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Pedro Menezes

Pedro Menezes

Imposto de Renda

Na reforma do IR, grandes capitalistas financiam suposta classe média

(Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo)

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Segundo a equipe econômica, a arrecadação total do Imposto de Renda deve se manter estável caso o Congresso aprove a reforma apresentada na semana passada. As mudanças redistribuiriam a carga do IR entre os contribuintes, aliviando uns e sobrecarregando outros, mas sem alterar o peso total carregado pelo conjunto da sociedade. Em outras palavras, a ideia é redistribuir renda.

Uma boa forma de entender a reforma rapidamente é através da ideia de compensação. O governo queria cumprir uma promessa política: atualizar a tabela do Imposto de Renda sobre Pessoas Físicas (IRPF). Para compensar a perda de arrecadação resultado, novas receitas devem vir de impostos sobre dividendos e aplicações financeiras.

A partir daí, é possível ter uma boa noção de quem são os ganhadores e perdedores. A esmagadora maioria da população não será afetada, pois cerca 85% dos brasileiros sequer pagam o IRPF nas regras atuais. Na tabela atual, a renda desses brasileiros fica na faixa de isenção, que ia de R$ 0 a R$ 1900.

Com a reforma, a nova faixa de isenção iria até R$ 2500, incluindo mais alguns milhões de brasileiros. O número de contribuintes do IRPF tende a diminuir ainda mais. Entre aqueles que continuarão pagando, a maioria está no grupo de ganhadores e deve passar a pagar menos.

Se a redução da tabela atinge todas as faixas de renda, quem está pagando essa conta? Como é que a arrecadação vai se manter igual? Simples: a tabela do IRPF incide principalmente sobre os rendimentos do trabalho, como salários de servidores públicos e funcionários de empresas privadas. A renda proveniente de capitais, como os dividendos de uma empresa ou o retorno de ativos financeiros, geralmente é tributada com alíquotas próprias, diferentes das que aparecem na famosa tabela.

Para compensar o subsídio a boa parte dos contribuintes do IR, o governo propõe duas medidas: uma nova tributação de dividendos e mudanças na tributação de aplicações financeira. Como a tributação de dividendos só começa a partir dos R$ 20 mil mensais, pequenos empresários e trabalhadores “pejotinhas” devem continuar isentos.

O custo da reforma está concentrado em pouquíssimos brasileiros, especialmente nos estratos mais ricos dentro do 1% mais rico. O topo do topo do setor privado, especialmente donos de empresas lucrativas (que pagam dividendos) e acumuladores de capitais financeiros.

As novas regras também uniformizam a tributação de diversos tipos de investimento financeiro. Até neste detalhe, o prejuízo é concentrado nos mais ricos, que contratam advogados e financistas para aproveitar cada caso excepcional da lei tributária.

Já o grupo beneficiado pela reforma tem algumas particularidades do ponto de vista político-eleitoral. Trata-se de uma parcela da população que votou em Bolsonaro nas eleições de 2018. Apesar de geralmente integrarem os 15% mais ricos, esses beneficiados pela reforma atua costumam ser chamados de “classe média”.

Lembra da reforma da previdência, quando muitos economistas escreviam que a idade mínima não mudaria a aposentadoria de quem é pobre, atingindo principalmente quem teve acesso regular a carteira assinada? A nova tabela do IRPF é um aceno a esse eleitor. O mesmo vale para servidores públicos insatisfeitos com a reforma administrativa.

Não se trata de uma coincidência. O objetivo da reforma é político-eleitoral. O próprio governo admite isso quando trata a tributação dos mais ricos como instrumento de compensação para viabilizar uma promessa feita nas eleições de 2018.

A reforma do IR proposta pelo governo Bolsonaro não dialoga com a proposta de reforma na tributação da produção/consumo. Também não há medidas que racionalizem o sistema de forma mais profunda – como, por exemplo, regras que reduzam os incentivos à pejotização e outros comportamentos derivados de um sistema disfuncional.

Outro ponto que chama a atenção,  e aponta no mesmo sentido,  é a ausência de mecanismos de transição. Por um lado, essa ausência limita o escopo da reforma, pois mudanças estruturais geralmente exigem um período de transição. É difícil explicar esses pontos sob o ponto de vista do interesse público, mas muito fácil entender por que Bolsonaro quer que os impactos apareçam já em 2022.

Uma reforma tributária afeta todo o planejamento dos agentes privados em uma economia. Como se trata de uma mudança nas regras do jogo, não é inteligente aprovar por aprovar, tendo em mente os motivos errados. A pressa é traiçoeira. Cada mudança deve vir acompanhada de estudos e estimativas que demandam tempo, principalmente porque cada resultado vem acompanhado de um debate.

Apesar de incluir algumas boas mudanças, esse caráter eleitoreiro contamina o projeto. O texto da reforma deve pautar-se pelo interesse público, abarcando aspectos estruturais. A economia brasileira precisa de estímulos à produtividade e de uma redistribuição que alivie também a pesada carga tributária imposta a quem vive na miséria.

É sintomático que o governo tenha atrasado a reforma do IR até chegar a esta altura com um texto que não dialoga com a primeira fase da reforma tributária, que trata dos impostos sobre produção e consumo. Desta forma, a maioria mais carente dos brasileiros sequer é beneficiada pela redistribuição associada à reforma tributária.

Espero que o interesse público e a boa técnica prevaleçam. Como os responsáveis serão os mesmos parlamentares que aprovaram a MP da Eletrobras, espero sentado e sem otimismo.

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