
O Fórum Econômico Mundial divulgou, no último dia 15 de janeiro, a 20ª edição do seu Relatório de Riscos Globais. O documento reflete as respostas de mais de 900 especialistas de diferentes setores – governos, academia, instituições de pesquisa e empresas – sobre as principais ameaças ao mundo a curto e médio prazo. Embora não possam prever o futuro, esses especialistas oferecem uma avaliação informada dos desafios que enfrentaremos em um mundo onde eventos inesperados ocorrem em ritmo cada vez mais acelerado.
A principal ameaça identificada para 2025 foi a eclosão de novos conflitos armados entre Estados, citada por 23% dos entrevistados. No relatório de 2024, esse risco ocupava apenas a 8ª posição, mas a escalada dos conflitos na Ucrânia, no Oriente Médio e no Sudão fez com que ele subisse para o topo da lista. A tendência reflete a deterioração da estabilidade global e o fracasso de instituições multilaterais em conter disputas interestatais.
A previsão já se concretizou antes mesmo do fim do primeiro mês de 2025: o avanço do grupo guerrilheiro M23 sobre a cidade de Goma, na República Democrática do Congo, amplificou ainda mais as tensões na já instável África Central.
O segundo risco mais citado foi o dos fenômenos climáticos extremos, apontado por 14% dos entrevistados. Em 2024, o mundo sofreu uma sucessão de desastres naturais: ondas de calor intensas na Ásia, inundações no Brasil, Indonésia e Europa, incêndios florestais no Canadá e furacões devastadores nos Estados Unidos. O relatório destaca que esses eventos são cada vez mais frequentes e severos, impulsionados pelas mudanças climáticas.
Esse risco também já foi tristemente confirmado em 2025 com os incêndios florestais que devastaram partes da Califórnia, nos EUA, causando dezenas de mortes.
Na terceira posição aparece a confrontação geoeconômica, mencionada por 8% dos especialistas. Essa ameaça reflete o aumento das tensões geopolíticas, que se manifestam em sanções comerciais, embargos, tarifas e restrições a investimentos por razões políticas.
A tendência de politização do comércio já era crescente em 2024 e ganhou ainda mais força com a volta de Donald Trump à presidência dos EUA.
Já nas primeiras semanas, o novo governo deixou absolutamente claro que utilizará a ameaça de imposição de tarifas a outros países como uma ferramenta de pressão e coerção constantes na condução de sua política externa.
O quarto grande risco apontado pelos entrevistados é a desinformação, seja por meio da disseminação intencional de informações falsas (disinformation) ou da circulação inadvertida de conteúdos enganosos (misinformation).
A explosão do volume de informações na internet, aliada aos avanços da Inteligência Artificial Generativa, está tornando cada vez mais difícil distinguir imagens, vídeos, textos e áudios reais de conteúdos manipulados. Esse fenômeno amplia as dificuldades de governança e cria um ambiente ideal para a manipulação da opinião pública.
A polarização social, listada na quinta posição, está intimamente conectada à desinformação. O relatório destaca que os conflitos políticos estão se tornando cada vez mais intransponíveis, levando à ruptura de consensos mínimos para a construção de soluções coletivas.
Em um mundo onde adversários políticos se tornam inimigos irreconciliáveis, as tensões internas crescem, afetando a estabilidade tanto no nível doméstico quanto internacional
Além desses cinco riscos mais citados, o relatório ainda lista outras ameaças significativas, como desaceleração econômica, mudanças críticas no sistema do planeta Terra, como o aumento do nível do mar devido ao colapso das camadas de gelo, desemprego, migrações forçadas, escassez de recursos naturais, impactos negativos da inteligência artificial e aumento da criminalidade cibernética.
Embora tenham sido menos mencionados pelos entrevistados, esses fatores contribuem para a crescente complexidade do cenário global.
O que se destaca no relatório de 2025 é o avanço dos riscos geopolíticos e interestatais, em um ambiente já fragilizado pelas mudanças climáticas e pela polarização política e social.
Esse cenário favorece a ascensão de soluções isolacionistas, em que cada país prioriza exclusivamente seus interesses. É a política do “se a farinha é pouca, meu pirão primeiro”.
Durante a pandemia de COVID-19, por exemplo, vimos como nações desenvolvidas garantiram a terceira dose da vacina enquanto países pobres ainda não tinham acesso à primeira.
Agora, o protecionismo econômico se intensifica, com os Estados Unidos adotando uma postura cada vez mais unilateralista, coagindo aliados a adotar políticas que beneficiam exclusivamente seus interesses.
É provável que o exemplo americano seja seguido em 2025, e que passemos a ver outros países adotando posturas cada vez mais isolacionistas. Em um mundo onde os problemas são globais, as soluções deveriam ser construídas por meio de cooperação multilateral.
No entanto, o relatório do Fórum Econômico Mundial não sugere que esse caminho esteja sendo trilhado. Pelo contrário: a tendência dominante aponta para um cenário de fragmentação global e competição intensa entre grandes e médias potências.
Para os próximos anos, a dúvida que paira sobre o mundo é se ainda existe espaço para um esforço conjunto em busca da estabilidade – ou se, em vez disso, veremos o avanço de um novo período de desordem global.
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS