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Meu amigo Gabriel perguntou-me:
— Briguet, qual é o limite do perdão para um católico?
Fui breve na resposta:
— O limite do perdão é o próprio perdão.
Vocês, meus sete leitores, decerto conhecem a passagem do Evangelho de São Mateus em que Pedro pergunta a Jesus quantas vezes devemos perdoar o irmão que peca contra nós.
— Até sete vezes? — sugere o apóstolo.
A resposta do Filho de Deus é desconcertante:
— Não te digo até sete, mas até setenta vezes sete.
Logo em seguida, Jesus coloca o tema do perdão em outra perspectiva, contando a parábola do rei que decidiu acertar as contas com seus servos (Mt 18, 23-31). Um deles lhe devia a exorbitante quantia de dez mil talentos — o que equivaleria a cerca de 164 toneladas de ouro!
Como o servo não tinha condições de pagar a dívida, o rei decidiu vendê-lo com a mulher, os filhos e todos os seus bens. Diante disso, o servo entrou em desespero e suplicou que o rei o perdoasse. Compadecendo-se do homem, o rei então resolveu soltá-lo e perdoou-lhe a dívida.
Logo depois, ao sair dali, o homem encontrou um de seus companheiros de servidão, que lhe devia cem denários — aproximadamente 30 gramas de ouro. Irado, o homem agarrou o devedor pelo pescoço e começou a sufocá-lo. Indiferente às súplicas do colega, o servo enviou-lhe para a prisão até que pagasse a dívida.
Quando soube do comportamento do servo a quem havia perdoado, o rei ficou furioso, mandou prendê-lo e disse:
— Servo mau, eu te perdoei toda a tua dívida, porque me rogaste. Não devias, também tu, ter compaixão do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?
Essa belíssima passagem bíblica mostra a verdadeira dimensão do perdão na vida do homem. Jesus perdoa assassinos, ladrões, adúlteros, violentos e prostitutas — ele só não perdoa quem não perdoa.
Nos últimos anos, o Brasil viveu uma inversão completa da realidade. Estamos sendo governados por uma casta incapaz de reconhecer os próprios erros e pecados gigantescos — que podem ser representados pelos dez mil talentos da parábola.
O servo ingrato foi arrancado da prisão para assumir o trono e se vingar dos que o lançaram no cárcere. Com uma diferença importante: na parábola, o servo ingrato reconheceu a própria dívida; no Brasil, isso jamais aconteceu
Quando os servos ingratos chegam ao poder, eles inevitavelmente se tornam tirânicos. No entanto, mesmo sob a tirania, continua a existir no coração humano aquilo que Jesus denomina, no Sermão da Montanha, de “fome e sede de justiça”.
Ocorre que, se o governante é incapaz de perdoar, ele também é incapaz de julgar retamente. Para saciar a fome e a sede de justiça inerentes à condição humana, o sistema tirânico irá então promover a punição dos inocentes.
Todo servo ingrato precisa de um bode expiatório para sacrificar aos seus deuses: ainda que a dívida em questão seja irrisória ou inexistente, como é o caso dos presos políticos brasileiros. Os destruidores do país querem a ruína dos devedores de um vintém.
A cada Natal, nós comemoramos o fato de que um só inocente — Jesus Cristo — encerrou de uma vez por todas o ciclo perpétuo de crime e castigo da humanidade. Em Cristo, o cordeiro imolado, nós temos o perdão universal e a lei estruturante do próprio universo.
Essa é uma notícia maravilhosa, a melhor notícia que poderíamos ouvir em qualquer tempo e qualquer espaço. Mas esse benefício — que é a salvação da alma — só vai ser concedido àqueles que souberem perdoar. Para os incapazes de misericórdia, só haverá justiça, e a mais dura das justiças.
Comecei com meu amigo Gabriel, agora encerro com as suas palavras:
— Estamos testemunhando um riquíssimo momento histórico que confirmará a teoria da curvatura do ramo. Os que tiveram a chance de pacificar o país — anistiando os presos, condenados e exilados — e não o fizeram, quando o ramo vergado se soltar, verão a justiça sendo feita irremediavelmente e do pior modo possível.
(PS: Gabriel, continuo rezando por sua conversão.)
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