Quem acompanha o blog, aqui, deve se lembrar que semanas atrás escrevi sobre uma pesquisa que estou fazendo em algumas revistas gastronômicas do século passado. Nada tão longe assim, claro, mas anos 80 ou 90, que foi quando comecei e me aprofundar um pouco mais nesses prazeres da gastronomia.
Minha motivação maior foi o excesso de publicações atuais propondo receitas com recursos além do fogão. Sous-vide, vácuo, essas coisas que não estão ao acesso de qualquer mortal e que (pelo menos por enquanto) não valem o investimento para quem quer cozinhar de vez em quando.
E nessas revistas lá do passado não tem nada disso. É tudo no braço mesmo, na inspiração e nos recursos ao alcance de qualquer um. Como nos tempos em que comprava essas publicações ainda não tinha a destreza de hoje na cozinha (detestava pelar tomates, por exemplo, por não saber exatamente como fazer), deixei passar muitas receitas interessantes, que estou reabilitando agora.
Na releitura da Gula 25 (de outubro de 1994), edição dedicada a Antonin Carême, o pai da cozinha francesa, encontrei algumas receitas bem interessantes. Mas, antes de ligar o fogão, preciso registrar um anúncio nessa edição que tudo tem a ver com a nossa gastronomia curitibana. Anúncio de página inteira, convidando para uma semana italiana, com quatro chefs do maior respeito. O evento aconteceria no Fulvio Ristorante, uma casa super agradável ali na Avenida Iguaçu, comandada pelo chef italiano Fulvio Furin, que fez de Curitiba sua nova terra. Furin cozinhava muito (era um especialista em alcachofras) e faleceu há dois anos, aos 76 anos, quando ainda dirigia um buffet no bairro em que morava.
Além de Furin, participava também do festival o chef José Serra, na época do Hotel Mabu e hoje professor do Centro Europeu, uma identidade da cozinha paranaense. E mais dois cozinheiros que até hoje estão na estrada: Celso Freire (com jeito de adolescente na foto), com seu Boulevard bombando de novidades e que hoje se prepara para uma grande empreitada em sua própria casa e Fabiano Marcolini, então no Business Club e que hoje, depois de tocar por anos o Villa Marcolini, tem em seu Fabiano Marcolini Alimentari um ponto de referência para quem aprecia boa comida por aqui.
Mas, então, voltemos à nossa revista e aos pratos que recuperamos nesse fim de semana.
O primeiro foi um Mero aromatizado com limão, executado por Sergio Cusin, na ocasião proprietário do restaurante Dressing, em São Paulo.
Foi nosso jantar de sábado. Problema principal foi encontrar o mero por aqui. O peixe está ameaçado de extinção e sua pesca proibida até 2015. Tentei encontrar um substituto, conversando com o Paulinho Mozer (da Peixaria Keli Mozer, no Mercado Municipal), que é quem entende muito de peixe. Precisaria, então, de um peixe de carne consistente para resistir ao cozimento na água e depois à finalização.
Infelizmente ele não tinha nenhum disponível que não fosse o cação. Serviu em consistência, mas ficou devendo no sabor. O prato é bem bacana, a começar pelos acompanhamentos, com os tomates recheados com ricota, cogumelos e creme de leite, a pupunha e as cenouras fazendo o molho com a manteiga e o vinho branco. Vale a pena experimentar, mas com cação não funciona muito bem, pois justamente o peixe fica devendo no sabor.
Da mesma revista veio o almoço desse domingo, receita de Christian Jean-Marie Formon, que naquela edição era saudado como “um marquês de verdade que trocou seu castelo na França por uma cozinha no Brasil” – estava no Buffet Charlô, de São Paulo. Hoje Formon tem seu próprio buffet, o Buffet Christian Formon, também em São Paulo.
A receita do chef francês era um Noisette de cordeiro com mousse de abóbora e cebolinhas glaceadas. Nada mais francês, vamos admitir. E aí não teve qualquer erro na execução. Ainda no Mercado Municipal, no Açougue Pé de Boi, pedi para desossar uma paleta de cordeiro para poder ter a carne do jeito que desejava, com ossos suficientes para fazer o caldo. Ficou bom. Aliás, muito bom. Mas acho que ainda pode ser melhor com um lombo ou mignon. É de se experimentar.
Os acompanhamentos, perfeitos. A Mousse de abóbora é delicadíssima e serve de guarnição para outros pratos de carne. E as Cebolinhas glaceadas estão em vários pratos franceses, a começar pelo clássico Boeuf Bourguignone.
