A ideia de torcida única do MP-PR é pior do que parecia; tente entender. Albari Rosa/Gazeta do Povo| Foto:

Tratei do tema torcida única no final da semana passada, longamente. Eis que percebo que a sugestão do Ministério Público do Paraná (MP-PR), encampada pelo Atlético, é ainda pior do que parecia. Sim, você sabe, a cartolagem e o poder público se esforçam.

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Não é exatamente torcida única, como se convencionou chamar quando apenas os adeptos do time da casa podem ir ao estádio. Está mais para “torcida mista”. Basicamente, não haverá mais um setor exclusivo para os visitantes nos jogos do Furacão, a começar pelo duelo com o Cruzeiro.

Ao contrário do que parecia, os cruzeirenses poderão frequentar “normalmente” o jogo com o Rubro-Negro, pela Copa do Brasil, nesta quarta-feira (16). Mas, calma, também não é bem assim. Não pode ir de camisa do clube e terá de se misturar em meio ao público atleticano.

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Naturalmente, sem a camisa azul da Raposa, e diluída pelo Joaquim Américo, imagina-se que a torcida cruzeirense não vá se manifestar, certo? Ou será que vai? Só o tempo dirá. Em todo o caso, parece-me um tanto arriscado gritar gol no meio da galera adversária.

Não será surpresa se, mantida a ideia, passemos a acompanhar focos de briga pelas bancadas. Algo que já deixou de acontecer há muito tempo no futebol. As torcidas de Atlético e Cruzeiro são amigas. Mas como será com os corintianos, por exemplo?

Enfim, é essa a proposta de “torcida única” do MP-PR que será adotada na Baixada. Diluir, misturar ou infiltrar, como queiram, os adversários na torcida do Atlético. É sem dúvida um conceito curioso que, simplesmente, não existe em nenhum lugar do planeta Terra.

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Na Champions League, a competição mais prestigiada do mundo, com os ingressos mais caros, não é assim. Há setor visitante. Nem mesmo na Copa do Mundo é desse jeito. Não há divisões, mas os torcedores de cada seleção acabam se reunindo num determinado setor do estádio.

Daí, entre outros motivos, a intenção do poder público do estado, por melhor que seja, parece completamente estapafúrdia. Trata-se de algo que violenta a cultura do futebol. E, como se vê na repercussão, que nenhuma torcida quer. Nem a dona da casa, nem a visitante.

Sim, porque futebol é um esporte de identificação. E, me desculpem a obviedade, de dois times. Um de um lado, outro de outro. E assim devem ser colocadas suas torcidas. Afinal, a disputa também alcança a arquibancada: no grito, na vibração, na irmandade, na identificação das cores de um clube.

Gremistas e colorados já testaram a ideia nos clássicos em Porto Alegre. Com relativo sucesso, mas também acompanhada de críticas. Mas adotaram a torcida mista num setor específico do estádio, para quem quer se misturar. E todos de camisas de seus clubes.

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É claro que a mudança vem com o melhor dos discursos e aquela expressão que já virou um “super trunfo”: queremos a “volta das famílias” aos estádios, termo que aparece como o equivalente futebolístico ao “cidadão de bem”, outra figuração que vem sendo usada para justificar qualquer coisa.

Para começar, já há alguns anos o futebol tem visto o aumento do público e, especialmente, das famílias nos campos de jogo. Como alguém que frequenta estádios há quase 30 anos, nunca vi tanta criança e mulher nas praças esportivas.

E é evidente que o pai, ou mãe, ou avô, quem quer que seja, que deseja levar parentes ao estádio, quer ir trajado com o manto, com as cores de sua paixão. Mostrar ao filho o porquê daquela herança e como tudo isso deve ser transmitido. Com os seus, lado a lado. Não misturados.

Como de costume, não houve qualquer discussão com o público, embora se trate do poder público e do interesse público. De portas fechadas, o MP-PR e o Atlético decidiram impor um novo, e inédito, conceito no futebol. Claro que eu não quero que dê errado, nem que ocorra violência.

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Agora, os números na Argentina, que implantou o sistema desde 2013, não recomendam: 40 mortes desde então. Em 2018, dois torcedores já morreram em capitais com torcida única. E, como se sabe, os focos de atrito estão normalmente longe dos estádios.

Os únicos argumentos apontam para uma diminuição do efetivo da polícia empregado no evento. E só. Há ainda uma tese de que se aumentou o público nos jogos. Contestável, afinal, os públicos vêm crescendo ano a ano, por diversos fatores, como promoções de ingressos, por exemplo.

Em todo o caso, mesmo que a torcida única dê certo, estará errado. É contra a essência do esporte, de rivalidade, de disputa, de emoção, do grito na arquibancada – sem violência, obviamente. Uma tarde no estádio não é um passeio no Parque Barigui, não é assistir um filme no IMAX.

O fato é que, só pra variar, o poder público apelou para a tentativa mais preguiçosa, mais cômoda, para um problema que quase não existe mais, que são as brigas dentro dos estádios. Sigo com aquela definição, a mais precisa: estão matando o cachorro para acabar com as pulgas.

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