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Paulo Uebel

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Aposentadoria como pena é atestado de “bananidade” brasileiro

A lei que rege o Judiciário traz a previsão expressa de "penalidade disciplinar" de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. (Foto: Unsplash)

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O termo "república de bananas" foi idealizado em 1904 pelo escritor americano William Sydney Porter, conhecido como O. Henry, no conto O Almirante. A história se passa na Anchuria, país fictício descrito como “uma pequena república de bananas”. Como Porter morava em Honduras quando escreveu a história, e as bananas representavam um percentual expressivo das exportações hondurenhas, é provável que o país o tenha inspirado.

Entretanto, com o tempo, o termo foi ampliado para designar “países marcados pela monocultura e dotados de instituições governamentais fracas e corruptas”, explica a BBC. Nada que se assemelhe à história do Brasil (contém ironia).

Se fosse possível definir um único critério para outorgar uma certidão de "bananidade" para um país, que demonstrasse a fraqueza de suas instituições e a corrupção dos valores de uma sociedade, dificilmente haveria um exemplo melhor do que a "aposentadoria compulsória como modalidade de punição". O termo rebuscado serve para reduzir o choque e a repulsa da sociedade, e até dar um toque civilizado, mas a prática é verdadeiramente absurda para quaisquer padrões civilizacionais.

A aposentadoria compulsória como “punição” significa que um membro do Poder Judiciário, como um juiz ou um desembargador, pode ser aposentado com todos os seus vencimentos, proporcionais ao tempo de serviço, garantidos até o fim da vida como punição (ou prêmio) por ter realizado um crime comum ou infração disciplinar grave. É exatamente isso: premiar alguém por uma conduta errada! A regalia “condena” o infrator a receber sem trabalhar.

No Brasil, infelizmente, essa "penalidade" é aplicada com frequência constrangedora. No mês passado, o país foi surpreendido pelo caso de uma juíza do Mato Grosso julgada por sua nula produtividade: ela foi “condenada” à aposentadoria, para receber proporcionalmente ao que ganhava enquanto ocupava seu cargo de magistrada, e assim teve sua prática de não trabalhar legalizada. Como é possível que um caso de alguém que não trabalha seja “resolvido” dando uma remuneração generosa para a pessoa não trabalhar nunca mais!? Parece mentira, mas é a realidade no Brasil.

Vários outros magistrados que cometeram crimes também foram agraciados com essa “penalidade”. Uma desembargadora do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, por meio de seu poder de influência, tirou da penitenciária o seu filho preso por tráfico de drogas. Quando descoberta, também foi “punida” com a aposentadoria compulsória. Já um juiz do Tribunal de Justiça de Goiás participou de um esquema criminoso e desviou R$ 18 milhões com decisões fraudulentas, e recebeu também a aposentadoria compulsória como "punição". Nesta prática, digna de uma república de bananas, o crime é compensado pelo próprio Estado, que se utiliza do dinheiro dos pagadores de impostos para isso.

O que mais espanta é que é algo legal, mesmo sendo imoral: a Lei Orgânica da Magistratura Nacional – a Loman, Lei Complementar 35/1979, que rege o Poder Judiciário e que deveria ser exemplo de independência, autonomia, seriedade e respeito ao interesse público e aos princípios da administração pública, como moralidade, eficiência e impessoalidade – traz a previsão expressa de "penalidade disciplinar" de aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço. Todos os juízes, desembargadores e ministros das cortes superiores que eu conheço, sérios, preparados e conscientes do seu fundamental papel, reconhecem que esse dispositivo é atrasado e vergonhoso para o Poder Judiciário e para todos cidadãos de bem.

Até hoje, com toda a discussão sobre valores, princípios e a defesa da democracia e das instituições republicanas, a reforma administrativa não foi aprovada e nem uma ação direta de inconstitucionalidade foi julgada procedente no sentido de acabar com essa perversa, esdrúxula e revoltante prática. A reforma administrativa, apresentada pelo governo federal e parada no Congresso Nacional, garante o fim deste e de outros privilégios.

Uma alternativa mais rápida seria se o conselho federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), algum partido político com representação no Congresso Nacional, a mesa da Câmara de Deputados ou do Senado Federal, o procurador-geral da República ou mesmo o presidente da República, decidido a corrigir essa injustiça, resolvesse ingressar com uma ação direta de inconstitucionalidade para que fosse declarado o fim desse dispositivo, por absoluta incompatibilidade com a nossa Constituição e com valores republicanos.

A ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, cunhou, sabiamente, a expressão "cupinização" institucional. Sem dúvida, a existência da aposentadoria compulsória como modalidade de punição corrói a credibilidade das nossas instituições e enfraquece a confiança dos brasileiros em nossa democracia, além de explorá-los, direcionando preciosos recursos tirados de seus bolsos para arcar com custos de uma regalia inaceitável. Não podemos mais conviver com esse atestado de "bananidade"! Vamos torcer para que alguém com legitimidade para agir possa dar fim a esse grande cupim.

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