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Mulheres e o Direito – depoimento da advogada Sandra Lia Bazzo Barwinski

OABPR

Depoimento da advogada Sandra Lia Bazzo Barwinski, graduada pela PUCPR, presidente da Comissão da Mulher Advogada da OABPR entre 2004 e 2012 e coordenadora executiva do Fórum de Mulheres do Paraná.

Este depoimento, que está na íntegra, foi dado por ocasião da matéria sobre a atuação das mulheres no mundo jurídico, publicada no Caderno Justiça e Direito da Gazeta do Povo. Leia a matéria aqui

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Com dezessete anos, vim para Curitiba com o objetivo de estudar. No interior havia escassez de cursos superiores e somente a UFPR ofertava o de Jornalismo. Na época o sistema de segregação racial ainda dominava a África do Sul, e, na minha inocência, planejava tornar-me jornalista, morar no continente africano e combater o Apartheid.

Fui aprovada em diversos vestibulares, porém não tive êxito em Jornalismo. Por acaso, entediada com os cursinhos pré-vestibulares, resolvi ingressar no curso de Direito.

No primeiro dia, na aula magna, me apaixonei pelo Direito e nunca mais pensei em Jornalismo. Dois anos mais tarde me identifiquei com a advocacia. Não consigo me imaginar em outra profissão. Nasci para ser advogada.

Por algum tempo, minha atuação se restringiu às demandas judiciais e consultoria. Em 2003, o então presidente da OAB/PR, hoje o Desembargador José Hipólito Xavier da Silva, convidou-me para integrar a Comissão da Mulher Advogada.

Foi quando descobri a real dimensão e significância da advocacia. Descobri mais. Descobri que existe um “sistema de segregação de gênero”, que nem sempre é ostensivo ou declarado, porém é perverso. Encontrei então uma causa maior para a qual tenho me dedicado nos últimos anos. A minha modesta advocacia tomou novos rumos e novas proporções.

Precisei superar algumas dificuldades pessoais e profissionais, enfrentar a resistência dos e das colegas que não reconhecem a existência da discriminação contra a mulher, conquistar espaço e respeito dentro da OAB, estabelecer vínculo com movimentos sociais ligados à temática e, sobretudo, estudar muito e aprender sobre os direitos da mulher.

Advogar é algo muito singelo e ao mesmo tempo grandioso em sua essência. A advocacia é um instrumento fundamental para assegurar o direito dos seres humanos à liberdade, justiça, paz, igualdade, dignidade e respeito. Para mim, algo simplesmente fascinante!

No início da minha carreira, era comum ser tratada como estagiária e ouvir a pergunta: “você é do escritório de qual advogado?”. Se eu estava bem vestida e maquiada, tinha acesso fácil a qualquer processo ou informação. Sem contar aqueles famosos comentários sobre “beleza”, quando o que está em jogo é conhecimento.

Às vezes é desalentador constatar que alguns homens ainda não perceberam que nós mulheres somos seres pensantes, inteligentes e capazes, independentemente de nossa aparência física.

Há muitos fatos e relatos [que marcaram sua atuação]. Alguns protegidos pelo sigilo da profissão, outros não poderiam ser mencionados sem revelar ou comprometer os envolvidos. Contarei duas histórias: a que mais me fez rir e a que mais me fez chorar.

Certa vez, depois de termos participado de um evento sobre violência contra a mulher, eu e algumas colegas do grupo aguardávamos nosso voo bisbilhotando pelas lojas do aeroporto, quando ouvimos um homem à procura de um presente para sua namorada. A vendedora perguntava sobre as preferências dela, ao que ele respondeu, em alto e bom som, que desconhecia, e que poderia ser qualquer coisa, afinal ela era “uma loira burra”. A reação do grupo foi imediata e perspicaz. Deixamos a loja com o homem boquiaberto, estupefato, e até hoje me divirto ao me lembrar do episódio.

Outra vez, ouvi um relato de uma mulher que por longos anos sofreu toda a sorte de agressões pelo marido. Uma crueldade absurda. Contava que era mãe de três filhos – meninos – e poderia ter tido outras três filhas, não fossem os abortos provocados pelas “surras” do ex-marido inconformado com a ideia de ser pai de meninas. Dizia ele que preferia o aborto a ter que cometer o “pecado” de ser “o primeiro homem da vida delas”, pois não concebia que outros pudessem sequer tocá-las. Esta mulher sofreu horrores, mas também foi a maior história de superação da violência que acompanhei.

Advogadas paranaenses em números

Temos na OAB-PR um total de 27.600 inscritas, das quais 18.640 estão ativas. O número de inscrições altera quase diariamente. Não se pode dizer que estão aposentadas ou que não advogam mais (podem estar inscritas em outros Estados, por exemplo). Então, qualificamos com ativas ou inativas.

Um fato interessante: em 1932 (ano de criação da OAB/PR) havia 128 profissionais inscritos, dentre os quais uma mulher: Walkíria Moreira da Silva Naked foi nossa precursora. Paulista, formada no Largo de São Francisco, pertencia à 2ª Subseção, com sede em Ponta Grossa.

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