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Polzonoff

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"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

"Parece Osasco"

A primeira reunião de Dilma Rousseff como gerentona do banco dos Brics

Dilma Brics
E lá foi Dilma Rousseff para a China, presidir o banco dos Brics. (Foto: Reprodução/ Twitter/ NDB)

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Estava aqui tentando escrever uma entrevista com o último fio de cabelo na cabeça de Alexandre de Moraes quando um amigo me convidou a ir para o outro lado do mundo. O plano era acompanhar a ex-presidente Dilma Rousseff em seu primeiro dia como a gerentona do banco dos Brics – bloco que reúne a série D da economia mundial (Brasil, Rússia, Índia e África do Sul), além daquele país que não é bobo nem nada (China).

Pegamos um jatinho e lá fomos nós para Xangai. Onde encontramos Dilma no meio da rua, maravilhada com o cenário. “Que bonito, né? Parece Osasco”, diz ela. Não para mim, mas para um guia chinês que, desconfio, não entendeu nada. “Óia só que coisa estranha. Aqui o pessoal dirige do lado contrário, sô”, comenta ela, caprichando no sotaque mineiro para o chinês, que continua boiando.

Ao me ver, Dilma exibe toda a sua simpatia. “Eu te conheço de algum lugar”, diz ela, ríspida. Pensando bem, não sei se ela foi ríspida ou se estou sensível demais por causa do jet lag. Que seja. Elogio os cabelos by Celso Kamura e digo que sou jornalista e que trabalho na Gazeta do Povo. “Ótimo jornal. Você conhece o Jones Rossi?”, me pergunta a ex-excelentíssima. Digo que sim, claro, como não? Jones Rossi é meu amigo. “É meu amigo também”, diz ela. E virando-se para o guia Xing Ling (não tenho culpa que o nome dele é esse mesmo): “Onde é que a gente come um morceguinho frito por aqui, hein?”.

A reunião

“Mas vamos pra reunião que eu já tô atrasada e me disseram que esse povo aqui é muito certinho e não gosta de atraso”, diz ela, palitando os dentes. Saímos do restaurante de Bat Food em disparada até um dos arranha-céus que compõem o skyline xangaiense. “Quelido, é polaqui”, diz Dilma em portumandarim para o Xing Ling. Que, apesar de nativo, está mais perdido que ( ) surdo em bingo; ( ) cego em tiroteio; ( ) azeitona em boca de banguela; ( ) piolho em cabeça de careca.

Como Dilma sabia o caminho é um mistério maior do que o do cachorro que é a figura oculta que se esconde por trás de toda criança. Mas tudo bem. Quando percebo, estou diante de pesadas portas que se abrem para uma sala decorada com todo o tipo de quinquilharia made in China. Ao redor da mesa estão os representantes dos países que compõem o bloco: o russo Vladimir Kazbekov, o sulafricano Leslie Maasdorp, o chinês Qiangwu Zhou e, num cantinho, ao lado de uma estátua de Ganesha, o indiano Anil Kishora.

Xing Ling vai falando os nomes, eu vou anotando e a Dilma vai cumprimentando. “Kazbekov? Vou te chamar de Smirnoff que é mais fácil”, diz ela para o russo. Ao menos não é strogonoff, penso, me lembrando do apelido de infância. O russo não entende nada, mas, como cortesia, oferece à ex-presidente uma dose de vodca. “Ah, malandro. Tá pensando que eu sou boba de beber vodca radioativa?”. Ofendido, o russo sai batendo o pezinho e dizendo que ia reclamar com o Putin. Pelo menos foi isso que entendi.

Sem se deixar abalar, Dilma estende a mão para o representante sulafricano. Com os olhos, ela me suplica algo espirituoso, inteligente e diplomático para falar ao senhor Maasdorp. “Fala da Amarula!”, sugiro. “Amarula. Muito bom. Veri gudi. Joel Santana. Nelson Mandela. Safari. Apartheid”, diz a ex-guerrilheira. Ao ouvir a última palavra, Maasdorp diz alguma coisa em africâner e sai bufando. Acho que ele não gosta muito de Amarula.

“Ah, você eu já conheço”, diz ela para Qiangwu Zhou. Confundindo-o, obviamente, com Xing Ling. Desfeita a confusão, Dilma se põe a elogiar Mao Tsé-tung. “Lá no Brasil a gente bem que precisava de uma Revolução Cultural igual a essa que vocês tiveram aqui”, diz. Zhou fica só olhando e eu faço ¯¯\_(ヅ)_/¯¯. Zhou não sai da sala, mas pega o telefone e liga para o chefe. “Ô, Xi, assim não vai dar, cara!”, diz ele em ideogramas.

Eis que então a impichimada Dilma Rousseff vê, num canto, segurando uma estátua de Ganesha, a autoridade indiana. “Como é o nome dele mesmo?”, pergunta ela a Zhou, confundindo-o novamente com Xing Ling. “Kishora”, responde o guia, com medo de ser enviado a um campo de concentração. Dilma, então, cai na risada. “Kishora! Ai meu Deus, não é possível. É Kishora mesmo? Mas chora por quê, meu filho?”. E dá-lhe kkkkkkkkkkkk.

Dilma cumprimenta o indiano, que imediatamente presenteia a neobanqueira com a estátua do deus Ganesha. “Ai, que bonitinho”, diz Dilma, procurando alguma coisa no bolso da calça. Achou! Me distraio por um instante e, quando dou por mim, lá está ela oferecendo um amendoim à simpática divindade paquidérmica. Ao ver aquele gesto, o indiano perde a postura zen e esbraveja: “Não ofereça amendoim ao meu deus!”. E para mim: “Você não tem vergonha de plagiar Os Simpsons assim, na cara dura?”.

Respondo que não. Mas na verdade sinto, sim, um pouco de vergonha. Uma vergonha que não é maior do que a de ver Dilma Rousseff insistindo em alimentar o elefantinho. Cansado das gafes e da crônica, me despeço e volto ao Brasil para concluir a entrevista com o último fio de cabelo de Alexandre de Moraes. Aliás, um escândalo!

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