Se há um desafio preponderante na tarefa de escrever sobre o momento pelo qual passa o Brasil, esse é o de não se repetir. Algo quase impossível, dado o empenho do governo em constantemente provocar imbróglios, atacar a imprensa e deixar grande parte da sociedade exasperada com atitudes quase sempre tresloucadas.
O desgaste constatado em simples conversas de mesa de bar e almoços familiares, contudo, não se compara em gravidade a outro efeito. Refiro-me à percepção, cultivada ao longo das últimas décadas, de que na política ninguém presta. Esta leva as pessoas a imaginar que a saída só pode ser alguém avesso ao sistema. E, quanto mais anárquico for o discurso, tanto melhor.
Ninguém deve ser obrigado a aprender com momentos que não viveu, entretanto, para além de pesquisas, hoje cada vez mais simples de serem feitas e por meio das quais depoimentos e resenhas de boa qualidade podem ser apreciados, convenhamos, o governo Fernando Collor de Mello não fica muito atrás da atual administração.
O patriotismo cafona, um populismo quase infantil, a retórica do soco na mesa e a intenção de dividir a sociedade entre os verdadeiros brasileiros e aqueles que não tinham amor pelo verde e o amarelo estavam todos lá. Faziam contraponto, diga-se, ao “fantasma vermelho”. Formavam a tese de que criticar o governo significava torcer contra o Brasil.
Não aprendemos nada.
Passado um momento de raro equilíbrio institucional e até mesmo de refinamento, quando fomos presididos por Fernando Henrique Cardoso, eis que voltamos a comprar a narrativa do desespero.
Sob a batuta de Lula, patacoadas embebidas de um pseudonacionalismo voltaram a ganhar vez. Os brasileiros são novamente instados a escolher entre estar do lado dos corretos e dos justos, ou apoiar os fascistas interessados, tão somente, em vender o país. Durante 13 anos, o debate foi dilapidado pelo simples fato de que ele não interessava ao establishment petista.
Dado o atual cenário, é desnecessário constatar que não aprendemos nada.
O governo Jair Bolsonaro não está inventando a roda com seu falatório divisivo, emburrecedor, empapado de ódio e paranóias. Bem ao contrário, apenas repete fórmulas que construíram um ambiente de intolerância, danoso para a nossa democracia.
Pior do que constatar a nossa dificuldade em aprender com os próprios erros, só mesmo perceber que, desde já, caminhamos para mais uma eleição polarizada. Um pleito de cartas marcadas e narrativas conhecidas.
As opiniões a respeito do presidente e do ex-presidente são conhecidas. Autocrítica que é bom, porém, está em falta.
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