As pessoas, na maioria das vezes, atacam a liberdade de expressão usando motivos supostamente virtuosos. No passado, o argumento era censurar para evitar a blasfêmia, que pessoas falassem mal de Deus ou dos deuses pagãos. A defesa da moral e dos bons costumes era superior à liberdade de expressão.
Hoje, os poderosos não costumam atacar a liberdade de expressão para evitar a blasfêmia. Ao menos, não contra Deus. Já quando o assunto são as próprias autoridades, as coisas mudam. Por exemplo, com o pretexto do combate às notícias falsas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes censurou uma matéria da revista Crusoé, “O amigo do amigo de meu pai”, sobre o codinome de um de seus colegas ministros que o empreiteiro Marcelo Odebrecht revelou à Lava Jato. O mesmo ministro, recentemente, baniu o aplicativo de mensagens Telegram do Brasil, se unindo aos exemplos autoritários que já censuraram o aplicativo como China, Cuba, Irã e Rússia.
Nesse caso, a justificativa foi garantir que algumas decisões judiciais fossem atendidas pela plataforma. Porém, será que impedir o acesso de milhões de brasileiros a uma plataforma de comunicação é a forma mais justa e correta para fazer valer uma determinação judicial? Imagine se isso fosse aplicado para a cobrança de impostos, multas ou para impor outras decisões judiciais.
O ministro Alexandre de Moraes, felizmente, revogou a ordem de bloqueio ao Telegram após o aplicativo cumprir suas exigências, mas, se o Estado tiver o poder de banir os mensageiros, amanhã ou depois, você poderá não ter acesso a mensagens que podem ser decisivas para você e para a nossa democracia. O precedente do Telegram foi muito ruim e precisa ser criticado para que o Estado não volte a repeti-lo.
O Estado já dispõe de instrumentos para garantir o cumprimento de decisões judiciais, como a possibilidade de fixar multas, fazer execuções e, inclusive, iniciar ações penais. Agora, banir plataformas de comunicação e redes sociais é um poder desproporcional, excessivo e nada razoável em uma democracia. Além disso, ao banir o Telegram, o STF está punindo não apenas o aplicativo, mas seus milhões de usuários, a liberdade de expressão e, consequentemente, está fragilizando a nossa democracia.
E “ou a liberdade de expressão é absoluta, ou ela não existe”, disse Walter Williams, que foi um dos maiores economistas e pensadores do nosso tempo. Em uma era em que a liberdade de expressão é atacada até mesmo por seus supostos defensores — seja lá de qual espectro político eles façam parte — , mais do que nunca, ela precisa ser defendida. Nenhum interesse pessoal, político ou partidário pode estar acima do direito à informação e da liberdade de expressão.
A liberdade de expressão é a base de uma sociedade livre e próspera. Sem liberdade de expressão, não há democracia plena. Não há, também, liberdade de imprensa, religiosa, política, artística, civil ou de associação. Até mesmo a liberdade econômica é comprometida.
É preciso esclarecer que a liberdade de expressão dá ao outro o direito de dizer aquilo que não gostamos ou não queremos ouvir. Isso inclui a tolerância de ideias polêmicas ou de má fama. Mas, com um porém: o filósofo Karl Popper mostra que não podemos tolerar os intolerantes quando eles passam a responder os argumentos com os punhos ou pistolas, ou seja, com violência.
Se alguém abusar dessa liberdade, usando-a para fazer coação, cometer crimes, realizar chantagens, produzir linchamentos morais ou incitar a violência, deverá arcar com as consequências de seus atos. Assim, nada nem ninguém, nem mesmo o STF, deveria limitar previamente a liberdade de expressão.
Enquanto vários agentes do passado e do presente foram e são inimigos da liberdade de expressão, devemos buscar também os bons exemplos. Um dos aliados da liberdade no Brasil é o Instituto de Estudos Empresariais, que tornou a liberdade de expressão o tema do próximo Fórum da Liberdade — “Você é livre para discordar?” —, que acontecerá entre os dias 11 e 12 de abril, em Porto Alegre. O Fórum da Liberdade reúne especialistas e pensadores há 35 anos para debater temas importantes para o futuro do país.
Em um momento em que o Brasil sofre um dos maiores ataques à liberdade de expressão e de informação, ver um palco ser dedicado para a defesa da liberdade de expressão é um sopro de esperança e lucidez.
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