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Panela do Anacreon

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A feijoada raiz do Ao Distinto Cavalheiro. E com o prato montado à la Pedro Nava

A Feijoada do bar O Distinto Cavalheiro é completa, daquelas recomendadas pelas origens. (Foto: Anacreon de Téos)

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Tempos atrás, perante a crescente gourmetização das feijoadas, sob justificativas da tal “alimentação saudável”, das correntes fitness e outras alegações, comecei uma pesquisa muito particular, que denominei “em busca da feijoada perfeita”.

Escrevi uma série aqui, mas agora, infelizmente, perante algumas mudanças no sistema do site, não consegui localizar os textos. Pena, mas não custa repetir alguns itens que nortearam a minha busca.

A feijoada perfeita é aquela que, segundo o cronista Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta, lá dos anos 60 e 70, “exige sempre uma ambulância na porta”. Ou seja, leva tudo o que a tradição exige, incluindo pé, orelha, rabo e outros itens que são a alma do prato. E não pode se resumir apenas a costelinhas, carne seca, calabresa e paio, como tantas que existem por aí. Isso não é feijoada e não pode ser chamada assim. É, digamos, feijão com carnes. E ponto.

Tanto que me lembro de uma vez ter sido convidado para ver como era o preparo de uma das mais badaladas feijoadas da cidade. Orgulhoso, o cozinheiro me explicou que era preparada na quinta, ficava descansando até sexta, quando, depois de esfriar, retiravam toda a camada de gordura acumulada por cima e já estaria pronta para ser servida no sábado. É... pois é.

Foi aí que decidi buscar pelas melhores. Fui pesquisando e provando por aí. Talvez agora não me recorde mais de todas as que seguem exatamente os preceitos do prato verdadeiro, mas me lembrei da do Pachá, do Feijão da Carmen, da Vallentina, do Tiki Taka (que é dos mesmos proprietários do Puina's Bar, da famosa Feijoada da Dona Cacilda, vencedora do Prêmio Bom Gourmet 2019) e do Pantagruel.

Algumas delas são cozidas normalmente, mas, na hora de servir, as peças que causam repugnância (será que o termo é esse?) em algumas pessoas são separadas e vendidas apenas aos que apreciam o prato com toda a intensidade. Caso da Vallentina, que divide sua feijoada em Casagrande e Senzala, justamente com essa separação.

Como peço sempre a completa, com os componentes da Senzala, não me importo. Minha mãe, que no pique dos seus 91 anos, também aprecia a feijoada raiz já chegou a me perguntar se não seria possível encomendarmos somente a parte da Senzala. Olha, é de se pensar.

A embalagem para viagem da feijoada do Ao Distinto Cavalheiro. (Foto: Foto: Anacreon de Téos)
A Feijoada em casa. Farta para duas pessoas, com todos os itens necessários, por R$ 49,90. (Foto: Foto: Anacreon de Téos)

A feijoada do Distinto

Certamente existem outras boas e verdadeiras feijoadas por aqui. E que seguem a linha autêntica, como o Onha já fazia décadas atrás, no seu restaurante da Vila Tingui. E que tem alguns bons seguidores, felizmente, até os dias de hoje.

Caso específico do Ao Distinto Cavalheiro, bar de muita história em Curitiba, com mais de 20 anos de funcionamento e que chegou até a ter o seu Carnaval próprio, animando aquela esquina da Saldanha Marinho com a Visconde do Rio Branco, no Centro.

O jornalista Dante Mendonça (colunista aqui da casa e parceiro antigo de lides em redação) vinha me dizendo a todo instante que a tal feijoada era boa. E ele é testemunha permanente há alguns anos do que ocorre no estabelecimento, pois mora a duas quadras dali. Desde os tempos que não havia feijoada, somente alguns petiscos e as bebidas.

A feijoada é coisa recente, fruto da inspiração de José Renato Cella, um dos primeiros clientes do local e proprietário desde o ano passado, quando sentiu que as coisas não andavam bem e decidiu comprar o bar, que estava passando por maus momentos financeiros.

Cella é advogado, professor, produtor de café em Minas Gerais e, para se divertir e poder continuar frequentando, comprou o Distinto. E logo de pronto, aproveitando o fechamento de março de 2020 por conta da pandemia, reformou o local, que deixou de ser um botecão para se transformar no que hoje chamam de gastrobar. Até com cardápio diário para almoço. Com pratos executivos de frango e filé, alguns pratos à la carte de categoria, dentre os quais a Moqueca de camarão que Cella levou para o livro Cozinheiros de Quarentena. O almoço não é apenas almoço, pois os pratos são servidos a qualquer momento, enquanto o bar estiver aberto.

Dante Mendonça descobriu que Cella é bom cozinheiro e lhe deu três páginas no livro, lançado há poucos meses e do qual também tenho o orgulho de participar. E ficou insistindo para eu conhecer a feijoada dele.

Como não costumo resistir às tentações, sábado passado fui lá conhecer. Encomendei e fui buscar para dividir com minha mãe – claro. Tive ainda tempo de fotografar a feijoada à mesa, com toucinho, arroz, laranja, couve, farofa e vinagrete, tudo o que compõe o prato e que também segue para viagem.

E ela já fica saborosa a partir do preço: R$ 49,90, para a pessoa se servir à vontade. E que, em casa, deu para duas pessoas e ainda um pouco de lambuja.

A montagem da Feijoada segundo recomendava o escritor Pedro Nava, na mesa do bar Ao Distinto Cavalheiro. (Foto: Foto: Divulgação)

O estilo Pedro Nava

Nesse meio tempo descobri mais uma coisa. Se a receita original da feijoada do Distinto foi inspirada nas tradições da própria família de Cella, há um estilo de servir que é completamente diferente do estilo que normalmente conhecemos por aí. É o resultado de uma pesquisa do escritor e médico Pedro Nava, falecido em 1984, no Rio de Janeiro.

Um artigo escrito pelo jornalista Fábio Campana na revista Ideias, ele lembra que Nava dá a própria versão da história do prato, com origem nas Gálias e recriação no Rio. O leve e saboroso texto de Nava é transcrito na íntegra e vale a leitura (confira aqui), até mesmo para poder saborear a feijoada com mais intimidade.

Ele conta como o prato deve ser montado, servido. Item por item distribuído harmoniosamente, para chegar ao melhor resultado na combinação de sabores.

E aí vem o melhor: por inspiração de José Renato Cella, se o cliente pedir, a Feijoada do Distinto pode ser montada no prato, por Dermival Moreira – o cozinheiro da casa -, seguindo todas as recomendações de Pedro Nava. Mas só para ser servida no local.

Já vi que terei de voltar lá mais cedo do que imaginava.

Ao Distinto Cavalheiro agora, depois da reforma, também conta com um agradável espaço externo. (Foto: Foto: Divulgação)

Ao Distinto Cavalheiro

Rua Saldanha Marinho, 894 – Centro

Fone: (41) 3019-4771

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