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Polzonoff

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Transformando em crônica heroica o noticiário de cada dia.

Carta #33

O martírio sem sangue da política feita com honestidade

POLÍTICA CERTO CONVENIENTE
Quem pretende fazer política com honestidade tem de estar disposto ao martírio sem sangue de optar pelo certo em vez do conveniente. (Foto: Pixabay)

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Hoje meu texto será curto. É o que sempre digo e nunca é. Mas hoje será*. Porque o que tenho a dizer já foi complexo, a ponto de gerar uma crise daquelas. Mas agora acredito que consigo articular com alguma simplicidade e, mais importante, com alguma serenidade.

Me refiro à relação entre a política e a Verdade. E também à relação entre a política e o plano de santificação no qual acredito. Afinal, é nesse terreno pantanoso e que fede a enxofre que realizo meu trabalho, sobretudo em época de eleição.

Um pouco burrinho

Depois de muita reflexão e alguns dias de inegável angústia, cheguei a duas conclusões importantes. Uma delas não é nova para o leitor frequente: não estou disposto a flexibilizar a Verdade para agradar ou não desagradar o leitor. Ou, no contexto político atual, o eleitor, o apoiador, o militante. E até os amigos e parentes.

Isso quer dizer que tenho o monopólio da Verdade e que a partir de agora vou começar a analisar o mundo do alto? Claro que não. Até porque tenho medo de altura. Isso quer dizer que, reconhecendo-me falho e imperfeito, dado à ingenuidade intencional e às vezes até um pouco burrinho, vai, estou determinado a buscar o que é certo, e não o que é ou me parece conveniente.

Direita quixotesca

Isso significa não passar pano nem fechar os olhos para as barbaridades cometidas em nome da Grande e Redentora Vitória da direita. Uma direita que nem sei direito o que é, mas que, intuitivamente, me soa cada vez mais semelhante à esquerda. Isto é, uma direita revolucionária, salvacionista, quixotesca e suscetível a personalidades megalomaníacas. Uma direita que não vê problema algum em mentir ou de apelar para a indignação do eleitor a fim de lhe prometer um paraíso ordeiro.

O que nos traz à segunda parte deste texto que prometi que seria curto e já estou descumprindo: voto e apoio deste cronista insignificante que vos fala só terá o político que, em primeiro lugar, reconhecer os méritos do adversário. Afinal, nada mais santo do que ver no outro alguém que também almeja o bem comum, embora tenha uma visão diferente do melhor meio de se promover a paz, a prosperidade e a felicidade.

Martírio branco

Difícil? Muito. Provavelmente é até impossível ver surgir um político assim num cenário eleitoral que aplaude cadeiradas e coisas do gênero. Mas não se transige com a Verdade a fim de se ter uma vitória num pleito. Este é o ponto e, antes que me alongue ainda mais, permita-me mencionar outra característica fundamental desse político próximo do ideal, sem jamais sê-lo: ele tem de ser capaz de reconhecer seus próprios defeitos.

E mais: tem que ter a coragem de enfrentar a rejeição e a humilhação provenientes desses defeitos. É o tal do martírio sem sangue, ou martírio branco, a que estão sujeitos todos aqueles que optam pela honestidade e por fazer o certo – ainda que isso lhes custe a vitória ou o tão desejado sucesso. Serve para a política, mas não só; serve para todas as atividades humanas, da limpeza de banheiros públicos à criação literária cotidiana.

Mínimo infinitesimal

É pedir demais? É, mas não deveria ser. E, no pouquíssimo, no mínimo infinitesimal que depender de mim, não será. Não mais. Chega de defender o mal que se disfarça de bem para seduzir espíritos sem fé nem esperança, mas ávidos de uma justiça que confundem com vingança.

Um abraço do
Paulo

P.S.

P.S.: * Venho do futuro para dizer que não, não será. Você percebeu, né?
P.P.S.: Mandei esta carta antecipadamente para um amigo e ele: “Diga aí, quais são os méritos do Lula?” Na hora respondi: “Quem se opuser a ele que se vire para encontrar uns méritos”. Mas, pensando bem, deveria ter respondido: “E quem disse que ser um político honesto, sujeito ao martírio sem sangue, seria fácil?”.

[Esta coluna é uma reprodução da carta que chega à caixa postal dos assinantes toda sexta-feira. Se você ainda não se inscreveu, lá em cima, logo depois do primeiro parágrafo, tem um campo para isso].

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