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Consultor revela o segredo das empresas centenárias na era das startups

Foto: Alexandre Mazzo (Foto: )

Com boa parte da sua carreira construída na área corporativa, Allan Costa largou tudo para empreender aos 41 anos. Na bagagem, levou muita experiência e conhecimento acumulado em instituições como o Sebrae, por exemplo. Em pouco mais de cinco anos, acrescentou novas funções ao seu currículo: empresário, palestrante, consultor de negócios, conselheiro de administração, investidor anjo e mentor de startups.

Em 2010, Allan conseguiu uma vaga no Advanced Management Program (AMP), o curso mais sênior da universidade e um dos mais conceituados do mundo. Sete anos depois, transformou aquela experiência em um livro: “60 dias em Harvard”. Em entrevista à Gazeta do Povo, Allan, hoje presidente da Celepar, fala como empresas centenárias estão se reinventando na era das startups, marcada por tecnologia, inovação e mudanças em tempo recorde. Um dos segredos do sucesso, segundo ele,  “não está em dispensar os mais experientes e ficar com os mais jovens. Está em misturar”.

Gestão é igual desde sempre e do mesmo jeito para uma empresa?

Sim e não. Sim, quando se pensa em gestão de empresas estamos falando em gestão de pessoas. São as pessoas que fazem uma organização. O que tem mudado ao longo dos anos é a forma como compreendemos os fenômenos que são capazes de engajar e motivar as pessoas a construir grandes empresas. Desse ponto de vista, o ser humano que existia em 1900 é o que existe nos anos 2000.

E não, porque estamos em um mercado completamente diferente daquele que existia há tempos atrás e a velocidade com que esse mercado muda e a forma como as empresas se estruturam para atendê-lo são cada vez mais rápidos,  em função de tecnologias que estão surgindo. As tecnologias exponenciais mudam a forma como fazemos a gestão. Então, se algum tempo atrás o mais sofisticado que poderíamos fazer em termos de gestão era, por exemplo, ter ferramentas capazes de analisar o passado para nos ajudar a prever o futuro, hoje temos ferramentas que, por si só, fazem análise preditiva para entender as possibilidades do futuro, nos subsidiando de informações para tomada de decisão.

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Pessoas mudam ao longo dos tempos. Qual o desafio de um gestor ao trabalhar, hoje, com pessoas?

O grande desafio do gestor, hoje, é dar às pessoas uma razão para que elas se engajem no projeto, na empresa, na construção do que está sendo proposto. As ferramentas para essa tarefa são diferentes. Até meados da década de 1980, início dos anos 1990, as organizações davam um peso muito grande para a remuneração. Para motivar as pessoas e recompensar os talentos, a remuneração era o mais importante. Hoje temos muita clareza de que só isso não basta. O que move uma pessoa? Propósito! Os estudiosos do comportamento humano são unânimes em afirmar que o ser humano precisa de algo maior que si mesmo para se conectar. Que é preciso fazer a diferença, de uma forma mais profunda do que só acordar de manhã e passar o dia “trocando tempo por dinheiro”. Os que fazem dessa forma são os insatisfeitos, os que cumprem tabela, que não encontram motivação para serem melhores, fazerem mais.

Por isso, o grande desafio do gestor é dar as pessoas uma razão para que elas se levantem da cama e digam “por isso vale à pena mobilizar o meu melhor”. Caminhar na realização do seu próprio propósito. Por isso as grandes empresas, como Google e Apple, têm o que se chama de propósito massivo transformador. Porque não se trata de um propósito qualquer. No Google as pessoas vão para organizar as informações no mundo. Na Tesla, as pessoas não fabricam carros elétricos, elas ajudam a transformar a mobilidade, a forma como as pessoas se movem no mundo, com soluções conectadas à sustentabilidade, ao cuidar do planeta.

Empresas centenárias estão na 2.ª, 3.ª e até 4.ª geração. Como essa geração atual que está à frente do negócio trabalha o propósito definido na fundação. O propósito muda?

É provável que mude, porque o ambiente à volta mudou e o propósito não pode ser algo gasoso, precisa ser prático. Em empresas familiares o que se via frequentemente é que não havia a preocupação dos fundadores com as questões sucessórias. Muito falharam nas adequações ao longo do tempo, pois não pensaram que a empresa não era para eles, porque não tinham as ferramentas para tornar perene essa empresa. Cria-se, então, a lenda do avô rico, filho nobre, neto pobre. Eram ricos em empresas com dificuldades. As famílias que conseguiram fazer a sucessão entenderam que o propósito dos fundadores continuaria nos propósitos de quem assumisse o negócio. O propósito inicial mudou, por avanço do tempo, mas a essência continua desde o tempo da fundação. A conexão dos sucessores à essência maior do porque aquela empresa foi criada faz toda a diferença.

