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Farofada fail: o motivo é o desleixo pela própria causa
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Foram quatro os fatores que fizeram o evento ir para o ralo. A garoa-chuva, que pode não ter espantado os mais empolgados e decididos, mas fez com que alguns curitibanos mais curitibanos ficassem em casa; o Atletiba, que levou muita gente ao Boqueirão, onde não há granito nenhum; o anacronismo do evento – a polêmica da calçada aconteceu há quatro meses; e a junção de várias minimanifestações ao mesmo tempo, o que desviou o possível foco da Farofada e fez da Bispo Dom José, no Batel, um esquizofrênico e engraçado palanque de ocasião. Paradoxalmente, a rua foi de todo mundo e, ao mesmo tempo, de ninguém.

Não há como negar que o tiro virtual saiu pela culatra. Os que têm goela na internet, sabemos, normalmente não mantém o ímpeto na hora H. Há uma série de eventos recentes que comprovam isso. Aqui em Curitiba, principalmente. O fato é que eram 7 mil os participantes virtuais. E só cerca de 100, como apurou a reportagem da Gazeta do Povo, ou 200, segundo alguns dos próprios manifestantes, foram até o Batel. O público, assim, ficou em 1,4% do previsto.

Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
Um saxofonista tocou músicas “melancólicas” no início da Farofada.

Ontem perguntei à Kaley Michelle, uma das organizadoras, se ela achou que a Farofada foi uma furada. “Estamos em Curitiba, Cristiano, é uma grande conquista colocar pessoas na rua, principalmente para falar de política. Foi sucesso total e absoluto, recolhemos muitas assinaturas para encaminhar à Camara de Vereadores, discutimos os temas que afligem os bairros, refletimos sobre mídia, censura, democratização. Planejamos o tema e local da próxima Farofada. Podem tentar desqualificar, nós persistiremos”, vaticinou Kaley.

A Farofada foi a primeira edição de um evento que tem por objetivo, como afirmou a própria Kaley em outra entrevista, “mobilizar as pessoas pela retomada do espaço público como referência da democracia.” A causa é nobre.


De biquini na calçada de granito.

Ela nega, mas as características da Farofada foram as mesmas vistas no Churrasco da Gente Diferenciada, evento-protesto que agitou o tradicional bairro de Higienópolis, em São Paulo, em 2011. E talvez esse tenha sido o principal problema para a Farofada não vingar – ao menos não nesta primeira edição, ao menos não como queriam os 7 mil “participantes”.
Nos dois episódios há uma ironia anárquica que tenta se travestir com bom-humor. Por isso é mais fácil rir de algumas fotos do evento, que pipocaram por aí, do que tentar compreender o que aconteceu por lá – pense em um pedestre que não sabe da mobilização e dá de cara com o “bruxo” Chik Jeitoso apertando uma galinha de plástico. “Ao marcar presença na Farofada, Chik usa uma capa vermelha, tem um charuto na boca e carrega uma galinha de plástico em uma das mãos. Quando ele aperta a galinha de brinquedo, ela cacareja. Mesmo com todo o aparato, Chik está longe de ser a figura mais excêntrica da manifestação”, escreveu Álvaro Borba, em seu brilhante relato sobre a Farofada.

Obviamente já há teorias conspiratórias que falam sobre a “distorção” da mídia em relação à cobertura do evento. “PESSOAL, O Álvaro Borba, mais um jornalista mentiroso, está chateado porque só viu 30 pessoas, porque não chegamos no horário que ele quis, porque não estávamos em 7000 no meio da chuva e isso nos invalida!!! Alguém quer opinar???”, escreveu Kaley na página do evento no Facebook. Logo depois, quando o jornalista publicou a opinião de Kaley, tudo mudou: “Álvaro Borba publicou meu comentário! Ainda há esperança! Bora farofar pra URBS!” Apesar da boa causa, é a superficialidade que parece falar mais alto.


Protesto contra a mídia (provavelmente).

O mais estranho, e o que denota a total falta de sensatez – é preciso ter um pouco disso quando se quer brigar por algo, ainda mais por algo público – é a postura de Kaley, uma das organizadoras. Na foto acima, ela aparece deitada sobre um jornal rasgado – provavelmente a Gazeta do Povo. O mesmo jornal que, no dia anterior lhe deu voz para tentar explicar as motivações da Farofada. É simbólico: um incompreensível relaxo com a própria causa.

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