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De acordo com o IBGE, desde 1900 (primeiro ano com dados disponíveis), a pior taxa de crescimento do PIB na história do Brasil foi registrada em 1981. Naquele ano, a economia encolheu 4,35%. Segundo o Focus, relatório do Banco Central que reúne previsões do setor privado em relação à economia brasileira, espera-se uma queda de 6,5% em 2020 – a maior na história do Brasil. Se a situação lhe parece feia, aguarde, piora bastante quando observamos os anos seguintes e a situação das contas públicas.
Segundo o mesmo Focus, espera-se um crescimento de 3,5% em 2021 e 2,5% em 2022. Caso o cenário se confirme, Bolsonaro chegará ao fim do seu mandato com um PIB similar ao que encontrou, praticamente sem crescimento. Em relação ao PIB por habitante, que reflete melhor o bem-estar médio da população, a expectativa é de queda com relação ao início do mandato.
Eu disse que pioraria bastante quando eu comentasse a situação das contas públicas. E é verdade: segundo relatório recém-divulgado pela Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, a dívida pública brasileira só vai se estabilizar “3 ou 4 anos após 2030”. A perspectiva de novos superávits primários também fica para depois de 2030. Ou seja, se você tiver um filho hoje, a IFI prevê que ele entra na puberdade antes das contas públicas ficarem no azul. Cabe ressaltar que me refiro ao cenário intermediário da IFI – nem pessimista, nem otimista.
Muitos economistas, e me incluo na turma, defendiam que o teto de gastos fosse usado como referência para uma extensa agenda de reformas. Má notícia: segundo o IFI, o governo será obrigado a descumprir o teto a partir do ano que vem.
Será que os juros, tão baixos, podem nos ajudar? Aí entra outra complicação: a SELIC, taxa de juros que aparece nas manchetes, não guia sozinha as decisões de empreendedores. Afinal, trata-se da taxa de juros referente ao curtíssimo prazo. Para que os empresários decidam investir na sua capacidade produtiva ao invés de comprar títulos públicos, os juros de longo prazo – definidos pelo mercado, sem intervenção do Banco Central – precisam diminuir. Desde a pandemia, tais “juros longos” cresceram bastante.
O cenário econômico é uma calamidade histórica. Além de tudo o que escrevi, o Brasil não apresenta crescimento satisfatório e sustentado desde o início dos anos 1980. De lá para cá, nós nos afastamos dos países ricos, ao contrário do que se espera de um país de renda média. Estamos numa economia emergente que só submerge há 40 anos.
Dado esse cenário de longo prazo, cabe ressaltar que a culpa não é apenas de Bolsonaro. Todas as lideranças das últimas décadas merecem uma boa dose de culpa pelo desastre brasileiro. O que cabe ao presidente é a cobrança para que a situação mude. Como chefe de Estado, muitas reformas são de competência exclusiva de Jair Bolsonaro – isto é, só podem ser propostas por ele.
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Em segundo plano, a resolução do desastre cabe aos parlamentares, que precisam votar com celeridade o que o presidente propõe e melhorar os projetos, ao invés de piora-los. Ao contrário do que muitos pensam, Bolsonaro não é mais poderoso do que as casas legislativas comandadas por Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. O poder dele é diferente e está concentrado em um ser humano, ao invés dos 594 (513 deputados e 81 senadores) que compõem o Congresso Nacional. A lembrança é válida para legitimar o Legislativo como ente fiscalizador do Executivo, mas também para lembrar que Maia, Alcolumbre e todos os parlamentares devem ser responsabilizados, pois possuem o fundamental poder de mudar o Brasil.
A agenda que precisa ser implementada é extensa: abertura comercial, reforma tributária, reforma do Judiciário, reforma do licenciamento ambiental, desburocratização da máquina pública, aprovação do novo FUNDEB, substituição de políticas sociais ineficientes por outras que tenham o poder de resolver algumas das injustiças sociais brasileiras... E ainda é pouco perto do que precisamos fazer. Não dá para resolver um desastre estrutural e colossal com medidas cosméticas. Até por isso, a eleição para a presidência da Câmara e Senado, no início de 2021, é fundamental.
Por outro lado, cabe a Bolsonaro criar um ambiente com menos conflitos desnecessários e mais pacificação. Dizem que o presidente é incapaz de gerar harmonia e moderação. Sua carreira confirma a suspeita. Um exemplo simbólico é seu ministro da Educação, que é mais conhecido por suas opiniões sobre o STF do que pelas propostas do seu ministério, tão importante para o crescimento de longo prazo do país.
No cenário do fim de 2019, sem pandemia, a moderação e pacificação do debate eram opções para Bolsonaro. Por mais importantes que já fossem desde àquela época, o presidente não corria o risco de cair enquanto a economia mostrava sinais de melhora. Entrevista ruim não derruba presidente, mas crises econômicas derrubam.
Desde a pandemia, tudo mudou. A frágil situação econômica se tornou um caos, tão preocupante quanto qualquer outro cenário já visto desde 2016. Temer navegou por mares mais calmos que o atual. Hoje, a estabilidade do barco e o diálogo entre diferentes é mais importante do que nunca. Além dos interesses políticos de Bolsonaro, a pacificação importa porque o Brasil importa.
Se o barco afundar, afundaremos todos juntos. Só a política pode nos salvar. Lembre-se disso antes de, raivosamente, gritar com quem pensa diferente de você. Quando o pulmão está cheio de água, o sujeito deixa de ser liberal, conservador ou socialista, e passa a ser apenas um cadáver. Chegou a hora de pensar no país.
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