FOTO: Alexandre Mazzo

É um desafio para as empresas fazerem gestão com diferentes gerações atuando juntas?

É um baita desafio e as empresas estão falhando em perceber o que parece ser o segredo para superar esse desafio. Hoje vivemos o mundo das startups. Há uma tendência de mostrá-las como empresas fundadas por jovens. Isso não é uma verdade. A idade média de um fundador de uma startup que dá muito certo está na casa alta dos 30 anos e na casa baixa dos 40 anos, algo entre  35 a 45 anos. O que desfaz o mito de que o fundador deste negócio de sucesso está na casa dos 20 anos. Há pontos fora da curva, como o Facebook e outras poucas.

O grande segredo é a mistura dos profissionais que têm tempo de estrada, que caíram e tropeçaram, que tem experiência e a única forma de obtê-la é por meio da vivência –  com a energia dos jovens. A geração dos millenials nasceu nesse mundo digital. É muito difícil para quem está na casa dos 40 anos ter a mesma fluência que eles, em termos de inovação tecnológica. Só que o segredo não está em dispensar os mais experientes e ficar com os mais jovens. Está em misturar.

Como o gestor faz essa mistura?

Tendo a capacidade de discernimento para poder perceber o que cada uma dessas gerações tem de melhor a oferecer. É preciso uma abertura para isso.  É preciso não se deixar seduzir pelas modinhas. Isso é muito importante, principalmente em tempos de mídias sociais, que é algo extremamente sedutor. Muitas vezes as pessoas acham que para estar na crista da onda precisam aderir à modinha. É o que dá clique, dá repercussão, dá audiência. O gestor que se preocupa com o negócio, antes de pensar em si, não sucumbe à moda. Vimos isso na década de 1980, com a reengenharia. A reengenharia era moda. Destruir tudo que se tinha feito e começar do zero. Várias empresas centenárias quebraram fazendo reengenharia. O próprio criador da reengenharia mostrou que estava errado.  O papel do gestor é dar às pessoas que trabalham com ele condições de fazer seu melhor.

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Pessoas, modismo, percepção, propósito. Como a tecnologia influencia todas as essas questões? Tecnologia não é moda, mas há muito modismo na tecnologia.

Com certeza. Ela entra como catalizadora de processos de transformação. Porém, a tecnologia por si só não cria nada. Novamente quem cria são as pessoas que usam a tecnologia. Precisamos entender a tecnologia, porque ela vem e modifica o comportamento do consumidor. Por exemplo, no uso do smartphone. A transformação causada por ele é muito mais profunda do que conseguimos enxergar. O menos relevante do uso do smartphone é o phone. A mais importante é o smart. Isso potencializa o uso da mídia social, por exemplo. Modifica a forma como as pessoas consomem conteúdo e geram conhecimento, como se comportam no trânsito, como se locomovem usando aplicativos, como consome entretenimento. É preciso entender como o consumidor muda seu comportamento para podermos criar valor e oferecer o que ele precisa. É preciso entender o impacto que a tecnologia promove no comportamento do consumidor e, também, que facilidades a tecnologia nos traz para que possamos entregar o valor que o consumidor deseja. Então, acontecem as transformações no modelo de negócio das empresas. É preciso usar a tecnologia para o novo negócio da empresa, para que ela continue a ser relevante, entregando valor ao consumidor.

É um binômio: de um lado, a empresa precisa entender as alterações que a tecnologia provoca nos valores e no comportamento do consumidor e, do outro, como usa essa mesma tecnologia para criar o valor que o consumidor espera.

Startup não é modismo. Como uma empresa de 100 anos, que não é uma startup, participa desse processo?

Se transformando em uma startup de 100 anos. Isso pressupõe ter a lucidez de entender que os modelos de negócios precisam ser revistos o tempo todo. A gente está falando da mentalidade de quem está à frente da organização. É preciso enxergar como o modelo de negócio precisa ser alterado e, assim, perceber aonde está o valor para criar um propósito e colocar todo mundo na direção da mudança.

Como faz mudança em escala, numa empresa com mais de mil funcionários? Além de conectar com o propósito, dá senso de urgência a essas pessoas – elas precisam perceber benefícios próprios na mudança. É preciso mostrar que aquele negócio da forma como está pode acabar, para que as pessoas saiam da inércia, da zona de conforto e tomem para si a tarefa de ajudar a fazer com que o negócio não desapareça, se aquilo for realmente importante para elas. Assim, se começa a mobilizar as pessoas na pegada da startup, que é  velocidade, teste de hipóteses, ir ao mercado, conversar com o cliente para entender o que ele precisa. É complexo, mas é apaixonante.

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