Pelé é um gênio. Dizem. Nunca o vi jogar e, sinceramente, se tivesse visto não saberia reconhecer sua genialidade. Defeito meu, que fui um perna-de-pau histórico nos campinhos do Bairro Alto e que vou ao estádio mais para comer e extravasar uma raiva de mentirinha do que para testemunhar uma batalha entre Coritiba e Toledo que na pena de um Nelson Rodrigues soaria como um épico.
Mais do que um “gênio das quatro linhas”, como diz o lugar-comum, Pelé foi, ao longo de boa parte do século XX, talvez o brasileiro mais famoso do mundo. Difícil explicar o tamanho disso para uma geração acostumada à fama típica do nosso tempo, fugaz e restrita a certos nichos. Numa época em que os televisores eram raros, Pelé era conhecido e admirado até na remota, exótica e isolada China de Mao.
Uma fama que se manteve em níveis inimagináveis mesmo décadas depois de Pelé pendurar as chuteiras e depois do surgimento de megaestrelas do esporte como Michael Jordan. Para mostrar isso, nos anos 1990 Geneton Moraes Neto teve uma ideia: soltar Pelé na 5ª Avenida, em Nova York, e contar quanto tempo ele demoraria para ser reconhecido. Foram poucos segundos até um taxista largar o carro no meio da rua para saudar o Rei.
Pandemia de estupidez
Por ocasião de seus 80 anos, é natural que todo mundo queira prestar homenagem ao maior jogador de futebol de todos os tempos. Mas infelizmente para o agora octogenário Pelé, a data especial está sendo celebrada em meio a uma pandemia de estupidez que leva os infectados a desenvolverem um furor iconoclasta irracional e derrubar estátuas e enxergar nos mitos esportivos apenas instrumentos de promoção de uma causa.
Numa longa reportagem recente sobre Pelé, lá estavam eles, os infatigáveis justiceiros sociais, para falar não sobre os gols, os dribles, os passes; sobre o poder hipnótico que aquele homem tinha quando em campo. Não. Eles, do conforto de suas casas, estavam lá para, surpresa!, criticar o homem de 80 anos e saúde frágil porque Pelé não teria feito o bastante pela causa antirracista no Brasil e no mundo.
Pela cabeça dos que se deixam contaminar pelo vírus da soberba com consciência de pele e de classe, não basta que Pelé tenha feito a alegria de milhões de pessoas e sido ele próprio feliz. Os justiceiros sociais simplesmente não compreendem o conceito de felicidade, muito menos o de indivíduo. Para eles, a ideia de um homem de 80 anos ter enfrentado o racismo (que ele certamente sofreu em algum momento da vida) de uma forma diferente do que manda a ortodoxia contemporânea é inconcebível. Como assim Pelé nunca usou uma hashtag, nunca quebrou uma estatuazinha, nunca compôs um rap brabo?
"Heteronormativo demais"
Pelé nunca foi santo – e não há nada de mau nisso. Ele tem lá suas opiniões políticas (nas quais não tenho nenhum interesse), seus dilemas morais, seus interesses financeiros. Sem falar no ego hipertrofiado, consequência de seu trabalho, e com o qual ele precisa lidar desde que é adolescente. Pelé nunca pretendeu ser mais do que o maior jogador de futebol de todos os tempos – e conseguiu. E é por esse prisma que sua vida de sucesso deve ser vista e celebrada.
O que os militantes de hoje (essa gente que não assiste a jogos de futebol porque consideram o esporte “heteronormativo demais”) não entendem é que há muitas outras formas de enfrentar o racismo do que sair por aí quebrando tudo, levantar o braço com o punho cerrado no pódio, fazer tuitaço ou fundar uma ONG. E nem toda dor ou ato caridade deve ser tornado público.
Por fim, sentencio aqui que há mais discurso antirracismo sincero num dos tantos gols memoráveis de Pelé do que nesses livros ou textos (ou tuítes ou memes) que fazem a cabeça da garotada e que só promovem o ressentimento, o desejo de vingança, a divisão.
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