Acompanhei a manifestação em defesa da anistia aos presos políticos. Assim de soslaio. Um olho no Bolsonaro e outro no Ferreira Gullar, que numa de suas crônicas diz que os temas políticos exigem do comentarista “indignação e profecia – duas coisas desagradáveis”. Desagradáveis mesmo, mas vê-se que é o que o leitor quer desde sempre.
Até tento. Escrevo e apago umas frases sobre os presos políticos e a anistia. Em linhas gerais, dizia que a anistia infelizmente não é (ainda) uma causa capaz de mobilizar a sociedade. Uma parcela da sociedade, sim. Mas apenas uma parcela que não é nem mesmo aquela parcela que, apesar de minoritária, consegue sempre avançar suas pautas. Infelizmente.
Anistia para Alexandre de Moraes
Não que o brasileiro não esteja nem aí para a cabeleireira ou para idosos e doentes condenados às baciadas por um STF tirânico e cruel. É que as pautas atuais da direita, incluindo a anistia, são confusas e se misturam e muita gente tem medo de ir à rua defender uma causa e acabar defendendo outra. Fora aqueles que não sabem e não entendem. Uns porque não podem e outros porque não querem.
Depois dessa indignação morna, escrevo e apago uma fantasia na qual pedia anistia a Alexandre de Moraes e aos demais ministros do STF. Não se espante. O delírio tem fundamento: uma eventual anistia aos presos do 8/1 só irá adiante no dia em que for do interesse não apenas das vítimas, mas sobretudo dos perpetradores da injustiça.
O óbvio
A parte da indignação, pois, não passou disso: uma tentativa de dizer o óbvio de uma forma que não fosse tão óbvia, mas para leitores que querem apenas o óbvio mais óbvio – e rápido. E você tem todo o direito, leitor, de buscar algo que lhe dê o ânimo que me falta. Quem sabe o Guzzo ou o Alexandre Garcia aqui ao lado?
Quanto à profecia, não fui muito além do óbvio previsível: pelo que entendi do que foi dito na manifestação, dá para prever que Bolsonaro será condenado e possivelmente preso. É algo que venho dizendo há algum tempo, mas que não me torna profeta nem nada. Digamos que seja apenas uma consequência natural, ainda que injusta, de uma série de eventos que tiveram início há seis anos.
Um bocado se desfaz
Pela presença da bandeira norte-americana, também deu para prever que a direita brasileira se tornará cada vez mais dependente da ajuda externa. A esperança falah con sotake. E mais: que só um milagre será capaz de devolver a liberdade àqueles pobres-coitados do 8 de janeiro. E que será preciso muito mais do que ovo caro & censura para que o instrumento do “povo nas ruas” tenha relevância novamente.
Parece que, ao fim e ao cabo, nem tudo, mas um bocado se desfaz mesmo, Josias. E não se trata, aqui, de falar na quantidade de manifestantes, se foram 18 ou 400 mil. Trata-se de reconhecer que, independentemente do tamanho e da nobreza da causa, o que importa numa manifestação é a atmosfera de otimismo e de esperança num resultado concreto e imediato da mobilização popular – algo que hoje nos falta. O que importa é o ímpeto de quem acredita que, lá em Brasília, alguém se deixará convencer pela visão da massa reunida.
E quem acredita numa coisa dessas hoje em dia?
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