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Polzonoff

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"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

Carta ao leitor #11

Como me tornei fascista para meu melhor amigo da infância

AURORA DA MINHA VIDA
Oh! que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida,/ Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais! (Foto: Arquivo Pessoal)

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Carta diferente hoje. Sem política, apesar de inspirada numa fala política. Como você há de lembrar, semana passada o ministro Alexandre de Moraes fez uma visitinha ao Senado, onde disse que antes das redes sociais éramos felizes e não sabíamos. Num arroubo retórico, chamei isso de saudosismo ditatorial – e é mesmo, isso de querer calar todo mundo porque “antes era melhor”.

Mas o fato é que, depois de ter escrito a carta, tropecei e saí rolando pela ladeira da memória. Bati a cabeça com força. Desmaiei. E aí já viu. Quando recobrei a consciência, percebi que estava afundado numa poça de nostalgia. Daquelas bem viscosas, sabe? Cambaleando, tentei me limpar, mas a nostalgia estava cheia de uma melancolia que grudava na pele feito carrapato. (Sério que não consegui pensar numa imagem melhor do que “carrapato” para algo que gruda na pele? Aff).

Seja como for, fiquei ali me lembrando de um monte de nomes que já foram amores e amizades, mas que hoje não passam disso: um monte de nomes. Por onde andarão Camila e Simone e Carla e Juliana e Leonardo e Fábio e Luciano e André? O que terão feito de suas vidas? Todos já estamos com quase 50 anos! Quais seus dramas atuais? Que memórias guardam eles da aurora de nossas vidas?

O passo seguinte, você há de imaginar, seria procurar pelos fantasminhas camaradas. Não é para isso que servem as redes sociais? O problema é que deles guardo apenas o prenome. Digo, com um pouco de esforço talvez fosse possível encontrar um ou outro na Internet. Mas será que quero mesmo? Uma experiência recente me dizia para ficar quieto. E, quer saber? Foi isso que fiz.

Já que você insiste, porém, conto a experiência. É coisa simples. Pouco antes das eleições de 2022, um desses nomes citados, a quem eu chamava de irmão, me mandou uma mensagem pelo Instagram. Reconhecendo o nome do remetente, abri correndo a mensagem, na esperança de encontrar algo como “Que saudade!” ou “Quanto tempo, hein?”. No lugar disso, o que encontrei foram xingamentos. Aparentemente eu tinha me tornado um fascista e por isso não era digno de fazer parte das memórias do ex-melhor amigo.

Que coisa. Mas a vida é a assim, né? A gente se esquece de que, com o passar do tempo, também nos tornamos vilões para alguém. Ou, no caso de quem relutantemente aprendeu a aceitar que tem uma “vida pública”, para muitos alguéns. Mônica, Marco Aurélio, Alexandre e Carolina. Os nomes vão me ocorrendo e me impedem de continuar o raciocínio. Onde é que eu estava mesmo?

Vilão. Bom, pelo menos nesse caso específico a minha suposta vilania se restringe ao meu posicionamento político. Porque infelizmente sei que em muitos casos a vilania a mim atribuída tem outras origens. Sei que fui desleal com uns, mesquinho com outros. Isso sem falar nos corações que parti e me partiram, estes bem mais do que aqueles.

Que seja! Quando penso na possibilidade de reencontrar os fantasminhas naquele uniforme bordô do Madalena Sofia ou no uniforme verde do Expoente, imagino também uma possibilidade de reparar mal-entendidos, pedir desculpas e rir, rir muito, até dar dor de barriga, das muitas bobagens que a gente faz, diz, pensa e imagina ao longo desse processo sofrido, necessariamente sofrido, chamado viver.

Um abraço do
Paulo

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