O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, colocou a autonomia do Banco Central para votação. Tal como esperado, porque é o que tem ocorrido desde a campanha de difamação contra Marina Silva em 2014, a esquerda brasileira mente sobre o projeto. Mente livremente, sem ser incomodada pelas agências de checagem.
Ciro Gomes é um exemplo. Sobre o assunto, ele já contou mentiras como a de que só Brasil e Nova Zelândia praticam metas de inflação — três anos atrás, no site do Instituto Mercado Popular, já publiquei uma checagem das falas de Ciro sobre o assunto.
Não se trata de uma exceção. Ciro já causou polêmicas por divulgar que metade do Orçamento federal é destinado ao pagamento de juros da dívida pública. Essa mentira já foi extensamente debatida na imprensa e, apesar desmoralizado, o ex-governador cearense insiste em defender suas lorotas. Outros casos incluem também a contabilidade criativa do déficit previdenciário.
A lista é extensa. Ciro é capaz de dizer que “entre 1945 e 1980 o Brasil multiplicou por 100 sua riqueza”, quando o número verdadeiro seria 12. Checagens como as da Agência Lupa e Aos Fatos mostram que, em apenas uma entrevista, Ciro é capaz de inventar vários números sem remorso. E, quando pego no flagra, ele tem por hábito negar. Os apoiadores, claro, repetem os dados falsos, rebaixando o debate público.
Em vídeo divulgado nesta terça-feira (3), Ciro reitera seu completo desrespeito pelo bom debate. A autonomia do Banco Central é descrita por Ciro como “a pior facada nas costas que a nação brasileira já tomou em toda a sua história moderna”, num exagero que chega a ser ridículo.
Fossem apenas exageros, sem problemas. Mas as mentiras habituais, é claro, estão lá. Algumas inofensivas: para acrescentar tons dramáticos ao discurso, Ciro diz que a inflação das famílias de baixa renda chega a 10%, apesar da FGV, responsável por coletar esse dado, apontar que a taxa acumulada em 12 meses não chega à metade disso. Noutra mentira, Ciro diz que vivemos sob a pior inflação desde o Plano Real.
Há também mentiras sobre o PL da autonomia do Banco Central – falsidades mais perigosas, pois podem atrapalhar a votação que ocorre enquanto publico esta coluna [nota do editor: projeto foi aprovado no Senado nesta terça-feira (3) e segue agora para apreciação da Câmara]. Ciro diz, por exemplo, que a autonomia impede o presidente de gerir a taxa de juros, a dívida pública, o câmbio e outras variáveis macroeconômicas. O que é basicamente mentira. O PLP 19/2019 deixa claro que o Conselho Monetário Nacional, formado por membros do governo federal, define livremente as metas que o Banco Central deverá cumprir. E a própria diretoria do Banco Central continuaria a ser indicada pelo presidente.
Segundo Ciro, a solução para a política monetária é garantir que “o Banco Central brasileiro seja como todo banco central sério do mundo: responsável por combater a inflação, mas responsável, também, pelo nível de emprego, pelo nível de atividade econômica e pelo ambiente da renda do povo brasileiro”. A autonomia seria um desvio dessa rota.
Mais uma mentira: ao contrário do que diz Ciro, a maioria dos bancos centrais do mundo possuem autonomia. Além disso, o próprio PLP 19/2019 atende a uma demanda histórica do cirismo e inclui o pleno emprego entre as atribuições do BC. A declaração do ex-presidenciável deveria servir como pretexto para manter apenas a estabilidade de preços entre os objetivos do BC. Ao contrário do que Ciro diz, muitos bancos centrais buscam apenas a estabilidade de preços – é o caso do BC europeu, por exemplo.
Em suma, o projeto de autonomia do BC traz uma inovação: a diretoria do Banco Central teria um mandato fixo de 4 anos e só poderia ser demitida antes da hora com aprovação do Senado. Ao contrário do que Ciro diz, o projeto não tira a política monetária das mãos de políticos legitimamente eleitos. O presidente indica a diretoria e, como já mencionei, define as metas de política monetária.
Ciro parece não entender por que a pauta está indo à votação agora. Fico me perguntando: será que ele acompanha o noticiário econômico? Além da disparada do dólar, a taxa de juros esperada a longo prazo tem subido – para entender melhor, leia a coluna que escrevi sobre a curva de juros.
Com as contas públicas em frangalhos, o governo tem pouco espaço de manobra para estimular a economia através da política fiscal. Por isso, juros baixos são cruciais para a retomada da economia, que hoje se encontra com desemprego recorde, num completo desastre em termos de mercado de trabalho.
A autonomia do BC ajudaria o Brasil a manter juros baixos ao aumentar a credibilidade da política econômica. Embora o presidente continue indicando a diretoria do Banco Central, ele perde o poder de manipular a taxa de juros com toques populistas, para fins eleitorais. Ou seja, nos protege de políticos como Ciro Gomes, que parecem crer que a determinação da taxa de juros se dá na esfera dos desejos. Trata-se de uma irresponsabilidade conveniente para quem quiser acumular poder, mas perigosíssima para o brasileiro comum, que no fim das contas sempre paga o pato.
Porém, para nos proteger mesmo de Ciro, de modo duradouro, não basta a autonomia do BC. Precisamos de um debate público implacável com aqueles que divulgam mentiras politizadas. É urgente associar Ciro aos pecados que ele comete habitualmente: fake news, sensacionalismo, agressividade. Por rebaixar o ambiente político nacional, tornando-o mais fértil às baixarias, Ciro deve ser punido com uma má reputação.
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