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Quando a inflação ataca a economia, e prejudica especialmente os mais pobres, a população reclama e os políticos veem a oportunidade de capturar apoio popular com ações para conter o aumento dos preços. Porém, o tabelamento de preços fracassou no mundo todo. Quando os preços são fixados de forma artificial, abaixo do preço de custo, as pessoas param de fabricar, importar ou ofertar os produtos tabelados, e o desabastecimento é a consequência natural. Como aconteceu na Venezuela e está acontecendo na Argentina.
Ao invés de atacar a causa do aumento – gasto público excessivo e impressão de dinheiro para custear esses gastos –, o governo quer atacar a consequência, isto é, a perda do poder de compra da moeda. Não tem risco de dar certo. Controle de preços é um populismo barato cujas consequências são caras.
E qual a diferença entre tabelamento de preços, controle de tarifas e redução de impostos? Pode haver incentivos para segurar investimentos?
No caso das tarifas, que são contrapartidas pagas pelas pessoas e empresas pela utilização de serviços públicos concedidos ou permitidos pelo poder público, não há risco de desabastecimento, já que o serviço público não pode ser descontinuado. Entretanto, existem outros riscos.
Se o governo abaixar ou mesmo segurar indevidamente o valor das tarifas, como aconteceu com a tarifa de energia elétrica durante o governo Dilma, cedo ou tarde, a sociedade terá que pagar essa conta. E a conta é alta. A MP (medida provisória) 579 foi instituída no governo Dilma, em 2012, com o objetivo de baixar 20% do valor das tarifas de energia. O efeito posterior foi o contrário e as consequências desta MP não ficaram restritas à era Dilma, seguem até hoje: ela é uma das principais responsáveis pelo aumento de 100,6% das tarifas de energia entre 2013 a 2021.
Toda vez que o governo faz um processo de concessão ou permissão de serviço público, existe um processo competitivo entre empresas, por meio de uma licitação, para verificar quem oferta a maior redução de tarifa ou o maior valor de outorga (valor a ser pago ao Estado). Para as empresas definirem o valor da proposta, existe um edital que fixa as premissas dos investimentos, custos operacionais, níveis de serviço exigidos e taxa de retorno esperada. O ganhador da licitação assinará um contrato com o poder público com direitos e deveres baseados nessas premissas.
Portanto, ao segurar aumentos de tarifas que são previstos em contrato ou que são necessários para manter o equilíbrio econômico-financeiro de um serviço público delegado ou permitido pelo poder público, o governo estará descumprindo o contrato e poderá ser condenado a ressarcir todas as despesas incorridas pela empresa responsável pelo serviço com multa. Ou seja, haverá consequência. Outra consequência natural será o aumento da insegurança jurídica no país, desestimulando novos investimentos ou fazendo com que a taxa de retorno exigida por investidores seja mais elevada.
A redução de impostos, todavia, pode ser um ótimo caminho, mas exige alguns cuidados importantes. Toda vez que o governo reduz impostos sobre um produto ou serviço, uma das três consequências pode ocorrer: aumento de impostos em outros produtos ou serviços, aumento da dívida pública ou necessidade de corte proporcional de gastos públicos.
Reduzir impostos, com a consequente redução de gastos ou do tamanho do Estado, é a melhor alternativa, desde que o Estado foque sua energia em resolver os problemas de forma estrutural. Um caminho é reduzir despesas recorrentes, como gastos operacionais. Todos os ministérios, autarquias, fundações públicas, universidades estatais e institutos federais de educação têm ineficiências operacionais que podem ser enfrentadas sem redução da quantidade e da qualidade dos serviços prestados.
É possível, por exemplo, reduzir níveis hierárquicos, diminuir o número de áreas, reduzir o número de unidades descentralizadas e diminuir o número de prédios e equipamentos públicos que estão subutilizados (e há muitos!). Em uma mesma cidade (e não estou incluindo Brasília) existem diferentes estruturas do governo federal. Por que não centralizar tudo em um único local? Com isso, o governo reduzirá significativamente contratos de segurança, portaria, limpeza e manutenção, sem falar nas despesas com água, luz, internet etc, além de facilitar a vida do cidadão.
O Ministério da Economia já começou a fazer isso, por meio da integração de serviços da pasta com o compartilhamento de imóveis entre órgãos e entidades vinculadas, mas a iniciativa precisa engajar todas as estruturas federais. O mesmo deve ser replicado pelos governos estaduais. Com a transformação digital e a automatização de inúmeras atividades operacionais, o governo pode reduzir drasticamente a reposição de servidores públicos aposentados, usando mais inteligência e menos mão de obra.
Outro exemplo: em vez de discutir a volta do quinquênio (privilégio que aumenta 5% dos salários a cada cinco anos automaticamente, sem nenhuma avaliação de desempenho), que demandará expressivos recursos (pelo menos R$ 7,5 bilhões a mais por ano aos pagadores de imposto), é muito mais produtivo e benéfico para toda a sociedade a discussão sobre a redução de impostos para bens essenciais, com o devido e proporcional corte de despesas. Ninguém sabe melhor o que cada pessoa pode fazer com o seu dinheiro do que ela mesma.
Uma redução geral de impostos, que não beneficia um grupo específico de pessoas ou setor específico da economia, é positiva e não se enquadra como subsídio. Os combustíveis impactam todas pessoas, negócios e instituições. São bens essenciais na vida das pessoas, já que, diariamente, milhões de pessoas e produtos são transportados no país. Assim, é justa, saudável e bem-vinda a discussão sobre o tamanho da carga tributária dos combustíveis e sua eventual redução. O que não pode é essa redução ser custeada com dívida pública e a consequente piora das contas do governo. O aumento da dívida pública aumentará a curva longa de juros, que prejudica todas as pessoas, sem exceção.
A previsão de que a tributação deve observar a seletividade, ou seja, a essencialidade dos produtos e serviços, consta em nossa Constituição Federal há anos, mas, geralmente, foi ignorada pelos entes federados, que sempre querem aumentar a carga tributária.
A redução do peso do Estado significa mais dinheiro no bolso do cidadão. Assim como a inflação, o peso do Estado recai, proporcionalmente, mais sobre os vulneráveis. Além disso, em ano eleitoral, o risco de os governos concederem aumentos de salários e/ou benefícios, fazerem reestruturação de carreiras (muitas em grande parte apenas para aumentar salário e reduzir o tempo necessário para chegar ao topo) ou criar novos penduricalhos para servidores públicos é muito grande, como mostra a história do Brasil desde a redemocratização.
Está na hora de mudar essa história. O governo precisa focar em medidas estruturais que vão beneficiar o maior número de pessoas, sem focar em setores específicos, empresas campeãs ou na criação de novos privilégios. A melhor alternativa é a redução de impostos que beneficie toda população, desde que os governos façam os respectivos cortes de gastos proporcionais. Não há nada melhor para reduzir o custo de vida do cidadão do que diminuir efetivamente o peso do Estado, e, com isso, devolver o poder de decisão – e de compra – para as pessoas.