Minha filha, ainda adolescente, não quer ir comigo ao cinema assistir o filme que retrata a saga de Lula; alega que há manipulação política, porque ouviu e leu inúmeras críticas ao filme e à engenharia da produção do projeto cinematográfico. Eu também li, mas ao contrário dela eu vou encarar a telona para melhor avaliar e fazer, quando oportuno, os comentários centrados na experiência real com a exibição do filme que exigiu o maior orçamento no Brasil(Época, 19/2/2009)
As ilustrações de hoje( Tiago Recchia e Paixão), na Gazeta do Povo , evidenciam pontos de vista diferentes; é o que sempre destaco aos meus alunos: charges são textos autorais, portanto refletem a opinião do autor. Posso ou não concordar com as ideias ali desenhadas, mas preciso acatar a liberdade do artista do traço/cores de pensar diferente de mim, mesmo que ele articule besteiras, infantilidades ou arregimente argumentos emocionais ou lógicos. O mesmo acontece com as palavras, os textos das colunas de opinião, as postagens em blogs ou atitudes contraditórias, semelhantes ao que a blogosfera inteirinha viu as declarações do jornalista Boris Casoy sobre os garis.
Atente às contingências – Ao lado das perspectivas pessoais, profissionais e de envolvimento coletivo eu, professora autônoma, sem vínculos empregatícios nem com a iniciativa privada e nem com o serviço público, não tenho receios de qualquer retaliação, caso diga que gostei ou detestei o filme. Tenho liberdade de expressão e sei defendê-la, sempre. Bem diferente das pessoas que têm obrigações funcionais ligadas aos vínculos institucionais com o governo ou com o seu empregador. Muitos desses funcionários jamais irão declarar apoio ao gasto com a produção ou, de modo contrário, fazer críticas a qualquer componente do filme. A razão? Eles têm compromissos partidários, de vínculo empregatício e de amor ou de ódio ao personagem principal do discutível filme.
A leitura crítica – O leitor vivaz é sempre atento ao binômio estabelecido nas coisas, situações e informes; ele tem obrigações de avistar os vários lados de uma questão, caso contrário deixará que um comentário imediatista e intempestivo manipule as suas relações com os demais. Saber ler é poderosamente o melhor caminho para a autonomia das ideias e escrever a redenção dos sem voz.
Estratégias para convencer – Tecnicamente os argumentos poderão ser apresentados através do amparo de estratégias bem lógicas, por exemplo: uma lista de motivos, com as comparações, dados numéricos, referências intertextuais, conceitos e definições precisas e técnicas, entre outros procedimentos bem convincentes. Sem que nos esqueçamos de computar nesse rol de atitudes reflexivas e de impacto junto aos interlocutores os elementos provenientes da emoção, da pura conjugação de sentimentos. Quer um exemplo trivial? Comprar algo imprestável e ordinário, porque ficou “com pena” do vendedor ou votar no fulano,” porque meu pai pediu”.
Conhecer: verbo de longo alcance – Não é possível fazer qualquer ajuizamento sem avistar a coisa, sem conhecer os seus componentes, portanto, quem julga sem avaliar criteriosamente qualquer fato, pessoa ou contexto marca ponto na contabilidade do preconceito. Muitos costumam deixar que as palavras saiam irresponsavelmente das suas mentes e bocas, sem um mínimo de ponderação – e o pior também acontece: para não dar o braço a torcer, costumam manter a palavra, impressão ou julgamento injusto. Pensam que enganam, mas apenas os que refletem rasteiramente, sem analisar todos os lados da questão naqueles acreditam.
Fazendo a continha certa – Isenção partidária, crítica contundente e sagacidade são excelentes qualidades no pensamento dos que aferem valor a isto ou aquilo, mas todos nós, por mais que tenhamos cuidados, sempre deixaremos entrever envolvimentos e influências que contaminam feliz ou infelizmente nossos pareceres. É o ponto vulnerável avistado pelos opositores, mas quem tem a clareza desse calcanhar de Aquiles terá que se preparar para defender sem titubear a sua escolha, os seus motivos. Mentir ou driblar será encenar um teatrinho de mau gosto e péssimo exemplo à liberdade de expressão.
Alto lá! – Não sou crítica de cinema, nem terei ninguém para financiar a minha ida a qualquer sala de exibição; vou pagar pela minha entrada. Se, por acaso gostar ou desgostar do filme, comentarei aqui, pois a liberdade de apreciar algo, por mais contraditório que seja para algumas pessoas, sempre prontas a disparar o diacho em direção aos que se opõem às vigências, aos combinados ou aos frutos da liberdade, é destratá-las verbalmente, diminuir-lhes o mérito e aprisionar a liberdade de expressão das ideias. Atitude de fracos, perdedores e dos que fazem e acontecem sem racionalidade alguma, mas sempre há tempo para aprender e sair dessa caverna escura, sem claridades advindas pela lógica dos fatos.
Agora, prezado leitor, diga-me: você irá ao cinema neste final de semana ou nos próximos dias? Qual o título que assistirá? Pode justificar o que o levará a sair de casa para prestigiar este filme selecionado? Treine, assim, a argumentação, o convencimento e a explicitação de motivos. Na vida, diante de todos os fatos, é assim que agimos; todos vendemos um determinado peixe com as nossas ideias.
Sugestões em DVD:
Você já assistiu Meu melhor amigo( Mon Meilleur Ami), de Patrice Laconte ou A Onda(Die welle), de Denis Gansel? Eu os assisti durante esses dias de recesso; são ótimos exemplos de poder e persuasão, além de amostras espetaculares de excelentes roteiros e atuação de elenco. Recomendo essa dupla de dvds com olhos brilhantes de emoção, porque o espaço oferecido pela arte cinematográfica é de evasão dos sentidos, independente da presença ou ausência de explicações políticas ou de qualquer componente oportunista.
Até a próxima!