“Datafolha”, respondeu Bolsonaro quando perguntado sobre o aumento da sua rejeição nos últimos meses. O presidente ignora que as pesquisas Ibope, CNT/MDA, XP/IPESPE e Veja/FSB, todas, mostram o mesmo cenário. Não, Carlos, uma enquete no Twitter do Terça Livre não conta como pesquisa.
O suposto viés ideológico do Datafolha é incapaz de explicar a crescente impopularidade do presidente. Para negar que Bolsonaro perde apoiadores continuamente desde janeiro, seria preciso provar a existência de uma conspiração entre dezenas de empresas para fraudar suas pesquisas simultaneamente, em prejuízo a Bolsonaro. Não existe qualquer evidência neste sentido.
Para justificar o argumento, o presidente tuítou sobre uma pesquisa que, em setembro de 2018, indicava a vitória de Fernando Haddad num segundo turno contra Bolsonaro. Mas as pesquisas que não são realizadas na boca da urna, como bem sabe quem já abriu um livro sobre como analisá-las, não pretendem antecipar o resultado. Elas são um termômetro, medindo apenas a temperatura momentânea, sem determinar tendências futuras.
É possível que, em setembro de 2018, Haddad vencesse Bolsonaro. Nunca saberemos, porque não houve eleição em setembro. Quando houve eleição, as pesquisas acertaram. No dia 27, o Datafolha divulgou um último levantamento cujo resultado colocava Bolsonaro na frente com 55% dos votos válidos, contra 45% de Haddad. No dia 28, Bolsonaro venceu com 55% dos votos válidos, contra 45% de Haddad. Na mosca.
Com todos os institutos indicando a mesma tendência, é razoável supor que Bolsonaro de fato está perdendo apoio em velocidade recorde. Portanto, os próprios bolsonaristas precisam fazer uma autocrítica ou sofrerão as consequências.
Até o momento, uma das maiores novidades de Bolsonaro é a vontade de governar sem formar uma grande coalizão majoritária no Congresso. A indicação dos ministros não veio de parlamentares aliados, como os bolsonaristas gostam de dizer orgulhosos, e com razão. Caso siga perdendo popularidade, é provável que o plano seja abortado. Bolsonaro precisará buscar no Parlamento a sustentação que não encontra na sociedade. Não é possível governar o Brasil sem base parlamentar, sem apoio popular e sem pujança econômica.
A economia pode salvar o governo? Certamente, mas o timing importa e não parece estar a favor do presidente. O crescimento do PIB em 2019 deve ser ainda menor que o de 2018, um dado que pode explicar a decepção da população. Mesmo que a atual agenda de reformas coloque o país num bom rumo, e acredito nesta agenda, nada garante que os resultados virão no tempo que a política exige. As reformas, por sinal, podem ser contaminadas pela impopularidade do presidente.
Para quem não entendeu, o que quero dizer, vale a pena ser claro: bolsonaristas, vocês só ganham ao escutar críticas, revisarem o que estão fazendo de errado e continuar o que consideram correto. Esse exercício faltou ao PT e é essencial para entender sua derrocada.
Bolsonaro acertou em cheio ao defender pautas que contavam com a simpatia da população, mas não eram priorizadas pelos maiores partidos: fim do presidencialismo de coalizão, endurecimento das leis penais, zero respeito pela hipocrisia petista, dentre outras posições alinhadas com as do eleitor. Tudo isso sempre se refletiu nas pesquisas de opinião pública.
Por outro lado, em diversas pautas importantes, Bolsonaro diverge do brasileiro médio. Radicalmente. As pesquisas também indicam isso. Essas pautas podem não ter sido a prioridade numa campanha de um mês e meio, mas inevitavelmente aparecem num mandato de 4 anos.
Não há nada incoerente entre os resultados das pesquisas de opinião pública e os desdobramentos recentes da política brasileira. Nem há incoerência no comportamento de Bolsonaro. Convenhamos, improvável seria qualquer ponderação e sensatez nas palavras de um presidente cada vez mais rejeitado por suas declarações.
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