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Polzonoff

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"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

Feliz Ano Novo!

Acertando as contas com 2023

2023
Às vésperas de virar apenas passado, 2023 vem me visitar. (Foto: Dall-E)

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Três batidinhas na porta. Quem pode ser a essa hora da manhã?, me pergunto. Abro e encontro diante de mim um velho de rugas que são como abismos num rosto magro demais. “Posso entrar?”, me pergunta 2023 e eu escancaro a porta para dar passagem ao amigo de quase um ano. Ele se senta na cadeira de balanço e me faz uma dessas perguntas genéricas de velho: e aí?

Aí que estou chateado com 2023. Se bem que, a esta altura, só não está chateado com o ano moribundo quem tirou proveito financeiro, político e principalmente emocional da atmosfera de vingança que tomou conta do país. “Estou chateado com você”, digo e ele revira os olhinhos já recobertos pela nuvem densa de uma catarata. “E quem não está?”, pergunta 2023, como se lesse meus pensamentos.

Ofereço-lhe uma bebida. “Acho que uma cervejinha não vai me fazer mal, né?”, diz ele. Abro a geladeira e fico ali uns bons minutos, pensando em tudo o que tenho para jogar na cara do velho. E não me refiro apenas à política. Falo de todas as mágoas, decepções e arrependimentos. “Foi plantar a cevada?”, me pergunta ele lá da sala, rindo uma risada rouca entremeada por uma tosse tísica. Está mesmo nas últimas, o pobre-diabo.

Só de raiva, ofereço-lhe uma Kaiser. Ele bebe, ou melhor, sorve como se fosse um néctar dos deuses ou algo assim. E começa: “Você acha que é só você? Todo mundo tá chateado comigo. Em todas as casas que visito, eles vêm falar do 8 de janeiro. Do Lula. Do Haddad. Do STF. E, por algum motivo, quando digo que é tudo herança maldita de 2022, eles ficam ainda mais irritados! Mas com você tenho certeza de que vai ser diferente. Não vai?”.

Perdão

Ele abre um sorriso banguela. Me compadeço. Qualquer ressentimento em relação ao ano que é quase passado começa a se esvair graças àquele sorriso. “É que esse negócio de botar a culpa no antecessor, de dizer que é herança maldita...”, tento. Ele me interrompe. “Mas com você vai ser diferente. Não vai?”, repete 2023. O que é que posso responder? Vocês me conhecem. Claro que comigo vai ser diferente. “Pensando bem, nesse negócio de política você não foi tãããããão pior assim do que os últimos anos”, digo. Ele se recosta na cadeira de balanço e como que solta uma baforada de um charuto imaginário. “O problema é que...”, começo e desisto.

De que adianta jogar na cara de 2023 as coisas ruins que aconteceram na minha vida pessoal? Afinal, em grande medida elas foram consequências das minhas escolhas. Umas acertadas; outras bem equivocadas. Mais do que isso, muito do que me aconteceu neste ano e que tenho por “injustiça” foi produto da minha proposta – consciente e racional – de me tornar mais vulnerável. De botar o coração na janela e dizer a quem passa: “Pega que é teu!”. Quem se expõe assim está sujeito a levar uma ou outra bicada dos abutres. Normal.

“De qualquer forma, queria lhe pedir perdão”, diz 2023, quebrando o silêncio constrangedor entre nós. Aquilo me pegou desprevenido. Me desconcerta. Perdão? “É, perdão. Aliás, queria aproveitar e pedir perdão a todos os seus leitores”, responde ele, como se lesse meus pensamentos. E continua: “Perdão por não ter conseguido interferir mais positivamente na vida de vocês. Perdão por não ter deixado uma boa impressão. Perdão por ter criado alguns traumas. Não era a intenção. De verdade”.

Ele tenta se levantar e eu o ajudo. E pensar que , poucos parágrafos acima, eu estava chateado com o velhinho. Aff. “Até parece! Não tem que pedir perdão por nada, 2023. Tudo o que aconteceu ao longo do ano, de bom e de ruim, me ensinou muito. Sou é grato pela oportunidade de viver neste tempo. Mesmo com o Lula ou o STF. Mesmo cercado por gente que apoia o Hamas. Mesmo com todas as perdas e tragédias inerentes a qualquer ano. Você só poderia ter aliviado para o Coxa, né? Se bem que o time era ruim mesmo e mereceu o rebaixamento”, digo.

Ele ri e, depois de um abraço apertado, com direito a fogos de artifício e tudo, se despede com o passinho vagaroso de quem carrega 360 dias às costas. “Que 2024 seja melhor! Não perfeito nem sem um sofrimentozinho aqui ou acolá, porque isso não existe. Mas melhor!”, diz 2023, desaparecendo na névoa da noite. Será.

Férias

Agradeço a todos os que me acompanharam ao longo deste ano. Saio de férias e volto em fevereiro de 2024.

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