O Palácio do Planalto é a sede do poder Executivo Federal| Foto: Anderson Riedel/PR
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Filipe Martins, assessor da Presidência, está preocupado com os rumos da democracia brasileira. Em suas redes sociais, ele escreveu:

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A ideia corrente de que as diretrizes de um corpo de burocratas anônimos, sem transparência e não acessível a mecanismos de accountability devam ser impostas a todo o mundo sem qualquer questionamento, sob a alegação de que são científicas, é esdrúxula e claramente autoritária.”

A declaração evidentemente faz referência àqueles que criticam o presidente por não seguir recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em seu mérito, a crítica é justíssima e aponta um problema preocupante. Gilmar Mendes, por exemplo, já disse o seguinte absurdo:

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Tenho dúvida se algum tribunal vai validar decisão do governo federal, não que contrarie uma decisão ou outra de um estado, que contrarie orientações da OMS. Acho que nenhum juiz do STF vai validar esse entendimento.”

Gilmar deveria ter sido mais criticado por essa declaração. Quais representantes da OMS tem a legitimidade do voto brasileiro? Nenhum.

Até que ponto vale acreditar na autoridade técnica de uma organização que passou o mês de janeiro minimizando o vírus, negou a eficácia de máscaras em fevereiro e se submete a certos interesses da ditadura chinesa até hoje? Os textos de Guilherme Macalossi, meu colega de Gazeta, mostram que a OMS precisa ser responsabilizada por diversos erros.

Felizmente, Gilmar não representa o judiciário federal e o Supremo Tribunal Federal (STF) é um órgão colegiado. A principal decisão do STF sobre políticas de saúde delimitou a autonomia dos estados e municípios em decisões sobre quarentenas. Pois governadores e prefeitos não são a OMS. Eles possuem a legitimidade do voto, tanto quanto Jair Bolsonaro.

Até o momento, as recomendações da OMS pautaram a imprensa, mas não tiveram efeito vinculante em nenhuma esfera do Estado brasileiro. Os representantes eleitos seguem livres para contrariar quem quiserem.

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As críticas à atuação federal nesta pandemia, infelizmente, não se resumem a quem exige subordinação à OMS. Bom seria se assim fosse. Se a insubmissão a um corpo estrangeiro fosse o nosso único problema, nem haveria problema.

Dada a importância da OMS no concerto das nações, países que desejam contesta-la precisam liderar pelo exemplo. O governo federal tem os meios para isto, inclusive um amplo corpo de cientistas especializados na solução de problemas brasileiros. A autonomia nacional não é apenas um princípio democrático, mas o caminho mais prudente para combater o vírus.

O problema da política federal de combate à pandemia não é a falta da OMS, mas a falta de uma política federal de combate à pandemia. Não há um plano. Concretamente, Bolsonaro combate outros representantes eleitos como se fossem inimigos maiores do que o vírus. Até a semana passada, o governo perdeu tempo enquanto o presidente batia cabeça com ministros.

Sobram generais nos altos postos do Executivo federal. Engana-se quem os vê como profissionais das armas. Quem atira está nas patentes mais baixas. O treinamento de um quatro estrelas permite que ele planeje e execute projetos complexos e estratégicos para o interesse nacional. Como não podem comandar um plano que não existe, os generais tem se dedicado a acalmar o presidente, um imenso desperdício de produtividade.

Cabe ao governo federal coordenar as políticas estaduais de saúde, ao invés de perder tempo em brigas com governadores. O presidente pode até mesmo incentivar a adoção de uma ou outra postura através do orçamento público. O que faz Bolsonaro? Incentiva aglomerações informalmente sempre que pode, presidindo uma nação continental com postura de criança birrenta. Mesmo que ele tenha outras ideias, pirraça não é estadismo.

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E não são aglomerações quaisquer: o presidente vai ao encontro de quem grita “AI-5” em frente a um quartel do Exército. Para quem não se lembra, o AI-5 deu ao Executivo poderes totais para intervir no Congresso Nacional, estados e municípios. Parafraseando Filipe Martins, o Ato concedeu poder total a um corpo de militares sem voto, sem transparência ou mecanismos de accountability, que impuseram seus desejos a todo o país sem qualquer questionamento.

Filipe deseja pintar a crise institucional presente como uma cisão entre o presidente e a OMS. Na prática, Jair Bolsonaro está em luta contra poderes nacionais tão legítimos quanto ele. Ao invés de restringir-se ao Executivo federal, o presidente deseja o poder total. Seu assessor, pupilo de Olavo, tem razão denunciar os bárbaros nos portões, mas este é um problema menor enquanto há bárbaros no Planalto.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]