Fumaça sobe após um ataque aéreo israelense que teve como alvo uma vila libanesa, visto da Alta Galileia, norte de Israel, 23 de setembro de 2024.| Foto: Atef Safadi/EFE/EPA
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A semana passada foi intensa e marcou uma nova fase - ainda mais violenta - do conflito entre as forças israelenses e a milícia Hezbollah, no Líbano. Uma sequência impressionante e surpreendente de eventos escalou o conflito, deixando o Oriente Médio e o mundo na expectativa de que uma guerra generalizada pudesse se iniciar naquela região a qualquer momento.

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Na terça-feira, 17 de setembro, milhares de pagers usados pelos militantes do Hezbollah explodiram quase simultaneamente, causando mais de dois mil feridos, muitos em estado grave, e cerca de uma dezena de mortos.

O ataque, inesperado e coordenado, desestabilizou a milícia, prejudicando suas comunicações internas e gerando um clima de insegurança. No dia seguinte, 18 de setembro, centenas de rádios portáteis do tipo “walkie-talkies”, usados para comunicações de curto alcance, também explodiram, resultando em mais dezenas de mortos e centenas de feridos. Esse novo ataque aumentou ainda mais o caos e o pânico, afetando tanto o grupo quanto a população civil.

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O dia 19 de setembro foi marcado por uma intensificação dos bombardeios israelenses sobre alvos no sul do Líbano. As forças de segurança de Israel alegam ter atacado, somente neste dia, 30 diferentes locais de lançamentos de foguetes, destruindo cerca de 150 unidades lançadoras.

No dia 20, sexta-feira, as forças israelenses desferiram o mais importante ataque contra o alto-comando do Hezbollah. Um prédio no sul de Beirute foi alvejado por um míssil, causando a morte de vários líderes militares do grupo que estavam lá reunidos. 

Ibrahim Aqil, chefe de operações do Hezbollah e comandante da chamada Força Radwan, foi um dos mortos. Ele era procurado há décadas pela acusação de ter planejado o atentado a bomba contra a embaixada dos EUA em Beirute, em 1983, que matou 63 pessoas, bem como o atentado do Hezbollah ao quartel da Marinha norte-americana em Beirute, que matou mais 241 funcionários dos EUA no final daquele ano. O Departamento de Estado dos EUA, inclusive, oferecia uma recompensa de 7 milhões de dólares por informações que levassem à sua prisão.

Sábado, dia 21, Israel manteve a intensidade dos bombardeios, alvejando mais de 180 objetivos no sul do Líbano. Ontem, domingo, dia 22, foi a vez do Hezbollah intensificar sua campanha, lançando cerca de 200 mísseis, foguetes e drones contra Israel.

A escalada israelense tem um objetivo claro: tentar obrigar o Hezbollah a um recuo para o Norte, especificamente para além do rio Litani

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Este é o curso d’água escolhido pela ONU, em 2006, para delimitar uma espécie de zona tampão no sul do Líbano, onde o Hezbollah não poderia manter seu arsenal. Como se sabe, apesar da presença de uma força da ONU na região, a UNIFIL, essa decisão nunca foi implementada na prática, com a milícia mantendo centenas de posições de lançamento de mísseis e foguetes naquela área. 

Um eventual recuo do Hezbollah poderia garantir o retorno dos mais de 60 mil israelenses que abandonaram suas casas no norte de Israel, zona diretamente impactada pelos lançamentos quase diários de foguetes do Hezbollah contra o norte de Israel. 

As ações militares israelenses, ao eliminar importantes lideranças do Hezbollah, tiveram também o objetivo de retirar a capacidade de comando e controle da milícia, obrigando o grupo a uma reorganização que o deixasse inativo por algum tempo. 

Dessa forma, é inegável que o Hezbollah sofreu um duro golpe. Mas, a reação de ontem indica que o grupo não parece disposto a recuar. Essa postura poderá levar os israelenses a decidirem por uma invasão terrestre ao Sul do Líbano, uma opção que representaria uma grande escalada.

Nesse caso, todas as atenções se voltarão para o Irã. A potência xiita é reconhecidamente a líder do “Eixo da resistência”, composto também pelo Hezbollah, além do Hamas, dos Houthis e das milícias xiitas que atuam na Síria e no Iraque.

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Os iranianos juraram vingança contra Israel desde a morte de Ismail Haniyeh, líder do Hamas, em Teerã, no último dia 30 de julho, mas até agora não tomaram nenhuma medida que pudesse levar a um conflito aberto contra Israel.

O Irã tenta evitar uma escalada do conflito, que lhe pode ser muito desfavorável em um momento de crise econômica e crescente contestação à liderança teocrática de Ali Khamenei. Entretanto, os recorrentes desafios impostos por Israel, ao ultrapassar sucessivas “linhas vermelhas”, empurram suas lideranças contra a parede. Não responder pode significar um forte abalo na sua liderança sobre os grupos xiitas da região.

Os EUA, por sua vez, também se esforçam, há meses, para desescalar o conflito. A última coisa que o presidente Joe Biden deseja é ver os EUA envolvidos em uma guerra no Oriente Médio na reta final da campanha eleitoral.

Entretanto, as repetidas frustrações nas tentativas de se chegar a uma trégua humanitária entre o Hamas e Israel mostram que sua influência sobre as decisões de Israel tem limites. Apesar de tudo isso, é certo que em caso de envolvimento do Irã no conflito, os EUA irão lutar ao lado de Israel, no mínimo empregando seus meios antiaéreos disponíveis na região para interceptar os mísseis iranianos.

O futuro do conflito entre Israel e Hezbollah permanece incerto. O aumento das hostilidades e a ameaça de uma invasão terrestre indicam que a região pode estar à beira de um conflito mais amplo, envolvendo não apenas Israel e o Hezbollah, mas também seus principais aliados e patrocinadores, como o Irã. Os Estados Unidos, enfrentam o desafio de equilibrar seu apoio a Israel com a necessidade urgente de impedir uma guerra de maiores proporções.

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A escalada, que ultrapassou vários limites, coloca o Oriente Médio em um momento crítico, onde as próximas decisões serão determinantes para a paz, ou para a guerra.