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Tomar as ruas é um imperativo moral. Se ainda nos resta um fiapo que seja de amor-próprio, clamar pelo impeachment de Jair Bolsonaro, assim que possível, será uma questão de honra.
Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff foram afastados por muito menos. O abate de centenas de milhares de brasileiros não esteve entre os argumentos usados para encaminhar seus processos.
Na última segunda-feira (11), Rodrigo Maia declarou que Bolsonaro poderia sofrer “um processo de impeachment muito duro”, caso o governo não se organize rápido em relação à vacina.
Está claro que Maia ainda não entendeu a gravidade da situação ou o seu papel na maior tragédia já enfrentada pelo país em gerações. Que o presidente da Câmara não se iluda, sua inércia pode ter sido decisiva para selar o destino de mais de duzentas mil pessoas.
Não faltam motivos para frear a insanidade de Bolsonaro.
O apequenamento do Brasil na arena internacional já deveria ser suficiente para provocar comoção. Tão cedo o estrago causado pela retórica do chanceler Ernesto Araújo será remediado.
O abandono da Educação, pasta de importância estratégica, que em dois anos já está no seu quarto ministro e chegou a ser liderada pelo colérico Abraham Weintraub, é igualmente inadmissível.
A devastação das nossas fauna e flora, supervisionada por Ricardo Salles enquanto encaminha diretrizes nocivas à preservação do meio ambiente, também compõe o amplo universo de prejuízos impostos pela administração Jair Bolsonaro.
O aparelhamento de instituições para controlar o escândalo das rachadinhas e rolos dignos do que há de mais raso na nossa política, assim como as constantes ameaças à ordem democrática, só surpreenderam quem se deixou cegar pelo ódio.
Ainda assim, por pior que seja o cenário, nada é comparável à conduta do presidente diante da Covid-19.
As trágicas cenas que chegam de Manaus e a constatação de que vidas estão sendo perdidas por falta de oxigênio não podem ficar sem resposta. Não é possível continuar indiferente a um desgoverno que ameaça a nossa própria existência.
Em abril do ano passado, quando chorávamos 2.575 mortes, Bolsonaro fez questão de lembrar que não era coveiro. Mera tecnicalidade. Ninguém jamais enterrou tantos, em tão pouco tempo e com tamanho desembaraço.
O comportamento de Jair não é normal. Enquanto o povo lamenta a perda de seus familiares e amigos, ele faz graça, pesca, passeia de jet ski e combate a ciência. Suas declarações sempre flertam com o deboche. Na prática, são cruéis.
Em sua obra O Impeachment, Paulo Brossard (1924-2015), senador, ministro da Justiça e do STF, alerta que a função do instituto não é enquadrar criminalmente um governante, mas proteger o Estado de maus gestores.
Sob pena de normalizarmos a página mais nefasta em toda a história da República, Bolsonaro pode e deve responder na Justiça por seus atos. Antes, porém, precisa ser afastado.