Fernando Souza/AFP| Foto:

Boa parte da imprensa explica o bolsonarismo como se fosse uma madame do Leblon visitando o Complexo do Alemão: acham que estão num safári, rodeados por seres inferiores e estão com medo de levar um tiro em qualquer momento. Nenhuma análise sobrevive a tanta afetação.

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Quando alguém escreve que uma onda fascista vai eleger Jair Bolsonaro, na prática quer dizer o seguinte: “esses bolsonaristas são más pessoas, uns bárbaros, infelizmente a maioria dos brasileiros não é tão democrata quanto eu”. A explicação é tão descabida que só pode ser explicada pela vaidade do enunciador.

As últimas pesquisas de opinião pública, como a do Datafolha de 5 de outubro, mostram que a democracia nunca foi tão popular no país. O regime democrático encontra mais apoio nos estratos do eleitorado em que Bolsonaro vai melhor.

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Já a última pesquisa Datafolha – 17 e 18 de outubro – aponta que Bolsonaro é visto pelos eleitores como o que mais defende a democracia (47% contra 39% de Haddad). Os eleitores de Bolsonaro votam nele porque o consideram mais democrata, não por serem fascistas incorrigíveis. A mesma pesquisa mostrou sólido apoio às liberdades políticas entre a população.

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É possível que os bolsonaristas estejam errados? Certamente, Bolsonaro pode ser uma ameaça à democracia. Inclusive já defendi a tese nesta Gazeta. Mas, antes de qualquer discussão saudável, é importante entender o seguinte: estar errado é bem diferente de ser fascista. Não é o fascismo que motiva o bolsonarismo.

Quando alguém escreve que Bolsonaro será eleito por causa da disseminação de fake news via WhatsApp, está também lamentando: “esses bolsonaristas são meio burrinhos, uns ingênuos, infelizmente a maioria dos brasileiros não tem tanto senso crítico quanto eu e acredita em mentiras do zap”.

Uma vantagem de 20 pontos percentuais não pode ser explicada apenas pela tolice do eleitorado.

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Ainda que 100% dos eleitores tenham recebido fake news no “zap” (grande exagero, que escrevo aqui para provar um ponto) e 5% tenha mudado o voto de Haddad para Bolsonaro por conta dessas mentiras (exagero colossal, maior que o Ed Motta), ainda assim o candidato do PSL venceria. Se a conversão de voto for de 1%, já seria uma das campanhas de maior eficácia na história do marketing político.

Uma explicação completa sobre o bolsonarismo é tarefa para os pesquisadores do futuro. Até o momento, tudo indica que Bolsonaro vencerá a eleição por um motivo simples, que explica o resultado de praticamente todas as eleições já realizadas: ele está alinhado à maioria dos eleitores nas “real news” mais relevantes. Bolsonaro conquistou o eleitor mediano, dialogou com os desejos da maioria sobre assuntos verdadeiros.

Bolsonaro concorda com a maioria da população sobre impeachment, prisão de Lula, denúncias de Joesley, criminalidade infernal e boa parte dos assuntos mais importantes em jogo. Tudo isso é “real news”.

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As pesquisas de opinião pública apontam que o brasileiro prioriza fortemente o combate à criminalidade. Não é preciso um professor do Insper para concluir que a criminalidade chegou a níveis intoleráveis no Brasil. Qualquer um sabe disso.

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As mesmas pesquisas apontam que o eleitor brasileiro quer maior repressão, está cansado de ver líderes do PCC liberados por indultos. O brasileiro quer cadeia para bandido e reformas que endureçam o Código de Processo Penal. PT e PSDB, no plano nacional, ignoraram esse desejo da sociedade ao longo das últimas décadas. Bolsonaro foi a oferta que atendeu essa demanda.

A maioria dos eleitores não suporta Michel Temer, apoiou o impeachment e quer ver Lula preso. Geraldo Alckmin liderava uma coalizão de partidos pró-Temer. Ciro Gomes e Fernando Haddad se venderam como lulistas e chamam o impeachment de “golpe”. Bolsonaro se alinhou ao eleitor mediano em todos esses assuntos.

O antipetismo é um dos movimentos políticos mais importantes na história do Brasil. Num país onde imprensa, PSDB e diversas instituições pegaram leve com o PT em momentos importantes, Bolsonaro tem um discurso visceralmente antipetista, incomparável com o de seus adversários tucanos.

Uma boa estratégia para explicar o fenômeno é perguntar aos próprios bolsonaristas por que eles votam no candidato. Ainda bem que o Datafolha fez isso.

Na última pesquisa, o instituto coletou as seguintes respostas: 30% dos eleitores de Bolsonaro tem como motivo primário a renovação – votam nele por ser novo, querem tentar algo diferente; 25% votam porque rejeitam o PT; 17% gostam das propostas do candidato para segurança pública; 13% o escolheram pela imagem pessoal; 12% acreditam que ele tem o melhor plano de governo; 10% priorizam o combate à corrupção e impunidade; e o restante dos eleitores se divide entre outros motivos.

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A mesma pesquisa aponta que 1% dos eleitores de Bolsonaro vota nele por ser contra homossexuais e ideologia de gênero. A homofobia não é tão relevante para explicar a iminente vitória de Bolsonaro.

Portanto, a vitória de Bolsonaro é fruto das “real news”. A princípio, é mais sensato concluir que seus eleitores são tão racionais quanto os de Haddad. Eis uma realidade dura demais para uma esquerda que jurava monopolizar os anseios do povo.

Nossa primeira reação após a notícia de que perdemos algo, segundo o famoso Modelo Kübler-Ross, é a negação. Que o leitor fique esperto nas próximas semanas, porque o segundo estágio é a raiva.

Metodologia das pesquisas citadas

Pesquisa realizada pelo Datafolha de 17/out a 18/out/2018 com 9.128 entrevistados (Brasil). Contratada por Rede Globo e Folha de S. Paulo. Registro no TSE: BR-07528/2018. Margem de erro: 2 pontos percentuais. Confiança: 95%.

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Pesquisa realizada pelo Datafolha de 5/out a 6/out/2018 com 17.056 entrevistados (Brasil). Contratada por Rede Globo e Folha de São Paulo. Registro no TSE: BR-01584/2018. Margem de erro: 2 pontos percentuais. Confiança: 95%.