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Ontem chovia a... a... a... Se você pensou que eu ia escrever “a cântaros”, se enganou. Tampouco escreverei que chovia torrencialmente. Porque prefiro perder um leitor mais afobado a ceder a um desses lugares-comuns tão ao gosto dos panfletários. No mais, se chovia ou não chovia não importa. O que importa é que ontem, distraidamente, me peguei pensando no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Quando eu poderia imaginar que, num dia qualquer de 2022, estaria desperdiçando a tarde chuvosa, própria a melancolias mais elevadas, pensando no Tribunal Superior Eleitoral, não é mesmo? O fato é que pensei e a conclusão a que cheguei não é das mais surpreendentes: o TSE é uma aberração e está mais do que na hora de cogitarmos acabar com esse polvo envolto em cracas que consome R$10 bilhões dos nossos impostos por ano.
“Então você está propondo extinguir uma instituição basilar da nossa democracia, seu fascista?!”, deve estar se perguntando alguém. Sempre tem alguém para fazer esse tipo de pergunta. E nesse tom. Não sei de onde surgem. A resposta é: sim, estou sugerindo que essa jabuticaba caríssima deixe de existir. Mais do que isso, a partir do parágrafo seguinte estarei sugerindo que o TSE é uma instituição essencialmente antidemocrática.
Porque pretende regulamentar algo que é irregulamentável: as relações políticas. Com quem você pode ou não se associar para defender uma ideia e formar um partido político, por exemplo. Quem pode ou não te representar no Parlamento. Quem pode ou não dizer que o sistema eleitoral brasileiro é suscetível a falhas (nesse caso, ninguém). E até, como se viu recentemente, a diagramação do material de campanha. Ou seja, é uma estrovenga que serve para tutelar escolhas políticas que, num país verdadeiramente democrático, deveriam ser... livres.
Aqui vou citar o exemplo mais recente da missão essencialmente antidemocrática da Justiça Eleitoral: a decisão liminar que proibiu o presidente Jair Bolsonaro de exibir imagens do 7 de setembro em sua propaganda eleitoral. Ela se baseia no tal do “abuso de poder político”. Novamente convido o leitor a aproveitar a chuva, o frio e esse café quentinho que ele tem em mãos para refletir. Leia “abuso de poder político” bem devagar. Faz algum sentido alegar abuso de poder político numa eleição? Que, em essência, é uma disputa para ver quem tem mais poder político?
Sem falar na ineficácia da decisão que, se serve para alguma coisa, serve apenas para escancarar as relações impudicas (pornográficas mesmo!) entre a Justiça Eleitoral e o candidato e ex-presidiário (não me canso) Lula. Afinal, todo mundo viu, vê e continuará vendo as imagens do 7 de setembro. Só na hipótese de uma explosão solar é que, quem sabe!, a decisão do corregedor eleitoral Benedito Gonçalves teria alguma chance de surtir efeito.
Esse senhor, aliás, foi visto cheio de intimidades com Lula. Rolou até aquele tapinha de amor que a gente dá nos amigos, sabe? Quando eles conseguem aquela figurinha que faltava no álbum da Copa, por exemplo. Ou quando eles tomam uma decisão que, mesmo sendo inócua, nos é favorável. O que, simbolicamente, denota uma perigosa e nada republicana lealdade. Ironia das ironias: como é possível que essa amizade, esse carinho, esse afeto todo não se configurem... abuso de poder político?
Os carinhosos tapinhas de Lula no rosto rechonchudo do meritíssimo são uma demonstração de poder do Robin Hood às avessas em que se transformou o ex-presidiário. Só ele pode garantir que os privilégios da elite da qual o ministro do TSE faz parte serão reafirmados e mantidos. E não estou falando apenas do salário altíssimo, do carro oficial, do auxílio-isso ou do auxílio-aquilo. Estou falando do privilégio de mandar, de submeter os “inferiores”, de moldar o mundo. E, no caso de alguns ministros, até mesmo de controlar o que e como se pensa. (Estamos a 0 dia sem mencionar o nome do ministro Alexandre de Moraes numa coluna. Droga! Nosso recorde é de 0 dia).
Venho insistindo nisso há algum tempo: tudo é às claras. Desavergonhadamente. Em outros tempos, um magistrado da Justiça Eleitoral jamais se deixaria registrar nessa intimidade toda com um político. Era uma questão de autorrespeito e também de respeito à instituição. Nesse tempo que é passado, a ideia de ser uma Maria Antonieta recomendando brioches ao povo faminto ou de ser um nobre valsando na Ilha Fiscal botava medo na tal da elite. Não mais. A elite que nos governa perdeu a noção do próprio tamanho. E da própria fragilidade.