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Foto: Nelson Almeida/AFP
Foto: Nelson Almeida/AFP| Foto: AFP

Escondido atrás de um muro, um policial fardado espera sorrateiramente a passagem de jovens em fila indiana para acertá-los com uma barra. A cena aconteceu em Paraisópolis, cerca de um mês antes de outra investida da Polícia Militar de São Paulo na comunidade, desta vez provocando a morte de 9 pessoas que estavam em um baile funk. A cena foi filmada por moradores locais, provocou reação pública do governador João Dória e um breve comentário do presidente da República, mas a verdade é que ela transcende com folga o perímetro das favelas paulistanas.

Tijucano de alma, posso afirmar que não foi esse um caso isolado e muito menos inédito. Como bem expôs o filme “Tropa de Elite”, há policiais bons e ruins, entretanto aqueles que sobem o morro distribuindo cascudos estão longe de compor mero folclore. E isso por uma série de razões que variam de sua  índole à falta de melhor preparo e remuneração justa ou adequada.

Há contudo um ambiente de raiva e psicopatia impetrado por políticos e endossado por boa parte da sociedade. Uma atmosfera que, se não pode ser responsabilizada por um problema atemporal, funciona como combustível para o seu acirramento. Quando não pela sua legitimação.

Não por acaso, mal a tragédia ganhou o noticiário e toda sorte de elucubrações logo ganhou espaço, sempre com o intuito de ponderar o imponderável.

Existe algo de muito errado com um grupo de pessoas quando, por conta de um debate político-ideológico, elas perdem a capacidade de se colocar no lugar do outro. Quando instintos que nos separam da maioria dos animais, como por exemplo a empatia, são sufocados pelo fanatismo.

Não hesito em afirmar: o antipetismo, reação em si compreensível, foi propositadamente amalgamado a agendas que nada têm a ver com o debate eleitoral. Tornou-se mola para discursos sinistros e válvula de escape para sentimentos ameaçadores à ordem democrática.

Da constatação à desesperança é um pulo. É duro admitir, mas, dado o cenário, fica difícil imaginar uma saída dessa arapuca em que nos metemos. Pelo menos em um curto espaço de tempo. A postura do governo Jair Bolsonaro e o inadmissível silêncio de seus apoiadores — incluindo aqueles que assim não se identificam, embora o sejam na prática ao se concentrar apenas na agenda econômica e ignorar todo o resto — não colaboram.

Assim como não colabora a esquerda, refém de um discurso unicamente interessado em polarizar o debate político, como já avisou o ex-presidente Lula.

Mais do que nunca, o futuro do Brasil, quiçá o resgate de sua sanidade, recai sobre os moderados. Ou o hospício nos transformará, a todos, em zumbis morais.

Já está acontecendo.

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