A notícia de que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem interesse numa moeda comum com a nossa vizinha Argentina correu a internet e assustou muitos brasileiros. Seria imprudente trocar o nosso Real por uma moeda única com o país que sofre com uma inflação de 94%, por total falta de uma governança fiscal e monetária crível. Pelo menos, desta vez, o assunto é menos pior do que parece. Não se trata de uma moeda para substituir as moedas nacionais do Brasil e da Argentina como o Euro fez na Europa. Na verdade, seria apenas uma moeda contábil para substituir o Dólar nas transações entre os dois países. Mas será que é uma boa ideia?
A ideia não é nova, e, por incrível que pareça, não foi defendida apenas pela esquerda. Mas, por que ela voltou ao debate público? As transações comerciais entre os países são feitas em Dólar. Mas a Argentina não possui dólares para comprar do Brasil. “Os bancos brasileiros, por sua vez, não dão crédito ao comércio bilateral temendo o risco cambial”, explica o jornalista Geraldo Samor no Brazil Journal. Com o Dólar em falta, a Argentina passou a importar menos produtos brasileiros. A China, por exemplo, já tem uma estratégia para conseguir comercializar com os hermanos: financia as empresas argentinas interessadas em seus produtos, “e o BC chinês criou uma linha de swap cambial com o BC argentino para garantir a conversibilidade do peso para o renminbi”, continua Samor.
O Brasil tem muitos problemas para se preocupar e não deve perder tempo e recursos em mais um sonho megalomaníaco dos petistas subsidiando a economia argentina.
A moeda comum, então, seria uma “unidade de conta comum”, como a URV (Unidade Real de Valor), a moeda de transição para a implementação do Real. Mas há riscos cambiais de cada país na liquidação das operações. “Se abandonamos o Dólar como moeda de transação internacional, então como se formaria o câmbio de referência? Se há um novo câmbio com outra moeda contábil, o valor pode divergir da taxa do dia com o Dólar, o que significa que um dos dois países terá prejuízo, enquanto o outro terá vantagem. Quem faria o ajuste, nesse caso?” questiona Márcio Salvato, professor e coordenador do IBMEC, em entrevista para o Instituto Millenium na revista Exame.
Em suma, o Brasil poderia ter prejuízos nas comercializações. O especialista do Instituto Millenium e analista de crédito no mercado financeiro, André Bolini, vai além, e conclui que o resultado poderia ser um subsídio cruzado para a Argentina: “Ainda que de forma disfarçada, portanto, estabelece-se uma cota preferencial de comércio para com a Argentina — implicando, necessariamente, em destruição de valor para os brasileiros. Subsídio cruzado, na prática, em favor da Argentina.”
Uma pena que o Brasil ainda siga usando recursos públicos para favorecer governos populistas que não fazem boa gestão.
Em carta conjunta divulgada antes do encontro com o presidente Lula, Alberto Fernandéz, presidente da Argentina, disse que eles decidiram “avançar nas discussões sobre uma moeda sul-americana comum, que possa ser usada tanto para os fluxos financeiros como comerciais, reduzindo os custos operacionais e nossa vulnerabilidade externa". A moeda se chamaria “Sur” (Sul) e poderia ser usada pelos países membros do Mercosul. Em abril de 2022, o atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, publicou um texto ao lado do economista Gabriel Galípolo na Folha de S. Paulo defendendo a moeda comum para toda a América do Sul.
A ideia seria proteger a soberania dos países sul-americanos frente às sanções impostas pelas grandes potências, especialmente os Estados Unidos, que emite a moeda internacional. Além disso, eles queriam a criação de um Banco Central Sul-Americano para emitir a nova moeda. Será que vale arriscar a autonomia do Banco Central brasileiro e os custos elevados que a política pode gerar? A governança do câmbio das moedas internacionais é hoje uma responsabilidade do Banco Central, e assim deveria continuar sendo.
Além disso, o economista e presidente do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), Marcos Lisboa, questiona em entrevista à revista Oeste: “É uma perda de tempo. Na melhor das hipóteses, nada vai acontecer; na pior, o Brasil vai ceder dólares para a Argentina. Fora isso, nada acontece; quer dizer, vamos lá, você tem um comércio exterior, a Argentina exporta para o Brasil, e o Brasil exporta para a Argentina. Se o Brasil tem déficit, você paga em dólar, e se a Argentina tem déficit ela paga em quê? Nessa moeda comum que ninguém aceita? Para que serve uma moeda comum que ninguém aceita? A Argentina tem um problema de inflação elevada, desequilíbrio nas contas públicas.” Do jeito que os hermanos maquiam dados públicos, essa nova moeda não deveria ser chamada de “Sur”, mas de “Surreal”, como sugeriu o economista Alexandre Schwartsman.
Em ano de eleições presidenciais na Argentina, declarações como esta e como a de que o Brasil irá financiar o gasoduto de Vaca Muerta pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico), parecem mais favores do governo do PT (Partido dos Trabalhadores) para elevar a popularidade do combalido presidente argentino, do que boas políticas públicas realizadas pelo interesse dos brasileiros. Uma pena que o Brasil ainda siga usando recursos públicos para favorecer governos populistas que não fazem boa gestão e não agem de acordo com as melhores práticas de governança.
No fim das contas, a ideia da moeda comum será mais uma política ineficiente do PT. O Brasil não deveria aceitar ou utilizar uma moeda que, como bem disse o economista Marcos Lisboa, ninguém aceita. Haddad quer “soberania” para a América do Sul frente ao Dólar e o “imperialismo americano” à custa da autonomia do Banco Central e do dinheiro dos brasileiros. O Brasil tem muitos problemas para se preocupar e não deve perder tempo e recursos em mais um sonho megalomaníaco dos petistas subsidiando a economia argentina ou qualquer outra economia sul-americana que não quer fazer o dever de casa.
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