O fim de semana foi maravilhoso. Mas minha festa particular teve lá seus momentos de estranheza. Quando me surpreendi pensando na eliminação do Brasil na Copa, por exemplo. Faltavam só quatro minutos, poxa! Ou quando me vi gargalhando amarelo diante da Lista Negra (!) de Palavras e Expressões Racistas elaborada pelo totalitário TSE – um tribunal que abandonou suas funções óbvias e restritas às eleições para se dedicar integralmente ao nada nobre trabalho de controlar a sociedade.
A risada tem mesmo essa função de apontar o ridículo diabólico da lista de palavras e expressões que, na opinião desses fariseus modernos, devem ser abolidas do vocabulário. Afinal, não há nada mais engraçado do que o homem seduzido pela própria “razão” a ponto de se achar capaz de controlar a linguagem em seus mínimos detalhes. A queda de Lúcifer tem, sim, seu quê de engraçado. Humor negro, digo.
Mas a verdade é que a listinha da corte mais stalinista deste Brasilzão de meu Deus não tem graça. Nem se agora, do nada, essa crônica fosse invadida pelo soldado Peçanha, lotado na Delegacia de Combate aos Crimes Vocabulares. “O quê?! Você disse ‘esclarecer’? Que samba do crioulo doido é este texto? Teje preso!”, diria ele nesta minha tentativa frustrada de fazer rir criando um personagem patético, cheio de ressentimentos históricos, cossofredor de dores ancestrais e ainda imaginário nas esquinas da vida. Mas muito real nos gabinetes desses juizecos de meia-tigela.
Não tem graça porque, ao contrário das iniciativas semelhantes que já foram motivo de escrutínio neste espaço, essa lista é um documento elaborado por uma tribunal. Por juízes. Por magistrados cuja responsabilidade, em tese, é a de mediar as relações humanas, numa esforço para manter algo remotamente semelhante à paz nesse mundo de conflitos incessantes. Na prática, porém, o que esses juizes fazem é fomentar o ódio entre as pessoas, o que só aumenta seu poder de coação e controle.
Uma imoralidade em si
E aqui vou usar um verbo apropriado, embora juridicamente incorreto, para descrever as intenções dos militantes de toga com essa nhaca de lista: escravizar. Só que, neste caso, o juiz-feitor afeta virtude ao chicotear no pelourinho um tipo de ser humano que ele vê como inferior e digno do açoite não por causa da cor da pele, e sim por causa das palavras e expressões que usa.
Na plateia deste espetáculo abjeto, talvez neguinho ria de nervoso, se perguntando: “Como chegamos a este ponto?”. Mas terá sido tarde demais. Porque ao redor dele não haverá ninguém para responder que chegamos até aqui assim: por interesses insondáveis, no remoto século XXI militantes travestidos de juízes não só fomentaram o ódio entre as pessoas como também foram soberbos a ponto de se acharem capazes de amenizar um tal de ressentimento histórico (uma imoralidade em si) proibindo palavras “racistas”. E quando disseram aos juízes-militantes que isso tudo tinha um quê de Torre de Babel, eles farfalharam suas togas, dando de ombros para a sabedoria milenar do bom senso.
Ao impor mais e mais restrições descabidas à linguagem, no afã de reconstruir uma cultura que nunca pediu para ser destruída, quanto mais reconstruída, juízes querem exercer o controle total sobre o homem comum. Querem manobrar não só suas ações, impedindo-os de cometerem “crimes”; querem manobrar seus pensamentos, impedindo-os de pensarem “errado”. E sabe o que é pior? O pior é que há muita gente que se submete voluntariamente à senzala do pensamento.
Como aqueles que fazem mesuras ao dono da casa grande substituindo o criado-mudo por alguma palavra mais esclarecida. Que não preparam nem mais uma deliciosa nega-maluca para a criançada. Que se recusam a sambar o simpático e divertido samba do crioulo doido da linguagem cotidiana. Que, no mercado negro dos vícios disfarçados de virtude, preferem a passividade do rebanho a bancar a ovelha negra. Que, desavergonhados da própria boçalidade, denigrem a dignidade humana ao anunciarem uma lista negra de palavras cujo objetivo é, repito quantas vezes for necessário, tornar o indivíduo cativo de suas vontades.
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