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À mesa animada, pela qual já passaram assuntos os mais diversos, alguém menciono (sic) a Parábola do Semeador (Mateus 13: 24-30) e o homem que personifica o caos moral, político e jurídico da sociedade brasileira: Alexandre de Moraes. “Ele quer separar o joio do trigo porque, claro, se considera trigo democrático. Mas é joio ditatorial. Mas se acha trigo. Mas é joio”, digo. E, depois dos dois pontos, acrescento: “Só que isso vai totalmente contra o que nos ensina Jesus Cristo. Afinal, de alguma forma joio e trigo têm de conviver até a hora da Colheita. Essa tarefa não cabe a um ministrozinho do STFinho do Brasilzinho”.
Olho em volta, buscando algum sinal de que não estou falando muita bobagem. Mas encontro apenas uns olhares meio constrangidos que me desestimulam a continuar dizendo que esse também é o problema de todo homem de bem que pressupõe no semelhante uma maldade insuperável. “E onde é que entra a misericórdia divina?”, tive vontade de perguntar, mas não perguntei e isso não vem ao caso. O que vem ao caso é o que aconteceu em seguida, quando um dos convivas, num tom nada exaltado (eu juro, excelência) e sobriíssimo de Coca-cola, disse: “Alexandre de Moraes é um homem medíocre”.
E ele até tentou continuar, mas foi calado pelo silêncio que nos cercava. Porque absolutamente todos os olhares do restaurante se voltaram para a nossa mesa. Por um instante, talheres e copos pairaram no ar, rostos se contorceram numa risada interrompida e apaixonadas discussões futebolísticas foram deixadas de lado. Até os garçons interromperam o vaivém animado para admirar o homem de bigode que ousara expressar uma semiopinião daquelas. Em público.
Até Hitler apareceu
Enquanto todos se voltam para a porta, à espera dos capangas supremos da PF, digo que a história recente é feita também disso: homens medíocres que, por vias mais ou menos retas (de acordo com o prumo da burocracia e da tecnocracia reinantes), ascenderam a cargos de poder. Ossos da democracia! – diria alguém e, no caso de Alexandre de Moraes, tanto pior. Afinal, quem não se lembra dele cortando pés de maconha no Paraguai ou dançando todo constrangido ao lado de índios, em ritos que se assemelham aos velhos pactos de viola caipira e encruzilhada?
Foi assim que, depois de se submeter à vontade de mestres que ele certamente não reconhece, Alexandre de Moraes percebeu que a toga que lhe jogaram sobre os ombros lhe dava poderes supremos de exercer sua mediocridade como se fosse excelência. Não é. Como se coubesse a ele pôr o joio de um lado e o trigo do outro. Não lhe cabe. Mas me deixe passar a palavra ao amigo que, depois do Grande Silêncio, finalmente poderá completar o raciocínio.
“Como eu ia dizendo, Alexandre de Moraes é medíocre. E ele só está aproveitando a oportunidade de exercer autoritariamente a sua mediocridade. Porque é isso o que o medíocre faz quando confrontado com o próprio erro. Com os erros sucessivos. Ele trata logo de calar aqueles que veem e apontam seus erros. Mas, repito, ele é medíocre. Muito mais nocivo é o [Luis Roberto] Barroso. Por motivos óbvios”, diz, sem explicar quais são esses motivos óbvios. Mas ele deve saber do que está falando.
No delicioso caos do diálogo entre amigos, abriu-se espaço para uma série de assuntos e personagens. Falamos de “Nefarious” e, depois do que disse o Chico, até desisti de escrever sobre o filme. Um expressou seu amor incondicional por Curitiba. Outro contou tretas acadêmicas. Em dado momento, até o Hitler apareceu na mesa, se não me engano como uma espécie de padroeiro dessa mediocridade poderosa e perigosa. Aí quando dei por mim estávamos brindando ironicamente a Alexandre de Moraes. Pelo qual, aliás, continuamos rezando. Não ironicamente, no caso.