para viabilizar o seu projeto hegemônico. Para começar, pedindo o impeachment de todos os presidentes eleitos até 2002. E aqui vale fazer uma ressalva: Haddad costuma repetir que as manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff começaram logo após as eleições. E tem razão. Só faltou reconhecer que o mesmo se deu, e não por parte da massa, mas do partido, em relação a Fernando Henrique Cardoso.

Por falar em reconhecer, eis outra comprovação clara do descompromisso petista para com as regras: jamais assumem qualquer responsabilidade. Qualquer uma. Corrompem o sistema, aparelham o Estado e o Judiciário em causa própria — todos esses exemplos inquestionáveis de viés autoritário —, mas em momento algum fazem uma autocrítica.

Para encerrar, as seguidas ameaças à mídia, seja falando em regulação, seja ameaçando jornalistas diretamente, é um sintoma clássico de quem não está nem aí para os escrúpulos.

Quanto a Bolsonaro, trata-se de um caso mais escancarado. Além de ser notoriamente menos simpático ao zeitgeist vigente no país, incluíndo aí os formadores de opinião, grande parte da classe jornalística, historicamente mais inclinada à esquerda, além dos ditos intelectuais.

Ressalvas feitas, é espantoso, para não dizer irônico, que tenha sido pinçado pela mesma parcela da população antipática ao PT para derrotá-lo, uma vez que ambos são tão parecidos. Segue a mesma lógica do veneno e do antídoto.

Sim, Jair Baolsonaro representa uma ameaça à nossa democracia. Seus discursos, antecipando o desaparecimento das minorias, uma vez que o seu governo privilegiará o grosso da sociedade, deveria apavorar a todos nós. Inclusive, e talvez principalmente, os chamados cidadãos de bem.

Ao contrário do que muitos dos seus seguidores supõem, as críticas pela torpeza do seu candidato não têm ligação alguma com o politicamente correto. E não estou me referindo a piadas fora do tom. Por mais de uma vez, Bolsonaro e a constelação de revoltosos que ele representa deixaram claro o desapreço por premissas inquestionáveis em uma democracia plena. E também não estou falando aqui da óbvia promiscuidade que se dará, caso seja eleito, entre as Forças Armadas e o Executivo, algo simplesmente impensável em realidades não distópicas.

A impressão é de que, no fundo, as pessoas começaram a buscar motivos para explicar, se não aos parentes e amigos, a si mesmas, o porquê de terem optado por Fernando Haddad e Jair Bolsonaro.

A essas, se me fosse pedido um conselho, eu diria que não perdessem seu tempo. Não há argumento plausível para o futuro que se avizinha.

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