Imagine se daqui algumas décadas seus netos aprenderem no livro didático de história que o caos atual da Venezuela foi causado pela queda do preço do petróleo e por sabotagens da CIA, que teria patrocinado greves e protestos pelo país.
Seria um absurdo, é claro. Todos sabemos que a triste crise venezuelana nasceu com as maluquices socialistas e populistas de Chávez e Maduro. Mas a narrativa acima é a mesma que se divulga sobre uma crise similar, a do fim do governo Salvador Allende, em 1973.
“Era preciso fazer fila para comprar tudo, papel higiênico, sabonete. Na padaria, não tinha pão. Meu sogro precisava fazer fila na banca de jornal para comprar cigarro”, conta a bióloga chilena Celia de las Mercedes Morales Ruiz, que emigrou para o Brasil em 1973 e hoje dá aulas de espanhol em São Paulo. “Quando casei, em junho de 1973, uma amiga minha me deu tamancos de madeira, porque não havia sapatos à venda. Uma conhecida de minha mãe fez para mim dois jogos de lençóis, porque não havia onde comprá‑los.”
Como Chávez e Maduro, Allende nacionalizou empresas, impôs controles de preços e quebrou as contas públicas. O resultado foi um completo desabastecimento de produtos básicos. Quando milhares de chinelos formaram filas em supermercados de prateleiras vazias, Allende criou um cartão de racionamento similar ao de Cuba.
Em 2011, escrevendo o Guia Politicamente Incorreto da América Latina, eu e o jornalista Duda Teixeira entrevistamos chilenos que viveram a crise do governo Allende. É impressionante como relato deles é o mesmo dos imigrantes venezuelanos de hoje.
“Para comprar alimento, era preciso fazer fila nas Juntas de Abastecimentos de Preços”, conta o chileno Ricardo García Valdés, engenheiro elétrico da Standard Electric em Santiago na época. “Cada um tinha o seu cartão de racionamento. Havia uma coluna com o nome dos produtos (carne, sal, óleo etc.) e outras nas quais as pessoas faziam um “x”. De tempos em tempos, era preciso trocar o cartão. Isso era para pessoas como eu. A grande maioria dos socialistas tinha acesso especial à comida.”
Como venezuelanos que se mudam hoje para Roraima, chilenos ficavam maravilhados com a abundância de produtos nos mercados brasileiros. “Quando chegamos, eu e minha mulher ficamos meia hora olhando a Sears, em Botafogo, com andares cheios de produtos. Tinha bateria de carro. Tinha pneu. Geladeira. Máquina de lavar roupa. Ferro de passar. No Brasil tinha de tudo. No Chile não tinha nada”, diz o engenheiro.
É verdade que a CIA bateu asas pelo Chile na época. Mas as nacionalizações e racionamentos provocariam protestos mesmo sem o apoio americano. Também é verdade que o governo Pinochet, que sucedeu Allende, cometeu crimes que não se pode perdoar. Isso não diminui o fato do socialismo de Allende ter arruinado o Chile seguindo a mesma receita que, décadas depois, inspiraria Chávez e Maduro.
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