Caro leitor,
Esta semana o noticiário foi marcado por declarações. Na semana passada também. E na anterior e na anterior e na anterior. Lula disse isso, Bolsonaro disse aquilo. Ministros do STF disseram, subcelebridades disseram, atletas disseram. Todo mundo diz alguma coisa o tempo todo e a gente fica absorvendo as declarações, sem saber direito que conclusão tirar desse palavrório todo.
VEM PRO ZAP DO POLZO
Até porque não há nenhuma conclusão a se tirar das bobagens ditas por Lula, que não para de falar, ou melhor, vociferar contra mim e você e todos nós de quem ele deseja se vingar. Nem do que diz Bolsonaro, inelegível e em cuja boca aberta já entrou muito mosquito. Nem do que dizem os ministros do STF, as subcelebridades, os artistas e os atletas.
Mais do que nunca, uma a uma as declarações me dão a certeza de que as palavras ditas pelos principais personagens do nosso cotidiano político não significam absolutamente nada. São apenas vento retórico a nos manter alheios ao que verdadeiramente interessa: as ações dessas pessoas que o clichê me obriga a chamar de “atores políticos”. O que importa é o que o homem faz, não o que ele fala. Ainda mais nessa nossa época de palavras ditas e reproduzidas a esmo.
Ai de ti!
No entanto, e para onde quer que se olhe, tome palavras! Tome aspas. Tome verbos declaratórios. Tudo o que se diz, e por mais que todos estejam falando ao mesmo tudo, é histórico, é definitivo e, cuidado!, pode ser usado contra você num futuro próximo. Na cacofonia de opiniões em que vivemos, no ruidoso caos político que nos cerca, perdemos a capacidade de prestar atenção tanto às virtudes quanto às perversidade que são praticadas e perpetradas em silêncio.
Além disso, é curioso que prefiramos a palavra dita à realidade observável. Afinal, a palavra é matéria-prima da narrativa, a história que contamos para nós mesmos e para os outros, e que pode ser torcida e distorcida ao sabor dos desejos e das vontades, enquanto a realidade não se pode moldar assim tão facilmente. O que me leva a usar um tom mais profético para dizer: ai de ti que assenta suas opiniões na areia instável das palavras que políticos, artistas, atletas e semifamosos lhe dizem à toa e inconsequentemente.
Por falar em... falar, outro dia um bom amigo me perguntou por que não sou mais direto, objetivo e principalmente enfático em meus textos. Por “enfático” suponho que ele esteja querendo dizer “panfletário”, mas deixa pra lá. De fato me custa expor certezas que não tenho e a indignação quando a julgo estéril (quase sempre). Quanto a ser mais pão-pão, queijo-queijo, a verdade é que tenho sempre mais perguntas do que respostas.
Não tinha pensado nisso antes
Sempre foi assim. Desde criança, sou o rei dos pontos de interrogação. Por que o sol é amarelo, pai? Por que a grama é verde, mãe? Em todas as ocasiões, sou o chato que faz perguntas, umas mais simples e outras mais incômodas. E assim vou descobrindo e aprendendo mais sobre o mundo e as pessoas.
Além disso, me lembrei agora que um dos conselhos de Jordan Peterson começa com uma constatação óbvia: ninguém tem acesso a seus desejos e necessidades. Logo, tampouco eu tenho acesso aos desejos e necessidades alheias. De modo que perguntar e esperar uma resposta honesta é o que nos resta se estamos de fato interessados no outro.
Por fim, acredito (e, se estou enganado, peço encarecidamente que alguém me diga) que este seja o meu papel como jornalista, articulista ou cronista: perguntar e estimular no leitor o gosto pelas perguntas, mesmo aquelas que não têm nem terão resposta. A chamada “pergunta retórica” é uma arte e nada me deixa mais feliz quando me dizem “não tinha pensado nisso antes” ou “não tinha pensado nisso por esse ângulo”.
Agora, por favor, aceite o abraço mais apertado do
Paulo
[Esta coluna é uma reprodução da carta que chega à caixa postal dos assinantes toda sexta-feira. Se você ainda não se inscreveu, lá em cima, logo depois do segundo parágrafo, tem um campo para isso].
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