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Para gente que gosta de cozinhar a próxima refeição pode ser (e é, quase sempre) uma surpresa.

Por depender de uma série de circunstâncias, como o desejo repentino, a oferta inesperada, o desafio de última hora, tudo a ver com a vontade de poder saborear o melhor possível – dentro do que o orçamento pode oferecer.

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Funciona assim comigo e com o meu pessoal.

Com algumas exceções, aquelas de desejos que se arrastam por semanas e finalmente podem ser concretizados por conta de um ingrediente ou outro que não está mais faltando, boa parte do que se come por aqui não se tem ideia até a última hora. Como ocorreu nesse fim de semana, por exemplo, com dois pratos deliciosos que surgiram assim, de repente, para satisfação e prazer dos comensais.

A inspiração da entrada veio da Trattoria do Victor, onde estivemos, Graça e eu, jantando dias atrás. Tinha lá uma entradinha chamada Luna de siri, com bela foto no cardápio. Pedi e era realmente muito saborosa, com uma camada inferior de couscous e por cima um refogado atomatado de carne de siri.

Como o chef Claudinei Oliveira está de férias e o Chico Urban, dono da casa, não se encontrava, não tive como perguntar como era feito. Mas fui pesquisando o prato, desmanchando tudo, descobrindo que o crocante do couscous era cenoura em cubinhos (julienne) e que também havia uns verdes. No siri, um ragu bem simples, valorizando a carne do crustáceo. E a combinação muito bem apresentada, redondinha, moldada no aro.

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Bateu o desafio de fazer. E assim foi feito. Deu muito certo, embora, comparando as fotos, tenha a impressão de o deles ter o couscous mais amarelinho. Nem posso dizer que o feito em casa ficou mais bonito, pois a foto do restaurante foi feita com celular e o daqui com máquina. Tem toda a diferença.

Mas o importante foi que o sabor estava irrepreensível e ainda dei um charme final, decorando as flores de coentro lá da plantação do latifúndio.

Se a entrada veio da curiosidade e da provocação de tentar reproduzir o que havia sido servido no restaurante, o prato principal veio da tentação da oferta no balcão da peixaria. Ou Pescados Keli Mozer, que é como se chama o empreendimento que os irmãos Mozer (Paulinho e Pablício) administram no Mercado Municipal de Curitiba.

Compro praticamente tudo lá e, de vez em quando, brinco com eles ao telefone, perguntando: “o que vou jantar hoje?” É a deixa para me dizerem o que tem de novidade interessante e saborosa no balcão de ofertas.

Mas dessa vez nem precisei perguntar. Ia comprar um robalo (meu peixe favorito) para o almoço, o siri para a receita da Luna de siri e ficaria apenas nisso se não tivesse visto umas belas lulas em exposição na vitrine do balcão. Lulas inteiras, como se tivessem saído da água poucos instantes atrás. Vindas de Florianópolis, onde são pescadas no zangarilho, uma variação da garateia (sem fisga), que são aqueles anzóis múltiplos que ficam mexendo na água, sem isca nem nada, atraindo as lulas (bobinhas) para a pesca.

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Acho as lulas locais bem mais saborosas que as de fora. Tirando que não vêm congeladas, são frescas, cheirando a mar. Inteiras e não somente tubos ou anéis.

As lulas inteiras permitem mais opções ao cozinhar, a começar pelo aproveitamento da tinta, que sempre é um toque a mais em qualquer prato. Como fazem os espanhóis com seus Calamares en su tinta, no qual as lulas são cozidas em molho com a própria tinta de defesa dissolvida. Já me referi ao assunto aqui no blog algumas vezes, inclusive com a receita do prato clássico. A mais recente foi essa daqui, de 2013.

