Caro leitor, respire fundo, afivele o cinto de segurança, mova a poltrona para a posição vertical e tente atravessar o seguinte parágrafo:
A globalização do modelo econômico neoliberal, sob a égide do capital financeiro, e os sistemas oligárquicos, com seus desdobramentos corporativos, promovem a concepção das cidades como mesoesferas de governação nas quais a desterritorialização é força motriz dos processos urbanos. As artérias desses organismos agigantados das megalópodes irrigam o funcionamento dos meios maquinais de produção, levando e trazendo oxigenação das periferias para o centro, em uma lógica que tem o acesso restrito à mobilidade urbana como impeditivo primeiro à continuidade da pulsação vital.
Com tantos trechos incompreensíveis e clichês grosseiros de esquerda, era de se esperar que o parágrafo acima integrasse o trabalho de algum estudante no início da faculdade. Mas o texto, como revelou pelo Twitter o economista Alexandre Schwartsman, está no catálogo de uma exposição do Itaú Cultural, um dos principais institutos culturais do país.
Essa não é a única bobagem pretensiosa publicada em livros, revistas ou catálogos de exposições do Itaú Cultural. Apresento outros exemplos abaixo. E proponho um desafio ao leitor: as mais criativas traduções e interpretações desses textos ganharão um nobre e eterno reconhecimento nesta coluna. Eis os trechos:
A superposição dos circuitos legais aos ilegais, assim como as violências que se mobilizam, configura outro aspecto constitutivo da governabilidade neoliberal: as políticas do medo, que têm por objetivo controlar a conduta das pessoas. (Observatório Itaú Cultural, edição 22)
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Cada fragmento determina as relações entre o público e o privado, assim como entre o legal e o ilegal, segundo um critério de conveniência bastante flexível. Tal relativa autonomia, que não exclui a responsabilidade do conjunto nem do poder central, faz parte dos acordos entre as elites, mas também da incapacidade do Estado para administrar uma crescente complexidade. (Observatório Itaú Cultural, edição 22)
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Precisamos de uma inicial e rápida formulação a respeito da linguagem e do uso de assertivas formais (teorias, modelos e tipos) no processo de análise de políticas públicas. Usar as narrativas como método é diverso de tomar tudo como narrativa, usar dados estatísticos como recurso analítico é diverso de tomá-los como medidas-limite de relações sociais, fazer contas ou usar proporções numéricas nem sempre é usar teorias econômicas, mas tudo isso envolve o uso de linguagens com estruturações e procedimentos específicos. (Livro “Políticcas Culturais: conjunturas e territorialidades”, 2017)
Deixe sua sugestão de interpretação nos comentários e me ajude a decifrar essas obras de arte da língua portuguesa.
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