Ouça este conteúdo
No início de dezembro, os menos de 10 mil habitantes do pequeno município de São Jorge D’Oeste ouviram pela primeira vez os maquinários trabalhando na construção daquela que será a maior fábrica de queijos do Brasil. Obviamente, a escolha da cidade para receber a nova indústria da Piracanjuba, principal marca do grupo goiano Laticínios Bela Vista, não foi à toa. Maior bacia leiteira do Paraná e uma das principais do país, o Sudoeste do estado vem se firmando também como a região dos laticínios - indústrias que agregam valor ao produto e transformam a economia local.
WhatsApp: receba notícias do Paraná no seu celular
A planta da empresa goiana, prevista para ficar pronta em dois anos, fortalece um ecossistema regional capaz de produzir 1 bilhão de litros de leite por ano (cerca de 9% do volume nacional), a maior parte disso por pequenos produtores. Tal abundância tem atraído mais indústrias para a região. Em 2010, eram nove; em 2020, passaram para 11, segundo dados da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep). No Paraná todo, são 68.
Essas indústrias transformam o leite em produtos como manteiga, leite condensado e, principalmente, queijo (que responde por cerca de 50% da produção). E, claro: geram empregos. Ainda de acordo com dados da Fiep, os laticínios empregavam 148 pessoas diretamente há 11 anos. Pelos dados de 2020, são mais de 300. A nova fábrica na região deve elevar esse número para cerca de 550 postos de trabalho.
Mesmo produzindo há relativamente pouco tempo, cerca de quatro décadas, os números de ordenha colocam o Sudoeste paranaense à frente dos Campos Gerais, outra região leiteira importante (e mais antiga) do estado. Na industrialização, o Sudoeste está chegando ao mesmo patamar.
“O Sudoeste do Paraná tem o clima e um relevo muito propício para o leite. Para nós, também é muito importante a questão da água, já que uma indústria de alimentos não funciona sem esse recurso. Devido ao potencial da região, ela foi a melhor opção para a construção da nova fábrica de queijos. O local está sendo planejado de acordo com os critérios ambientais, de respeito ao meio ambiente e com tecnologia compatível para a produção sustentável”, disse em comunicado o superintendente da Piracanjuba, Cesar Helou.
Ronei Volpi, presidente da comissão técnica de pecuária de leite da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep), liga o crescimento industrial local à grande produção leiteira e ao perfil dos atuais laticínios na região. "A região dos Campos Gerais já está abastecida por duas grandes indústrias: a Frísia e a Castrolanda. Tem uma pequena indústria em Witmarsum. Tem também uma grande indústria, em Ipiranga, da Tirol. Se eles [as novas indústrias, como a Piracanjuba] se metem nos Campos Gerais, a concorrência é muito maior. Em termos logísticos, claro que seria melhor a região dos Campos Gerais, pela distância do Porto e do mercado consumidor [principalmente São Paulo], mas a disputa pelo leite seria também muito maior", avalia.
Com isso, o Sudoeste tem se beneficiado e atraído os investimentos. "A industrialização cresceu muito [nos últimos anos]. Tem novas unidades como a da Confepar, em Pato Branco, da Laticínios HE em Coronel Vivida. A indústria está chegando lá como uma frente para esse volume todo [produzido]. O que é ótimo para nós. Quanto mais indústrias, é mais gente consumindo nosso produto. Vamos a longo prazo ter um valor agregado maior", diz Volpi.
Fortalecer a industrialização das regiões na produção leiteira é para Evanio Felippe, economista da Fiep, importante para o estado. "A indústria paranaense do leite tem uma importância no cenário nacional. No Brasil, estamos em segundo lugar em número de estabelecimentos industriais no Brasil [atrás de Minas Gerais e empatados com São Paulo] e em terceiro em geração de empregos [atrás de Minas e São Paulo]. Para a economia paranaense esse setor também tem uma importância muito grande. É uma atividade que depende, por exemplo, da pecuária. Então ela move uma cadeia muito grande, levando a geração de emprego, renda, o aumento das riquezas geradas no Paraná", define.
Números da Fiep apontam que, em 2019, dado mais recente, os laticínios representaram 9,2% do PIB da indústria de alimentos do Paraná, que é uma das mais fortes das Américas. Se levar em conta toda a indústria (incluindo o setor automotivo, por exemplo), o percentual é de 2,9%.
VEJA TAMBÉM:
Produção de leite lida com custos altos de insumos
Apesar da caminhada de crescimento, a produção de leite tem sofrido com o custo alto nos últimos dois anos. A competição com o mercado externo para comprar soja, alimento básico na ração dos bovinos de leite, elevou os preços no campo, fazendo muitos produtores abandonarem o segmento e muitos outros operarem no vermelho.
"É uma série de pontos históricos e da conjuntura desse momento. Alguns insumos encareceram muito. Como a soja. Estão vendendo três vezes mais caro em relação ao preço que tinha há dois ou três anos. Os custos ficaram altos. O produtor está trabalhando quase na faixa do vermelho. E com um agravante: o mercado externo para o leite é muito pequeno. E na balança comercial somos mais importadores que exportadores", defende Volpi.
Ainda assim, ele aposta suas fichas na industrialização e acredita que, em cinco anos, o Paraná estará tratando o leite “como a carne suína” - a proteína é um dos principais produtos de exportação no estado.
Fábrica da Piracanjuba deverá começar a operar em dois anos
Em São Jorge D'Oeste, a Piracanjuba espera começar a produzir no nova fábrica, em sua primeira etapa, no começo de 2024. A indústria, com capacidade de processar 1,3 milhão de litros de leite por dia, começará produzindo queijo mussarela e manteiga e, posteriormente, terá um espaço para secagem de soro e uma fábrica de leite longa vida (UHT). A planta criará 250 novos empregos no município, que hoje dependente da atividade agrícola.