O ano era 1780, aniversário de 21 anos de Josephine Girani – uma menina nascida e criada num vilarejo agrícola francês, próximo à bela Versalhes. Durante toda a sua vida, Jo sonhava com o dia em que tentaria a sorte na cidade vizinha, deixando para trás o luto por ter perdido seus pais e seu esposo tão cedo. Naquele ano, após perder seu pequeno pedaço de terra por conta de secas e inundações, Josephine obrigou-se a realizar seu sonho e tentar a sorte na grande Versalhes.
Josephine era uma alma corajosa e destemida e tinha certeza de que encontraria abrigo e trabalho na cidade que, mais tarde, arrebataria o coração da nobreza francesa, particularmente de Luis XIV.
E assim aconteceu. Vestida com trajes simples e com o mais radiante sorriso, ela bateu as portas da primeira bela casa que viu, logo na entrada da cidade e foi contratada sem mais delongas.
Sua função seria cuidar da Condessa Belle Beaumont, que com apenas 10 anos, fora acometida de misteriosa doença que a impedia de andar.
Josephine amou ao primeiro olhar aquela criança que há um ano não gozava mais da liberdade de correr pelos lindos jardins daquela glamorosa mansão e prometeu a si mesma, num arroubo de emoção, que tudo faria para tornar aquela frágil criaturinha, feliz.
Apesar do gênio forte e permanente mau humor de Belle, Josephine se esforçava diariamente para cumprir sua promessa.
Todos os dias a acordava cedo, logo quando os primeiros raios do sol iluminavam as janelas, levando um frugal desjejum à menina. Após a refeição, a banhava e trocava a camisola por lindos vestidos rendados.
Josephine sempre se surpreendia com a beleza de Belle. Sua tez extremamente pálida parecia refletir os raios de sol sob as roseiras e tudo se envolvia numa beleza triste e calada.
Além disso, Belle falava pouco – contudo, era esnobe e tinha horror que as pessoas chegassem perto dela ou a tocassem. Introspectiva e ranzinza, apesar da pouca idade, provocava em Josephine uma profunda piedade! Moça tão linda, tão rica, mas com uma vida tão enfadonha e limitada.
Entretanto, o amor que Josephine sentia era tanto, que ela nunca se queixou de nada – nem pela força física que tinha que fazer para carregar a menina por todo canto, nem por ter que lidar com dejetos ou por dormir pouco, visto que muitas vezes era obrigada a dormir no chão, ao lado de Belle, para ajudá-la a noite.
Os anos foram passando e em 1789 a França fervia. Josephine ouvia pelos corredores os cochichos dos demais empregados sobre um tempo novo, onde todos seriam iguais. Várias foram as vezes que escutou o lema: “Liberdade, igualdade e fraternidade”.
Achava lindo mas algo impossível! A cada desmando dos patrões, os olhos dos empregados chispavam de ódio e as batidas aceleradas de seus corações pareceriam bater forte, num misto de esperança e revolta.
De fato, não fora uma única vez que ela havia escutado conversas sufocadas dos pais de Belle, temendo por sua segurança.
E eis que no dia 14 de julho, com queda da Bastilha, aconteceu na vida de Josephine o evento mais marcante de toda sua existência.
Entre tiros e gritos, a mansão dos Beaumont foi invadida e os seus proprietários assassinados. Em meio a pilhagem do local, Josephine, desesperada, correu para o andar superior, pensando proteger sua amada Belle, agora uma deficiente órfã.
Empurrou uns, se libertou de outros e finalmente conseguiu chegar as portas do aposento.
Ao fechar as portas atrás de si, teve a maior surpresa de sua vida! Belle estava de pé, tentando abrir uma das janelas do quarto.
Ao ver Josephine, gritou ensandecida:
— “Vamos, sua lesa, ajude-me a fugir!”.
Como ela ficou petrificada, a moça continuou:
— “Surpresa em me ver andar, Josephine? Eu sempre pude andar, mas não sou obrigada a pisar no mesmo chão que seres inferiores como você.”
Josephine não conseguia proferir nenhuma palavra, permanecendo em estado de choque.
Belle, impiedosa, continuou a destilar suas palavras de veneno.
— “Sua burra! Eu sou nobre! Acha mesmo que algum dia teria que me limpar ou trocar minhas próprias roupas? É claro que não. Então meus pais contrataram uma plebeia como você para fazer esses serviços banais. Agora deixe de ser um estrupício e ajude-me!”
Quando conseguiu concatenar as ideias, não foi a revolta ou o ódio que brotou em seu coração… A compaixão veio forte e ela lamentou profundamente por Belle ser sã das pernas e ter uma deficiência tão grave na alma.
Olhou mais uma vez nos olhos de Belle, girou os calcanhares e foi embora, determinada a escrever um novo capítulo de sua história.
Por Danielle Lourenço
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