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Nada mais natural do que empunhar o saca-rolhas e abrir uma garrafa de vinho. Mas nem sempre foi assim. As garrafas de vidro, fechadas com rolhas de cortiça, são uma novidade relativamente recente, diante da saga milenar da bebida. Surgiu aos poucos, por volta de meados do século XVII, vindo a universalizar-se no século XIX. Ninguém discute ter sido uma das maiores revoluções tecnológicas na história dos vinhos, senão a maior.

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Até então a bebida era acondicionada em ânforas de barro, recipientes de couro ou de pedra e barris de madeira. Assim transportada e armazenada. Na hora de beber, vertia-se a uma jarra e daí aos copos, ou diretamente nesses. A conservação era bastante precária. O fator oxidativo, que transforma vinho em vinagre, agia com muita rapidez, tão logo um pouco de ar entrava no recipiente. Os barris e ânforas eram rapidamente vendidos da adega produtora aos comerciantes, que procuravam também distribuir a bebida o mais depressa possível, pois decaia e arruinava-se com certa rapidez.

Esse panorama mudou radicalmente, e para sempre, desde a revolução industrial, com a produção em massa da garrafa de vidro, resistente e vedada com rolha de cortiça, a preços bem condizentes, de modo que o custo do invólucro não competia com o do conteúdo.Com isso o vinho pôde viajar e descansar nas adegas com toda segurança, sujeito apenas ao lento e sadio amadurecimento pela ação do tempo.

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A cortiça foi fundamental, dadas suas propriedades únicas de elasticidade e poder de vedação, até hoje não obtidas por qualquer outro vedante. Atualmente, há rolhas alternativas, de borracha, plásticos, outros produtos e até mesmo as screw caps (cápsulas de torcer). Soluções adequadas para guarda por menor tempo, mas nenhuma equiparável a uma boa rolha de cortiça. Tanto assim que todos os grandes e mais caros vinhos do mundo continuam sendo vedados com a cortiça, ademais produto totalmente natural.

A evolução final aconteceu ainda mais recentemente, nos vinhos tranquilos, com o engarrafamento diretamente pelo produtor. O marco pioneiro é creditado a Armand Rousseau, talentoso vinhateiro da Borgonha, célebre pelo mais famoso rótulo de Chambertin do mundo. Na década de 1930 decidiu não mais vender seus vinhos em barris, para que os comerciantes e distribuidores os engarrafassem – prática corrente até então, mesmo para os vinhos mais caros do planeta. Passou a engarrafá-los diretamente na propriedade. Assim o vinho viajava ainda melhor, além de evitar o risco de engarrafamentos menos cuidadosos ou escrupulosos pela rede de distribuição.

A prática rapidamente espalhou-se por toda Borgonha, Bordeaux e pelo resto do mundo, até tornar-se universal e obrigatória cerca de 50 anos atrás, a partir da década de 1970. Notar que na Champagne o engarrafamento direto pelo produtor ocorreu muito mais cedo, pois não há como vender esse tipo de vinho a granel, que depende da garrafa e da rolha para formar-se.

Resolvido então o problema principal, com a proteção do vinho pela garrafa e rolha, restam os cuidados com a adega, ou ambiente de guarda da bebida. A seguir, 10 dicas bem práticas ao alcance de todos.

Dicas para uma boa conservação dos vinhos:

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  • 1. As garrafas devem ser deixadas na horizontal, rótulo para cima (para facilitar a identificação). Num ambiente sem luz, protegido de súbitas alterações de temperatura e livre de vibrações. 
  • 2.  A umidade relativa do ar não deve ser inferior a 50%, sob o risco das rolhas secarem e perderem a elasticidade, permitindo contato do líquido com o exterior e oxidando o vinho rapidamente.  
  • 3. Ar-condicionado é para evitar. Seca demais o ar e as rolhas. Os vinhos estragam. Idem geladeiras, úteis para esfriar uma garrafa ou mesmo mantê-la refrescada por pouco tempo, alguns dias no máximo; mas um desastre para guardar por período mais longo.  
  • 4. Adega climatizada é excelente, mas é essencial que tenha mecanismo de reposição da umidade interna, de modo que esta não baixe de 50%, ou perdem-se os vinhos guardados. 
  • 5. Quanto à temperatura, o mundo ideal para guarda prolongada é mantê-la fixa entre 14°C e 15°C. Até cerca dos 18°C é bem tolerável, não compromete tanto o amadurecimento da bebida, gerando efeito mais aparente depois dos 10 ou 15 anos de guarda. Acima dos 18ºC é de se evitar para guarda prolongada. Acima dos 25°C os riscos são cada vez maiores do vinho desandar, ainda que exposto por tempo mais curto.  
  • 6. Em lojas de vinhos e supermercados, em geral as garrafas ficam expostas na vertical e a temperaturas acima da faixa ideal de conforto. Não tem problema, desde que por um período de exposição menor e que a temperatura não exceda demasiado, nem oscile em excesso. Os cuidados mais rigorosos devem ser adotados quando se pretenda guardar por períodos maiores. 
  • 7. Um vinho muito especial pode viver na garrafa até 150 ou 200 anos, como comprovam alguns memoráveis Madeira, Porto e Bordeaux.  Contudo, a maior parte deve ser desfrutada de preferência nos 10 primeiros anos de vida. Em alguns casos especiais, como os Beaujolais e Vinhos Verdes, quanto mais jovem melhor. Sem passar dos dois anos, no máximo 4 ou 5 em rótulos mais diferenciados e bem armazenados.  
  • 8. Todos os vinhos têm um ciclo de vida. Ao amadurecer na garrafa ganham complexidade e harmonia até atingir o máximo, onde permanecem por um certo período e depois entram em decadência e fenecem. Os vinhos fortificados têm um período de vida e desfrute maior que dos outros tipos de vinhos. 
  • 9. Num vinho corrente, o ciclo é mais curto e o vinho não muda tanto. Dificilmente ultrapassa os 8 anos, nos casos dos tintos mais robustos; ou sequer os 5 anos, em casos de tintos mais leves, brancos e rosés.  
  • 10. Um grande vinho de guarda, em geral rótulos bem mais caros, por exemplo um famoso Chateau de Bordeaux de boa safra, pode levar cerca de 15 a 30 anos para atingir o apogeu. Lá se manter por mais 15 ou 30 anos, antes de começar um lento declínio.