Quer dar uma conferida nas receitas? Vamos lá, então.
Mero aromatizado com limão
Ingredientes
Peixe
4 postas de mero de 200g cada
½ cebola picada
Sal
Tomates recheados
6 tomates médios, maduros e firmes
50g de manteiga
120g de ricota fresca
1 cálice de chardonnay
2 cálices de creme de leite fresco
100g de champignons picados
folhas de manjericão picadas
sal
Molho
50g de manteiga
Suco de um limão e meio
1 cálice de chardonnay
1 cenoura média ralada em fios
Sal
Montagem
8 ramos de manjericão
Nirá ou ciboullete
4 folhas de alface americana (mergulhadas por alguns segundos em água morna)
4 fatias de palmito
Preparo
Peixe
Cozinhe as postas de peixe em água fervente, com cebola e sal.
Retire e reserve o peixe.
Tomates recheados
Retire a pele dos tomates.
Corte quatro deles ao meio, retirando a polpa e as sementes. Reserve-os.
Retire as sementes dos dois tomates restantes. Pique-os e reserve-os.
Para o recheio, aqueça a manteiga em uma frigideira e junte a ricota, o vinho branco, o creme de leite, os champignons, o manjericão, os tomates picados e o sal.
Mexa bem, até obter uma pasta uniforme, e retire do fogo.
Recheie os tomates e leve-os ao forno a 150ºC, por 6 minutos.
Molho
Derreta a manteiga a acrescente o suco de limão, o vinho branco, os fios de cenoura e o sal, mexendo sempre.
Deixe alguns instantes no forno e retire.
Finalização
Forre a metade de cada um dos pratos com uma folha de alface.
Coloque uma posta de peixe dentro de cada folha de alface e regue com o molho.
Distribua duas metades de tomate por prato, intercalando com uma fatia de palmito.
Enfeite com o manjericão e os tufos de nirá (ou ciboullete).
Rendimento: 4 porções.
Noisette de cordeiro com mousse de abóbora e cebolinhas glaceadas
Cordeiro
1,2 kg de cordeiro
1 cenoura em cubos
1 cebola em cubos
1 talo de salsão em cubos
Água
3 dentes de alho cortados ao meio
2 colheres (sopa) de óleo
2 folhas de louro
Tomilho a gosto
Sal e pimenta-do-reino (moída na hora, de preferência)
Mousse de abóbora
1 kg de abóbora
1 colher (sopa) de manteiga
200g de cebola picada
1 colher (café) de cominho
1 colher (café) de açúcar
3 ovos inteiros
3 gemas
Sal e pimenta-do-reino
Manteiga para untar as forminhas
Cebolinhas glaceadas
12 cebolinhas
½ colher (sopa) de manteiga
2 colheres (sopa) de açúcar
200 ml de água
Preparo
Cordeiro
Desosse cuidadosamente a carne de cordeiro e descarte toda a gordura. Tempere com sal e pimenta e reserve.
Asse os ossos até dourar. Coloque-os em uma panela com a cenoura, a cebola, o salsão, o alho, o louro, o tomilho, o sal e a pimenta.
Cubra com água e cozinhe por duas horas, em fogo baixo e com a panela tampada.
Coe o caldo em uma peneira, reduza-o se for necessário e reserve-o em lugar aquecido.
Mousse de abóbora
Refogue a cebola na manteiga, em fogo baixo.
Junte a abóbora, o açúcar, o cominho, a pimenta, o sal e deixe cozinhar até a abóbora ficar macia.
Passe-a para o liquidificador e bata-a com os ovos e as gemas.
Unte quatro forminhas, coloque a mousse de abóbora e leve-as ao forno, em banho-maria, por 30 minutos.
Cebolinhas glaceadas
Descasque as cebolinhas e coloque-as numa panela com a manteiga, o açúcar e a água.
Cozinhe-as com a panela tampada.
Quando secar a água, destampe a panela e vá mexendo cuidadosamente, até as cebolinhas caramelizarem.
Finalização
Coloque duas colheres (sopa) de óleo em uma frigideira. Aqueça bem e frite a carne de cordeiro (já temperada com sal e pimenta) por dez minutos.
Retire e corte-a em pedaços.
Desenforme a mousse nos pratos, distribua os pedaços de cordeiro e as cebolinhas.
Regue com o molho e sirva.
Rendimento: 4 porções.
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