Ouça este conteúdo
Hoje (8) é meu aniversário e vou me dar este presente: no texto de hoje não tem política. Em compensação, prometo que vai ter muita nostalgia e informações enganosamente inúteis, com uma pitadinha de melancolia e algo que, forçando bem a barra, dá até para chamar de filosofia. Tudo isso porque estou completando 47 anos de idade. É pouco, mas é muito para quem outro dia mesmo lembrou que nunca imaginou como seria a vida depois do ano 2000. Coisa de velho.
Mas não é por esse caminho que vamos acabar na nostalgia. É por este: me dá a mão e deixe-me dizer que, antigamente, cronistas eram contratados para... dar a mão ao leitor e com ele passear pelo cotidiano. À direita, uma paisagem; à esquerda, um objeto caído no chão. Mais à frente, uma lembrança e ali, ó, embaixo daquele arbusto, um transeunte. Assim, de mãos dadas, eles iam passando por tudo aquilo de bom e ruim que talvez o leitor d’antanho tivesse ignorado enquanto se ocupava dessa coisa à toa chamada vida.
Quarenta e sete
É que eu tenho essa teoria de que o excesso de iluminação nas cidades nos impede de vislumbrarmos as estrelas e, por consequência, de pensarmos sobre o infinito e a Eternidade. E talvez seja por isso que nos interessam muito mais os falsos dilemas da política do que os verdadeiros dilemas da alma. Por falar em vislumbre, há quanto tempo você não para para (maldita reforma ortográfica!) admirar o pisca-pisca de um enxame de vaga-lumes? Eu, faz muito tempo que não vejo vaga-lume.
Mas no primeiro parágrafo prometi um pouco de cultura inútil e aqui vai: 47 é um número primo. Além disso, é o número atômico da prata. Só isso. Numerozinho desinteressante, né? Para mim e para você, talvez. Mas não para o rapper Capital Steez, que considera o número 47 “a perfeita expressão do equilíbrio no mundo”, por representar a tensão entre o coração e o cérebro (o 4º e 7º chacras, respectivamente). Tem gente que exagera.
Lição 1: todo mundo está fazendo o seu melhor
Antes, porém, de sair para soprar 47 velinhas (senão o apartamento pega fogo!), me permita bancar o sábio e dizer que no último ano aprendi muita coisa. Muuuuuita coisa. Mas não posso contar tudo o que aprendi sem me expor demais. Por isso vou me ater a apenas três das lições que fazem de mim, hoje, um homem muito diferente do que eu era há apenas 365 dias.
A primeira delas é esta: todo mundo está fazendo o seu melhor. Mas lembre-se: neste texto não há política. Por isso, quando falo “todo mundo” estou falando dos seus amigos, parentes e colegas de trabalho. Das pessoas próximas que, de alguma forma, colaboram com você e das quais você, apesar do narizinho empinado e do discurso orgulhoso de autossuficiência, depende. É isso mesmo: todo mundo está fazendo o seu melhor.
Lição 2: a Verdade é inegociável
E perceber esse esforço necessariamente imperfeito e costumeiramente atabalhoado é quase tão lindo quanto um céu estrelado, um enxame de vaga-lumes ou uma cumulonimbus daquelas bem prenhas de tempestades. É comovente. Sobretudo quando há uma discordância que pode ser desde uma coisinha à toa até uma questão profunda como, sei lá, a existência de Deus. Todo mundo está fazendo o seu melhor com os recursos que tem. Pequepê! Por que não aprendi isso antes?!
A segunda lição que marcou esta minha mais recente volta ao redor do Sol eu a aprendi com o Frei Gilson. Que, numa longa entrevista ao podcast Inteligência LTDA disse que “a Verdade é inegociável”. Sabe quando a gente vai dar um passo para fora do Caminho, pegar um atalho pelo exuberante vale do prazer, por exemplo; ou se banha nas águas mornas da vingança; ou saltita pelos picos da vanglória? Então.
Lição 3: sobre o sucesso
Agora repara: mesmo sabendo que é errado, a gente começa a inventar justificativas. A fim, claro, de nos convencermos de que o atalho da mentira, da maledicência, da imodéstia, da inveja (no sentido da comparação com o outro), da vingança e da vanglória, sem se esquecer da raiva dos nossos adversários ou inimigos, é melhor do que o Caminho pedregoso e árido que trilhamos. Não é. Essa é a Verdade. Aquela que é inegociável.
Por fim, uma lição aprendida recentemente, durante a tradução do livro “Encounters”, de John F. Coverdale, a ser lançado em breve pela Cultor: o sucesso é bem diferente da ideia que as pessoas fazem do sucesso. Ao contrário do que você aprende todos os dias pela TV e redes sociais, o sucesso é discreto e é modesto. É generoso e solidário, mas não faz alarde. O sucesso sabe sobretudo ser esperançoso. Isto é, ele tem a verdadeira esperança: a das coisas certas, e não a da conveniência.
Peço desde já perdão pelo texto longo demais. Mas, sabe como é: coisa de velho que gosta de reunir os amigos para compartilhar o que aprendeu ao longo destas 47 primaveras. Muito obrigado pela companhia. Um abraço do
Paulo.
[Esta coluna é uma reprodução da carta que chega à caixa postal dos assinantes toda sexta-feira. Se você ainda não se inscreveu, lá em cima, logo depois do primeiro parágrafo, tem um campo para isso].