Trouxe as lulas, evidentemente. E pensei em utilizar a tinta para tingir um arroz, prato que já havia comido por aí (tento me lembrar onde e não consigo), mas nunca tinha sido executado aqui nessa cozinha anacreônica. Mas como tudo tem uma primeira vez, fomos à luta, dando uma leve pesquisada para tirar possíveis dúvidas. E aí me lembrei que tanto os portugueses quanto os espanhóis – que empregam esses processos com arroz, dos arrozes de pato e de Braga à paella – costumam utilizar o arroz carolino, mais miudinho e que emite uma goma cremosa, sendo, por isso, mais indicado aos pratos ditos “molhados”. Tinha visto arroz carolino no supermercado Festval, fui lá, conferi e comprei.

Aí foi só tratar de executar o prato. A consistência ficou fantástica, o resultado final idem. Um alvarinho resolveu tudo na taça e o fim de semana de sabores registrou grandes prazeres.

Para não dizerem que sou egoísta, aqui vão, então, as duas receitas. Da entrada e do prato principal. Pode arriscar que (tirando limpar a lula, que exige um pouco mais de atenção) dá para fazer na boa. E arrancar aplausos.

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Vamos conferir, então?

Luna de siri

Inspirada em receita original da Trattoria do Victor

½ kg de carne de siri

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½ cebola picada

3 tomates, sem peles nem sementes, picados grosseiramente

3 colheres (sopa) de passata de tomates

2 colheres (sopa) de salsinha picada

3 colheres (sopa) de azeite de oliva

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1 dente de alho, picado

150g de couscous

1 colher (sopa) de manteiga

½ cenoura cortada em cubinhos

1 colher (sopa) da parte branca das ciboulettes, picadas

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Sal e pimenta-do-reino (moída na hora, de preferência)

Flores de coentro para decorar.

Preparo

Aqueça 2 colheres de azeite e refogue a cebola em o alho até que murchem.

Junte os tomates e refogue até que comecem a se desmanchar. Quando estiveram começando a secar adicione a passata e deixe cozinhar, até que a mistura fique consistente, mas ainda pedaçuda.

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Junte o siri e a salsinha, tempere com sal e pimenta e cozinhe por mais um tempo, até que praticamente todo o líquido tenha desaparecido.

Enquanto isso, aqueça 150 ml de água em uma panela, com o azeite restante.

Assim que ferver desligue o fogo e junte o couscous, misturando bem e deixando descansar por 3 minutos.

Acrescente a manteiga, a cenoura e o ciboulette ao couscous, volte ao fogo por mais 3 ou 4 minutos, mexendo sempre com um garfo, para que a manteiga derreta e tudo se incorpore.

Montagem

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Distribua o couscous em menos da metade de um aro redondo (com 8 cm de diâmetro), aperte bem e complete em cima com o refogado de siri.

Retire o caro, cuidadosamente, e decore com flores de coentro.

Rendimento: 6 porções.

Arroz negro de lula

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3 colheres (sopa) de azeite de oliva

¼ de cebola picada

4 colheres (sopa) de passata de tomate

600g de lulas inteiras (com as bolsas de tinta)

1l de caldo de peixe

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150g de arroz carolino

sal e pimenta-do-reino (moída na hora, de preferência)

Preparo

Limpe as lulas, preserve os tentáculos e corte os canudos em pedaços, riscando a superfície da pele em quadrados, para que se enrolem ao cozinhar.

Antes de descartar o que extrair do interior das lulas, retire cuidadosamente as bolsas de tinta e reserve-as.

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Aqueça 2 colheres do azeite em uma panela, junte a cebola picada e a passata de tomate. Refogue por alguns instantes, até que a cebola murche.

Acrescente as lulas e deixe suar por 5 minutos.

Em seguida, adicione o arroz e refogue por mais 5 minutos.

Abaixe o fogo e comece a regar com o caldo de peixe, usando aproximadamente ¾ do total. No último ¼ do caldo dissolva a tinta de lula espremendo em uma peneira e junte à mistura ao arroz.

Cozinhe até o arroz absorver quase todo o líquido. Retire do fogo, tempere com sal e pimenta e regue com o azeite restante.

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Rendimento: 2 porções.

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