Hoje caiu de moda e muita gente não tem ideia do que se trata. Até por conta das tantas experiências com molhos, desconstruções, reinterpretações e outros atalhos encontrados pelos chefs da atualidade. Mas teve uma época que era um grande sucesso. Feliz daquele que podia provar uma Lagosta ao Thermidor, um clássico que bombou ali pelo mesmo tempo dos primórdios do Coquetel de camarão e do Frango à Califórnia – anos 70, para ser mais exato.
Era meu início da carreira – na imprensa esportiva – e, na ocasião, pela falta de transmissões diretas pela TV, viajávamos muito por aí, Brasil a dentro. São Paulo e Rio de Janeiro, então, pelo menos duas vezes por mês. Nossos campeonatos terminavam por aqui e lá íamos nós, cobrir as finais daqueles estados, com os times mais populares do país.
Na disposição das escalas, torcia sempre para cair no Rio de Janeiro. A viagem era meio complicada, pois só tinha um voo direto para lá – pela Cruzeiro do Sul – ou as escalas em São Paulo, bem mais demoradas. Mas valia a pena, pelo trabalho em si, claro, mas principalmente pela chance de comer Lagosta ao Thermidor.
Sim, lagosta, muito acima da casinha para um jovem iniciante repórter esportivo. Era no restaurante La Fiorentina - que existe até hoje -, situado no Leme, e tinha na parede e nas colunas autógrafos dos principais artistas do momento. Todos iam lá, de vez em quando a gente encontrava alguns deles. Mas o que eu queria encontrar, mesmo era a tal lagosta.
Lembro que comia algo bem leve – e baratinho, para a verba da viagem permitir pagar o jantar - antes da transmissão e, depois da partida, no La Fiorentina, vinha aquela tal lagosta. Sublime, dos deuses, de comer ajoelhado – como se diz hoje por aí.
Tinha lagosta por aqui, claro. Fui constatar alguns anos depois, nas primeiras incursões pelo Mercado Municipal de Curitiba. Havia uma peixaria, não me lembro o nome, mas era do Ludovico Serpa, que ficava onde hoje os irmãos Mozer fazem sucesso com a Pescados Keli Mozer (e onde também tem lagosta, claro). Ele distribuía um livrinho de receitas e ali ensinava a fazer lagosta.
Iniciante ainda, tentei fazer e não acertei. Ficava borrachuda, eu cozinhava demais. Mas aí me caiu nas mãos uma receita a thermidor que não era lagosta: um Linguado ao Thermidor. Estava num livro que comprei, “O grande livro ilustrado de cozinha da Abril”, um copyright da 1980 da Abril Cultural para o original “The good housekeping step-by-step cook book”.
Resolvi arriscar, dando uma espiadinha no passo-a-passo. E não é que deu certo? Motivo de euforia para aquele jovem querendo aprender a cozinhar algumas coisinhas. Tanto que chegou a virar peça de resistência para receber alguns amigos à mesa, dali em diante.
Só que o tempo foi passando, novas informações chegando e a receita foi esquecida. Dias atrás, entre o material de divulgação que recebo para postar aqui nesse blog, tinha a divulgação de um cardápio com um camarão ao thermidor. Claro que bateu o sininho e resolvi refazer a receita. Do linguado, claro.
Saiu no domingo passado e é um prato bem bacana mesmo para esse dia tranquilo da semana, com todos da família em volta da mesa. E não é difícil, tanto que publico a receita aqui como uma sugestão para o almoço deste domingo que chega. Ingredientes fáceis de serem encontrados (o linguado veio da Keli Mozer, chegue lá e peça a alguém da família Mozer os filés de linguado bem fininhos – e pode dizer que fui eu que sugeri).
Os demais ingredientes estão sempre à mão e talvez haja um pouco mais de procura no Jerez. Mas tem no Mercado Municipal também, na Adega Brasil – fora do mercadão, já vi na Adega Passione, na Saldanha Marinho. Melhor se for o fino, o seco. Pode ser substituído pelo italiano Marsala (também seco) e alguns arriscam brandy (conhaque), que também passa.
Uma dica importante: usar leite integral, não o desnatado nem o semi. Não dão a mesma consistência final. Nem o mesmo sabor.
Vamos à receita, então?
Bom apetite!
Filés de linguado ao Thermidor
Ingredientes
5 colheres (sopa) de manteiga
8 filés finos de linguado (cerca de 1kg)
Sal e pimenta-do-reino (moída na hora, de preferência)
1¼ xícara de leite integral
3 colheres (sopa) de farinha de trigo
1 xícara de queijo prato ralado
3 colheres (sopa) de vinho tipo Jerez seco
Páprica
Preparo
Aqueça o forno a 180º.
Numa panelinha, derreta 2 colheres (sopa) da manteiga e pincele os filés. Tempere-os com sal e pimenta.
Enrole cada filé e arrume-os, com a parte da dobra virada para baixo, numa assadeira quadrada (22,5 cm de lado). Despeje sobre os filés ½ xícara de leite e asse-os por 25 minutos ou até que estejam macios.
Enquanto isso, derreta a manteiga restante. Junte a farinha de trigo e misture bem, deixando corar em fogo médio. Adicione o leite restante, aos poucos, mexendo constantemente, e deixe cozinhar até engrossar.
Terminado o tempo de forno, retire o líquido do cozimento da assadeira e adicione ¼ de xícara ao molho branco.
Acrescente o queijo ralado e o Jerez, continue cozinhando e mexendo até o queijo derreter.
Derrame a mistura de molho branco e queijo sobre os filés, salpique com páprica e leve-os ao grill (ou ao forno bem forte) por cerca de 1 minuto, para gratinar.
Rendimento: 8 porções.
Thermidor, a origem
A origem do nome Thermidor é bem estranha. Tem a ver com o mês de julho, que os franceses – para fugir do calendário gregoriano – chamavam de thermidor, devido ao calor. Foi neste mês, em 1794 que ocorreu o fim da Época do Terror, na França, e se viu o grande líder revolucionário Robespierre ser denunciado, preso e decapitado.
Em 1891, um dramaturgo francês chamado Victorien Sardou estreou no Teatro Nacional Francês - o Comédie-Française - uma obra sobre a Revolução Francesa, que levava o título de “Thermidor”. Foi uma polêmica total, gerou um escândalo tão grande que não se falava em outra coisa. A ponto de a esperteza de um cozinheiro de um restaurante próximo ao teatro, o Chez Marie, se aproveitar da onda, lançando a lagosta cortada ao meio, com um molho diferente do que fazia. Era a Lagosta Thermidor. Possivelmente inspirada em um prato criado em 1876 por Charles Ranhofer chef do Delmonico’s, de Nova York.
Sua versão consistia de lagostas cobertas por um molho de creme de leite, vinho Madeira e pimenta caiena. O nome original era Lagosta a la Wenberg, em homenagem ao capitão da marinha chamado Ben Wenberg, que costumava frequentar o restaurante e havia indicado Ranhofer ao cargo.
Como os dois brigaram dali um tempo, o prato foi retirado do cardápio. Mas o sucesso já era tal que os clientes exigiram a volta. Ranhofer mexeu em algumas letras e Wenberg virou Newberg e aí ele até alterou um pouco a receita.
E o Newberg, com o tempo, acabou se transformando em Newburg – que é como conhecemos hoje -, sendo mais comum, até, no acompanhamento de camarões.
Veja uma receita de Lagosta à Newburg publicada aqui no Bom Gourmet.
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