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Polzonoff

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"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

Fumaça

O que o Eclesiastes nos ensina em caso de vitória

Rei Salomão
Rei Salomão, considerado o autor do Eclesiastes, em ilustração de Gustave Doré. (Foto: Reprodução/ Wikipedia)

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MINISTÉRIO DA SABEDORIA
SECRETARIA DE DILEMAS ETERNOS
GABINETE DO REI SALOMÃO (DIZEM)

PORTARIA Nº XXII, de 30 de outubro de (20)22

ARTIGO ÚNICO: Vaidade das vaidades, tudo é vaidade.

§ 1º. – Coincidentemente, antes de começar a escrever este texto me deparei com a capa antiga de uma revista esquerdista reclamando que a Bíblia teria suplantado a Constituição. Primeiro pensei em dizer ao Mino Carta que todas as Constituições do mundo Ocidental são influenciadas pela Bíblia. Mas é difícil ensinar obviedades a comunistas velhos. Depois, tive essa ideia maluca aí de escrever sobre o Eclesiastes como se fosse um documento oficial. Como se fosse uma lei, uma portaria, um decreto. Enfim.
                I – É bem provável que a formação esteja em desacordo com as regras da ABNT e, sinceramente, não estou nem aí. Aliás, não nem aí.
                II – Pensei: “Já que estamos vivendo sob uma juristocracia de forte inspiração positivista, nada melhor do que um texto que pareça um documento desses que os tecnocratas leem com indisfarçável prazer". Mas não é.

§ 2º. – Antes de entrar no assunto propriamente tido, convém acatar a sugestão do editor e explicar que não, não está faltando nada ao título. Não escrevi “ou derrota” porque numa eleição está implícito que, se alguém ganha, outro alguém tem que perder. Tampouco escrevi ali o nome do vencedor porque o Eclesiastes serve tanto para a vitória quanto para a derrota do nosso candidato preferido.
                I – Seria patético bancar o isentão aqui. E ainda mais numa hora dessas. E num dia como hoje. Todo mundo sabe qual o meu candidato preferido.

§ 3º - Sobre o Eclesiastes, teve uma época em que eu o lia todos os meses. Mesmo. É um livro duro. Árido. É preciso caminhar muito por ele até encontrar algum alívio, alguma esperança. Para os que não temem a insolação ou as bolhas no pé, a recompensa é uma avassaladora sensação de pequenez que, percebo agora, dialoga bem com os versos de João Filho que servem de epígrafe neste espaço: "Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha".

§ 4º. – Ah, sim. Você quer saber o que o Eclesiastes ensina. Pois bem. A mensagem mais óbvia do livro (o oásis mais próximo do errante sedento) é a de que tudo neste mundo é transitório. Inclusive essa felicidade ou tristeza que você está sentindo neste momento. O Eclesiastes nos dá a dimensão exata da nossa finitude, em comparação com a Eternidade de Deus.
                I – Vaidade das vaidades, portanto, é um alerta de que a nossa tendência contemporânea a nos importarmos demais com as alegrias ou infortúnios terrenos não passa de um eco da soberba que deu origem ao pecado.
                II – Escrevi bobagem. Essa tendência não tem nada de “contemporânea”. É uma tendência mais velha do que andar para frente. Ou para trás. Ou para os lados.
                III – Faz sentido falar de soberba para um esquerdista? A razão diz que não. Afinal, o marxismo progressista é pura soberba. É se achar capaz de criar um mundo melhor do que o de Deus. Mas a fé diz que sim, faz sentido e vale a pena. Sempre existe uma possibilidade de alguém realmente ouvir. Ou, no caso, ler.

§ 5º. – Uma curiosidade: um grande amigo e talvez a pessoa mais inteligente que já conheci diz que há por aí traduções diferentes para o célebre adágio “vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Algumas versões preferem “vacuidade” ou “futilidade”. Mas a tradução literal, acho que do grego, seria... “fumaça”.
                I – Fumaça das fumaças, tudo é fumaça. Taí. Gostei.
                II – E combina bem com a atmosfera das eleições que motiva esta crônica.

§ 6º. – Outra coisa interessante é que o Eclesiastes é o livro preferido dos... ateus. Aliás, conheci um ateu que jurava por tudo quanto é mais sagrado que o Eclesiastes provava a inexistência de Deus. Isso é que eu chamo de vaidade. De soberba.
                I – De fumaça.

§ 7º. – Reconhecer que tudo é vaidade, que tudo é transitório e que não há nada de novo sob o Sol muitas vezes é confundido com apatia ou resignação. Prefiro interpretar o ensinamento como um chamado à contemplação e à humildade. E, já que este texto tem a ver com política, dá para ler o Eclesiastes como um chamado aos princípios conservadores da prudência e da temperança.
                I – Nada mais soberbo do o espírito revolucionário. Nada mais destruidor. Nada mais transitório.
                II – Um dia até o mais supremo dos ministros voltará ao pó. E não há decisão do TSE capaz de mudar isso.

§ 8º. – O que quero dizer, mas ainda não disse, é que independentemente de quem seja eleito presidente do Brasil, é bem provável que nos próximos dias estejamos aqui discutindo, analisando, antecipando cenários, despertando sentimentos insondáveis uns nos outros, elogiando, xingando e, principalmente, esfregando na cara do amiguinho derrotado: “Eu tenho razão!”. Ou seja:

§ 9º. – Vaidade das vaidades, tudo é vaidade. Já dizia Salomão e incontáveis sábios depois dele. É uma verdade que teimamos em esquecer. Mas que, de vez em quando, vale a pena lembrar. Hoje, por exemplo.

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