Antecipo-me em explicar o título de modo a evitar más interpretações: nunca achei graça nas sandices alardeadas por Jair Bolsonaro, seus filhos ou ministros. E como poderia, se o país flerta com o ocaso fiscal, a falta de segurança, o desemprego, um sistema educacional abandonado à própria sorte e a saúde em frangalhos, enquanto o governo recém-eleito se dedica a expor um país inteiro ao ridículo internacional?
Quanto ao uso do termo sandices, também nesse caso peco pelo excesso de ironia. As duas patacoadas mais recentes vendidas pelo bolsonarismo não são apenas cretinas, mas flertam com a própria falta de empatia: a celebração do Golpe de 1964, quando o Brasil mergulhou em uma ditadura sanguinária, responsável pela tortura e o assassinato de brasileiros, e a teoria insana de que o nazismo tenha sido um movimento “de esquerda”.
E, por favor, não se trata aqui de aceitar o direito do outro em opinar como bem entender. Não há espaço para a cartada do pensamento livre quando o que se busca estabelecer é a reconstrução da história, o apagar de fatos vividos, documentados e apreciados com afinco por acadêmicos sérios de todo o planeta. Principalmente se essa postura sugere o abrandamento e até a negação de crimes contra a humanidade.
Quando assim o fazem, presidente e equipe extrapolam a disputa ideológica, pela qual ensejam a política — estratégia que desgraçadamente insistem em reforçar, mesmo já tendo alcançado o poder, demonstrando o quão bons discípulos de Lula se tornaram. Quando assim o fazem, presidente e asseclas confirmam que, para além da já patente incapacidade gerencial, também são absolutos irresponsáveis.
E aqui sou obrigado a chafurdar no óbvio, um ponto que a cada dia vai ficando mais claro aos olhos de quem vê: do olavismo à excêntrica inoperância de Vélez, da persona Damares aos tuítes do Carlos, da celebração do golpe, enfim, ao nazismo ter sido obra da esquerda, não há tática outra no governo que não seja a de ganhar tempo, de um lado, enquanto Paulo Guedes tenta rearrumar a economia, do outro.
No que depender do presidente e da sua corte de desmiolados, governar não vem ao caso. Até porque esbarraria nas limitações de cada um ali. O que interessa, e continuará em voga durante longos quatro anos, se antes disso Guedes não cansar, será o eterno confronto. Sem limites para ofensas e mentiras, desde que daí surjam celeumas capazes de manter a militância acesa.
Afirmo, sem medo algum de me equivocar, que tudo o que estamos vivendo hoje é uma grande perda de tempo e uma pena.
Digo, se existia sensação pujante no último pleito, mesmo entre aqueles que não votaram em Bolsonaro, era de que o Brasil precisava virar a página em relação ao PT. Eis que, no entanto, com o quarto mês de governo apenas iniciado, mais parece que estamos testemunhando uma espécie de petismo repaginado. Alguma mudança estática aqui e acolá, menos vermelho, mais verde e amarelo, todavia tudo se mantém muito parecido.
A esperança é de que o presidente, ao se deparar com as pressões e dificuldades do cargo, a baixa popularidade ganhando corpo e as visitas internacionais a aliados de um eixo fantasmagórico se esgotando, se dedique à tarefa para qual foi eleito.
Afinal, chegou a hora de trabalhar.