Extrassensorial. Não tem outra maneira de definir a sensação de poder estar na atmosfera do Obst..
Não são apenas sabores. São cores, luzes, clima, astral, energias a contagiar todos aqueles que têm a feliz oportunidade de frequentar o novo restaurante de Lênin Palhano. Aliás, não é bem um restaurante, é um estado de espírito – eu arriscaria dizer.
Não há pratos, há porções. Boa parte delas para comer com as mãos e dividir experiências, embora sempre haja alguma sugestão empratada, nas cumbucas, fustigando pelas memórias dos primeiros ou recentes tempos de Palhano na cozinha.
Tudo isso é fruto da montagem de uma equipe de respeito, a começar pelo próprio chef – e sócio da casa. Ele tem como braço direito a arquiteta – por formação - Júlia Schwabe, que um dia decidiu cozinhar, fez Le Cordon Bleu e foi pras panelas. Veio com ele do Nomade, onde colecionaram anos e anos de sucesso. Como sabe exatamente com o chef pensa, pode assumir a cozinha – e o tem feito - quando ele estiver pesquisando algum novo ingrediente, um fornecedor escondido ou uma técnica a ser aperfeiçoada.
A ideia da casa é integrar comidas e bebidas, como se fossem um tudo, um todo. Por isso o sommelier Vinícius Chupil – também sócio e com marcante passagem por outros restaurantes, ultimamente o La Varenne – montou uma carta de vinhos versátil e poderosa, que tanto pode oferecer uma taça de um vinho correto quanto uma garrafa de outro, irrepreensível.
Como tem outra fera nos drinques, o bartender Zé (ele sempre usou somente o Zé, mas agora também inclui o sobrenome Zwaiger), o cerco se completa. Ele, que teve passagem com o próprio Palhano no Nomade e fez muito sucesso no Officina Restô Bar, onde criou coquetéis temáticos, inclusive ligados à história e à literatura.
Cada dia é resultado de uma inspiração consequente dos insumos e ingredientes disponíveis. É como se a cada dia a brigada estivesse inaugurado um restaurante novo, pois tudo ali vai depender do que estiver à mercê. Por mais que um prato ou belisco faça o maior sucesso, nada garante que estará sendo servido novamente no dia seguinte.
E é por isso que o Obst. atrai. Pelo inesperado, pela expectativa do que possa ser oferecido, em qualquer um dos desdobramentos do menu, que é dividido em “Coma com as mãos”, “Use os talheres”, “Memórias na cumbuquinha” e “Doces”.
Degustação
No dia que lá estive, do primeiro item veio um Tartar de vieiras. Mel de Emerina. Creme de lima kaffir. Beldroega. Bottarga. Lardo. Assim mesmo, juntando apenas os elementos, um molusco (dos mais nobres), o incomparável mel de abelha sem ferrão, o toque asiático da kaffir, a panc (beldroega, um matinho que tem em quase toda parte), a bottarga (ova de tainha curtida) da costa catarinense e o lardo do nosso Porco Moura, reabilitado no Paraná. Deu para perceber? Gordura, doçura, acidez, cura e quintal. Tudo na medida exata para não agredir o delicado sabor das vieiras.
Também veio Nori crocante. Polvo.Missô com cachaça. Abacate. Uma alga nori tostada (que Palhano já usava bastante no Nomade), uma base de abacate e missô misturado na cachaça e, por cima, pedacinhos de polvo. Pronto. Perfeito.
Não resisti e pedi também algo que me intrigava: Sonho de foie gras. Pato curado. Laranja. O foie estava compondo a massa, que se desmanchava na boca e passava todo o prazer do que ele representa. A cobertura com a tira de pato completa a linha, que vai para o contraste da adocicada acidez da laranja em compota e das bolinhas de mostarda em conserva. Se não tivesse de provar mais itens do menu, certamente repetiria algumas vezes.
Para usar talheres veio a Linguiça de camarão. Porco Moura. Iogurte com Wasabi. Farofa. Curiosa e intrigante combinação, mas que também se amalgamou no paladar.
Entramos nas “Memórias na cumbuquinha” com um prato que nem cheguei a pedir, mas o chef me enviou direto, sabendo que aprecio muito. Esse item permite a viagem por pratos que marcaram a carreira dele nesses anos todos de sucesso. E esse prato, em especial, também me marcou: Pato de panela. Purê de batata (2012). Originalmente o prato se chamava Pato na panela, havia sido criado pelo chef Eric Jacquin já nos primeiros dias do restaurante C La Vie, tendo sido mantido e valorizado por Lênin Palhano no comando da cozinha da casa. Originalmente era servido com três tipos de cogumelos e acompanhado por um cremoso purê se batatas. Foi premiado como melhor prato principal no Prêmio Bom Gourmet daquele ano, inclusive com meu voto. No Obst., mantém os ingredientes, todos na mesma cumbuca.
De sobremesa, Rabanada. Doce de leite. Sorvete de leite. Creme de tonka. Fava tonka é a baunilha brasileira, que completa com garbo os demais sabores da fofa fatia de brioche.
E muito mais
Por curiosidade e comparação fui dar uma olhada nos menus dos outros dias. Para citar pelo menos alguns itens, tem Ostras Nativa. Creme de capim-limão com coco. Laranja., Chips de arroz. Tartar de Cordeiro. Iogurte. Hortelã. Relish de cebola., Língua defumada. Cogumelos. Brioche., Croquete de pato. Aïoli. Laranja., Carré de cordeiro. Ervilha. Gremolata de ervas., Entranha de Wagyu. Maionese de mandioquinha. Caldo de cebola., Camarão na brasa. Grão-de-bico. Lardo. Caldo de porco. Alho-poró. e Arroz de bacalhau. Ovo perfeito. Palha de mandioquinha (2016) – este último na primeira linha dos favoritos dentre os menus que Palhano montou no Nomade.
E continua assim, todos os dias. Não tem erro, sempre haverá algo a surpreender o paladar de quem aprecia a boa comida e curte as boas sensações. E Lênin Palhano vem provando – nesses anos todos, embora ainda seja jovem – que é possível, sim, emocionar com uma bocada de comida. Ele e sua equipe, claro, que, entrosada, mantém a satisfação do cliente continuadamente em alta. E querendo voltar sempre e sempre.
Afinal de contas, não é simplesmente comer por comer. É o todo, que, prazerosamente, nos leva às sensações extrassensoriais.
(Escrevi sobre a expectativa da inauguração do Obst em novembro passado.)
Obst.
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Fone: (41) 98822-2667
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