Paulo Guedes entrou no governo com um plano anunciado a quatro ventos: manter o teto de gastos, evitar qualquer aumento da carga tributária e reformar as estruturas do Estado brasileiro, aumentando assim a produtividade da economia. A cada dia, a concretização desta agenda fica mais difícil.
É interessante observar os levantamentos realizados no Barômetro do Poder, boletim político editado por Marcos Mortari e publicado pelo portal InfoMoney. Os especialistas ouvidos pelo Barômetro são, em sua maioria, consultores que aconselham grandes capitalistas em suas decisões. Ou seja, não se tratam de acadêmicos suscetíveis a arroubos ideológicos e sem “skin in the game”, na expressão de Nassim Taleb para se referir a opiniões que nada custam ao opinador. Todos trabalham com previsões políticas e precisam zelar pela própria reputação junto ao mercado.
Na edição de maio do Barômetro, 70% dos especialistas ouvidos acreditam que a probabilidade de Guedes sair antes de 2022 é alta ou muito alta. Desde março, a porcentagem de analistas que atribuem baixa probabilidade a uma eventual saída de Guedes caiu de 23% para 8%, enquanto aqueles que atribuem uma probabilidade muito alta a este cenário saiu de 15% para 38%. Nenhum dos especialistas acredita que a probabilidade de Guedes sair é “muito baixa”.
O cenário é similar ao publicado em janeiro de 2020, quando 71% dos especialistas ouvidos pelo Barômetro do Poder atribuíam probabilidade “alta” ou “muito alta” à saída de Moro antes de 2022. Muita gente, especialmente na base governista, via o resultado como devaneio. Bastaram quatro meses para que a previsão se concretizasse.
Os motivos que justificam a previsão de queda do ministro da Economia são claros: é cada vez menos provável que a sua agenda vire realidade. No lado político, a demissão de Moro mostrou quem é que manda no governo – não há “superministro” que seja páreo para o presidente. Mas isto não é o mais relevante. Com a pandemia, os incentivos postos na mesa mudaram radicalmente.
A demanda por políticas distintas das que Guedes defende deve ficar cada vez maior. Com a combinação de alto desemprego e baixa inflação, o plano Pró-Brasil foi um ensaio do que pode vir por aí: um aumento da demanda por obras públicas e estímulos à economia.
Ainda mais importante é a dependência do governo em relação ao Congresso. Mesmo com as tentativas de trocar cargos por apoio parlamentar, as dificuldades são evidentes. De acordo com o levantamento do já citado Barômetro, a aproximação entre Bolsonaro e Centrão fez o número de deputados alinhados com o governo subir de 97 para 162, enquanto o número de senadores foi de 16 para 22. Trata-se de uma alta modesta, insuficiente e que deve custar bastante caro, cobrando seu preço inclusive na agenda de Guedes.
Alguns dos novos aliados, como Paulo Skaf e sua Fiesp, dificilmente vão engolir a agenda de abertura comercial, tão cara a Paulo Guedes. Quanto ao Centrão, só uma boa dose de ingenuidade justifica a fé de que seus integrantes vão apoiar uma reforma do Estado brasileiro. Trata-se de uma turma acostumada a ocupar estatais, ao invés de vendê-las. Paulo Guedes começou prometendo privatizar tudo, mas deve terminar comprando ações da Gol.
No cenário que se desenha, Paulo Guedes é uma das principais vítimas da pandemia, ao menos do ponto de vista simbólico. Ainda que ele continue no cargo, o que é cada vez menos provável, sua agenda é cada vez mais improvável.
Não se trata de uma torcida. Apesar de ter criticado Guedes em algumas oportunidades, sempre fui abertamente simpatizante de grande parte das suas propostas – abertura comercial, privatizações, ajuste fiscal pelo lado dos gastos, dentre outras. Não gosto do cenário que se desenha, mas minha preferência não muda a realidade. O ministro não parece concordar com esta percepção e se refugia num profundo estado de negação. Infelizmente, as ótimas palestras de Paulo Guedes não serão suficientes para mudar uma realidade cada vez mais dura.
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