Na verdade esta crônica nasceu como um texto de puro (puríssimo) agradecimento. No caminho entre a cachola e o papel, contudo, o texto caiu numa poça de realidade e se sujou toda de pesquisas eleitorais e da mundaníssima tentativa de invasão a uma Missa. Culpa do escritor desastrado que agora está aqui, esfregando mais que lavadeira de samba-canção, na esperança de chegar ao último parágrafo com as cores vivas de seu intento original.
A tentativa de invasão à Missa é mancha pesada e, suponho, vai exigir alguns bons litros do seu tira-manchas preferido e cujo nome não vou mencionar aqui porque o fabricante não patrocina este espaço. O caso ocorreu ontem mesmo, no domingo (21), e foi tão rápido quanto assustador: um menino com trajes cheguevaristas entrou na Igreja da Ordem durante a Missa e tentou fazer uma manifestação política qualquer.
Tem certeza de que não era um simples mendigo procurando acolhida ou um cracudo perdido em seus delírios químicos? Bom, a esta hora da manhã me falta até a certeza do meu próprio nome, mas ouvi bem o militante dizer ao segurança que “tinha direito”. Na conversa com os paroquianos, fiquei sabendo que esse tipo de coisa se tornou comum nos últimos meses. Será o nosso destino nos transformarmos numa nicaraguazinha dessas bem furrecas, governadas por um tiranete que bem poderia ser personagem do Chico Anysio?
Menos pesada, mas mais espalhafatosa, é a mancha das pesquisas eleitorais. Na qual vou me concentrar daqui em diante. Lava roupa todo dia, que agonia!... Para falar dela sem o tedioso discurso dos tecnocratas, contudo, serei obrigado a recorrer a uma historinha que li num livro ou que me contaram ou que eu mesmo inventei sem nem perceber.
A história é simples. Fala de um cabo submarino instalado para possibilitar a comunicação entre dois povos. Muito dinheiro, tecnologia e suor foram investidos nessa empreitada. Que levou meses e meses para ser concluída. Quando, finalmente, os dois povos puderam se comunicar, a primeira coisa que um contou para o outro foi uma piadinha suja, daquelas tão ao gosto da velha Dercy Gonçalves.
Dos dois lados da linha, todos riram e aplaudiram a novidade. Todos, menos um chato que ficou maravilhado com a capacidade humana de investir tanto conhecimento e esforço em tecnologias de consequências questionáveis. No final das contas, parece que nos deixamos encantar por nossa capacidade de realização, a tal ponto que nos esquecemos de uma perguntinha fundamental na origem de todos os nossos atos: para quê?
Sempre que vejo as pesquisas eleitorais, me lembro desse cabo submarino aí. Afinal, ao longo de décadas empregamos milhares de especialistas, desenvolvemos metodologias complexas e construímos supercomputadores capazes de analisar zilhões de dados. Ótimo, mas para que serve tudo isso se as pesquisas eleitorais não passam de números que insistem em contradizer o que nossos olhos veem?
E aqui não estou pressupondo a má-fé dos institutos de pesquisa nem nada. Isso seria reduzir a discussão a um insulto. O que estou querendo sugerir é que, hoje em dia, em vez de informar, as pesquisas eleitorais só servem para confundir, despertar teorias da conspiração e, sobretudo, criar um ambiente de pensamento coletivista no qual a divergência, por supostamente estar em menor número, é errada.
Mas o mais importante nem é isso. O mais importante é que finalmente consegui remover as manchas da crônica. Agora, sim, posso me jogar na cadeira de balanço, receber a Catota no colo, respirar fundo e agradecer a você, meu leitor. Sim, você mesmo que, entre tantas opções aqui mesmo na Gazeta do Povo, decidiu dedicar alguns minutos da sua vida para ouvir (ler) o que tenho a dizer (escrever). É um privilégio poder escrever todos os dias e um privilégio maior ainda ser lido todos os dias. Muito obrigado.
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