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Há uma emergência em curso. Só uma contumaz ação por parte do Estado pode resolver o problema. Infelizmente, pouca gente parece preocupada com isso. Me refiro ao crescente prejuízo gerado pela paralisação de escolas públicas durante o resto do ano letivo de 2020.
Ivan Lessa dizia que três dentre quatro políticos não sabem que país é este; o quarto acha que é a Suíça. Portanto, vale relembrar: durante 4 dos 5 séculos de nossa história, ter escravos era mais importante do que ter educação. Nos últimos 100 anos, a maioria das crianças brasileiras não teve sequer acesso aos níveis básicos de ensino. A universalização do Ensino Fundamental é coisa recente, obra da Nova República.
O resultado dessa história de descaso com educação não poderia ser diferente do país pobre e desigual onde vivemos. O passado é a herança que limita as nossas possibilidades no presente. E o futuro só será aquele que queremos – um Brasil tão próspero quanto as grandes nações ocidentais e repleto de oportunidades para todos – se nunca mais negligenciarmos a importância da escolaridade.
Diversos sindicatos de professores rejeitam qualquer volta às aulas antes de uma vacina ser disponibilizada. Me solidarizo com esses professores e entendo as exigências. De fato, dada a escassez de testes e o rápido avanço da Covid-19, voltar à sala de aula é arriscado. Mas parar as aulas por um período indeterminado é simplesmente inaceitável sob o ponto de vista da sociedade, dado o imenso prejuízo que a medida impõe aos estudantes.
Os danos que a paralisação pode causar aos estudantes são inestimáveis e permanentes. Quantos jovens desistirão do Ensino Médio por causa da paralisação, interrompendo precocemente a própria formação? Qual será o impacto da pandemia na renda futura dos brasileiros que precisam das escolas públicas?
Se a volta às aulas é arriscada, cabe ao Estado criar as condições para que isto seja possível. Governos estaduais e prefeituras, gestores diretos de milhares de escolas, precisam apresentar saídas para o problema. Ao governo federal cabe a coordenação de esforços e liberação de verbas para que a volta às aulas se concretize.
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Será presencial? Se sim, o que será feito para diminuir ao máximo o contágio dentro do espaço escolar? Como sabemos, a estrutura da maioria das escolas públicas é precária. Caso se opte pelo ensino à distância, é importante identificar quais alunos não possuem computador ou acesso a internet, encontrando soluções para aproveitar alguma coisa do ano letivo.
Nas universidades públicas, em sua maioria fechadas, o mesmo trabalho precisa ser feito. Se um estudante carente abandona os estudos por causa do tempo sem aulas, ele terá um prejuízo permanente incorporado à própria renda, enquanto a universidade deixará de formar um profissional. Todos perdem.
Qual será a solução encontrada? Não sei. Duvido que seja fácil. Minha certeza é que se trata de um desafio de importância econômica primordial. Além de todo o prejuízo causado aos alunos e à sociedade, uma solução para o problema poderia se transformar numa ferramenta permanente de auxílio ao aprendizado virtual nas escolas e faculdades públicas. Também é uma ótima oportunidade para mapear com precisão inédita as parcelas da população que seguem excluídas do ambiente digital.
Sem dúvidas, trata-se de um dos desafios mais importantes do momento. Estranhamente, o assunto não se faz presente no noticiário. As manchetes abordam, no máximo, os conflitos entre sindicatos e governadores. Pouco se escreve sobre os custos de manter grande parte das escolas e universidades públicas fechadas. Triste país onde o perigoso PL das Fake News é prioridade do Senado, enquanto os estudantes são escanteados do debate. Infelizmente, trabalhar pelo potencial das crianças brasileiras não rende tantos votos quanto fazer pose nos debates vazios que povoam as redes sociais.
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