É, eu sei que você está preocupado, estressado, revoltado. Sei que você se sente desamparado. Sei que não gosta muito da combinação cabo + soldado, mas tem horas que nem te conto. Sei que você olha para os filhos e netos e teme vê-los crescerem numa versão tupiniquim de Cuba, Venezuela, Argentina ou até Coreia do Norte.
E é por saber dessas coisas (e também porque é segunda-feira) que resolvi oferecer aos leitores uma perspectiva radicalmente diferente sobre a decisão recente do Supremo Tribunal Federal que anulou as condenações de Lula na Lava Jato, tornando-o elegível. É uma perspectiva polianesca, dirá alguém, e eu concordo. Outro argumentará que “no mundo real não é assim” e tudo bem. Haverá ainda quem me chamará de petista e, ah, beleza.
O fato é que, apesar de não parecer (e não parece mesmo), um Lula quase octogenário concorrendo pelo terceiro mandato de presidente deste Brasil varonil é uma oportunidade que, com alguma sorte e um pouco de juízo, não desperdiçaremos. Parafraseando Jane Fonda, Lula candidato é um presente de Deus para a direita. Só não vê quem não quer.
Enfim livres do getulismo
“Mas e a impunidade?!”, pergunta alguém antes que eu comece a explicar por que Lula candidato em 2022 é uma bênção disfarçada de injustiça. Ao que respondo que a lei nunca fez nem nunca fará o homem bom. Ainda que fosse desejável uma punição exemplar a Lula, é uma ilusão acreditar que uns aninhos na prisão quitariam a dívida do indivíduo perante a sociedade e sua própria consciência.
Assim, uma vez livre, leve, solto e exposto ao escrutínio do povo Lula poderá demonstrar toda a sua soberba dizendo que não se arrepende de nada ou mentir dizendo que não fez nada de errado. Será uma grande oportunidade de vermos, mais uma vez, o estrago que a ideologia e o poder causam numa pessoa e, assim, declararmos de uma vez por todas que não queremos que essa mentira ambulante guie o país rumo à concretização de seus delírios narcisistas.
Mas essa não é a única oportunidade que se descortina com a presença nauseante de Lula na urna eletrônica. Graças à decisão atrapalhada do Clube das 11 Constituições, teremos a possibilidade de mostrar que, apesar das muitas teses e da experiência que nos diz o contrário, somos um povo honesto e não votamos em quem já confessou que nos enganou uma vez.
E não adianta vir com esse papinho de Bolsa Família, fim de desigualdade, direitos trabalhistas, empregada viajando de avião, pobre estudando sociologia em Berkeley, regulação da imprensa. À custa da pior recessão da história e de um país dividido, aprendemos a lição e não, não vamos nos deixar levar por essa ladainha de novo. Uma derrota de Lula em 2022 representa, portanto, uma carta de alforria para os brasileiros, enfim livres de líderes populistas e seus potes de ouro no fim do arco-íris. Enfim livres (só meio século mais tarde) do getulismo.
A proverbial limonada
Lula candidato em 2022 é, ainda, uma oportunidade de revermos nosso passado e fazermos uma autocrítica do tipo “como é que eu caí na lábia desse sujeito antes?”. Se for o seu caso, não se fustigue. Acontece (embora nunca tenha acontecido comigo). Afinal, é a vida lhe dando uma segunda chance de não cometer o mesmo erro. Além disso, imagine só ver as peças que um novo João Santana criará para o Lula oitentão neojacobino e rir de doer a barriga diante das muitas falácias ditas com aquela voz diabolicamente rouca?
Por fim, mas não menos importante, Lula candidato em 2022 e o consequente desespero da esquerda se traduzirão em bolos melhores e cafés mais quentes oferecidos nos locais de votação aos que se disserem dispostos a “mudar de ideia”. Sem falar naquela gargalhada de alívio que promete unir a nação quando a derrota for anunciada por um provavelmente constrangido ministro do TSE.
Então é isso. Em vez de chupar esses limões azedíssimo aí que nos deram os 11 Ministros e um Falso Inocente, esprema-os até a última gota, adicione a água de seu senso de justiça, adoce com um bocado desses princípios conservadores que você defende nas redes sociais e sirva num copo de otimismo.
* Este texto foi escrito antes de o presidente Jair Bolsonaro dizer que um povo que vota em Lula “merece sofrer”. E, antes que você me pergunte, não, não merece.
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